Kosovo volta a registrar confrontos após prisões de manifestante e policiais
Situação parecia controlada depois que o premiê kosovar recuou de medidas polêmicas como a posse de prefeitos de origem albanesa em cidades com maioria sérvia; mas novos embates interromperam o diálogo entre as partes
Após uma semana sem confrontos entre a população sérvia e as forças de segurança da Otan no norte do Kosovo, as tensões retornaram à região devido uma série de incidentes que resultaram em prisões tanto de um manifestante sérvio quanto de policiais kosovares.
O primeiro incidente ocorreu na terça-feira (13), quando um sérvio foi acusado de ter organizado ataques contra as forças de paz da Otan que atuam na região. De acordo com o ministro do Interior albanês de Kosovo, Xhelal Svecla, as autoridades locais identificaram Milun Milenkovic-Llune e foram prendê-lo. Os agentes que realizaram a operação tiveram de enfrentar cerca de 200 manifestantes, que tentaram impedir a prisão.
De acordo com Svecla, três policiais albaneses do Kosovo ficaram levemente feridos durante a operação. “Milun Milenkovic-Llune não é novato em ataques criminosos. (…) no passado ele agrediu membros das forças de inteligência. Esses criminosos e seus atos devem ser condenados por todos”, afirmou em seu perfil no Twitter.
O segundo incidente foi anunciado já nesta quarta-feira. Autoridades kosovares acusam a sérvia de ter invadido o território do Kosovo e prender três guardas de fronteira. “A Sérvia continua a causar problemas e a ser guardiã de criminosos violentos no Kosovo e na região. As suas forças entraram no nosso território e raptaram três polícias da República do Kosovo, violando todos os acordos aplicáveis e normas legais internacionais”, afirmou Svecla, também por meio de suas redes sociais.
“Sem dúvida, nossos policiais estavam estacionados nas profundezas do território da República do Kosovo, em um posto de controle estático, cumprindo suas funções regulares”, completou.
Em represália à alegada prisão de seus policiais, o governo do Kosovo proibiu nesta quarta-feira a entrada de todos os veículos com placas da Sérvia em seu território.
“Com o objetivo de aumentar a segurança em todas as passagens de fronteira, decidimos parar todos os veículos com placas da Sérvia para entrar no território de Kosovo”, disse Nora Fetoshi, assessora do ministro do Interior à Reuters.
O presidente da Sérvia, Aleksandar Vucic, disse que os três foram presos “1,8 quilômetro” dentro do território sérvio perto da vila de Gnjilica. Ele também acusou Kurti de incitar conflitos.
“Estamos na encruzilhada se teremos paz ou não… e há um homem nos Bálcãs que quer incitar conflitos a qualquer custo e esse é Albin Kurti”, disse Vucic em uma transmissão ao vivo pela TV.
Ele rejeitou a acusação de Kurti de que a polícia sérvia entrou em Kosovo, dizendo: “Eles nem pisaram lá.”
Embora pareça uma mera decisão administrativa, a restrição às placas veiculares são vistas pela população sérvia como uma agressão à sua autonomia e são o estopim da crise que culminou nos confrontos registrados este ano e gerou o medo de uma escalada de violência desenfreada.
Tensão renovada
A situação no norte do Kosovo parecia caminhar para uma pacificação depois que o premiê do país, Albin Kurti recuou de medidas polêmicas como a posse de prefeitos de origem albanesa em cidades com maioria sérvia. Na terça-feira (13) ele apresentou um plano que incluiria novas eleições locais e cortes na polícia especial.
As medidas foram anunciadas por Kosovo após forte pressão de seus aliados da Otan, que apontam os últimos passos do governo como responsáveis pelos distúrbios registrados na região este ano.
Os problemas começaram no ano passado quando o governo do Kosovo – não reconhecido pela Sérvia – anunciou a troca das placas de veículos da população sérvia por outras emitidas pelo governo de Pristina. Houve vários protestos, que fizeram com que o prazo fosse estendido de julho para novembro. Quando a medida finalmente entrou em vigor os prefeitos das quatro cidades com maioria sérvia no norte do país – Zvecan, Zubin Potok, Leposavic e Mitrovica – renunciaram a seus cargos.
Os problemas aumentaram quando o governo do Kosovo anunciou eleições em dezembro para substituir os prefeitos que renunciaram. A ameaça de confrontos fez com que as eleições fossem adiadas. Nesse período, a fervura já era incontrolável e, quando o pleito foi realizado, no dia 23 de abril, a população sérvia boicotou as eleições, alegando que elas eram ilegítimas.
Mesmo com o boicote, as eleições foram realizadas, gerando ira entre os sérvios e provocando reprimendas dos Estados Unidos e da União Europeia. Apenas 3,47% dos eleitores (1.566 albaneses e 13 sérvios) compareceram às urnas. Mesmo assim, Kosovo anunciou que os prefeitos tomariam posse. O primeiro assumiu no dia 19 de maio, em Mitrovica.
A posse do primeiro alcaide fez com que os sérvios corressem às prefeituras das outras três cidades para impedir que os prefeitos de origem albanesa assumissem os cargos. Houve confrontos intensos em Zvecan e Leposavic. Enquanto isso, a Sérvia colocou tropas na fronteira em prontidão.
O ápice aconteceu no final de maio, quando a população sérvia se mobilizou para impedir a posse dos outros três novos prefeitos, todos de etnia albasena-kosovar. A Polícia do Kosovo e as forças de paz da Otan foram acionadas para garantir a posse. Os conflitos deixaram mais de 70 feridos, entre militares e manifestantes.
(Publicado por Fábio Mendes, com informações da Reuters)