Itália: veja como Giorgia Meloni e seu partido de extrema-direita ganharam força
Ultraconservadora de 45 anos pode se tornar a primeira mulher a governar o país; agenda da cande coloca em questão os direitos LGBT, o acesso ao aborto e as políticas de imigração
Quando Giorgia Meloni entrou pela primeira vez na cena política, em 2006, como a mais jovem vice-presidente do partido Aliança Nacional, ela selou seu destino como uma representante da extrema-direita na Itália.
A Aliança Nacional, anteriormente chamada Movimento Social Italiano, era um partido claramente neofascista, formado por apoiadores de Benito Mussolini.
Quando jovem, Meloni admirava abertamente o ditador, mas depois se distanciou de seu tipo de fascismo — apesar de manter a chama tricolor, que simboliza o fogo eterno em seu túmulo, no logotipo do Fratelli d’Italia (Irmãos da Itália), o partido que ela cofundou em 2012.
Agora, a ultraconservadora de 45 anos pode se tornar a primeira mulher a governar a Itália.
O Irmãos da Itália, seu partido de extrema-direita, que está à frente nas pesquisas que antecedem as eleições gerais de 25 de setembro, obteve apenas 4,5% dos votos no último pleito de 2018.
Sua popularidade disparou desde então, em boa parte porque ela manteve uma presença ativa nas redes sociais e preservou a posição de seu partido, nunca se afastando de uma agenda conservadora que coloca em questão os direitos LGBT, o acesso ao aborto e as políticas de imigração.
O Irmãos da Itália também foi o único dos principais partidos a não participar do governo de unidade formado por Mario Draghi após a queda de Giuseppe Conte em 2021, e exigiu novas eleições em vez de uma correção tecnocrática. Quando o governo de Draghi, por sua vez, entrou em colapso em julho, as eleições que acontecem no próximo domingo foram convocadas.
Queridinha do movimento conservador global, Meloni era uma das protegidas favoritas do estrategista republicano Steve Bannon, que participou com destaque das conferências partidárias na Itália, antes da pandemia de Covid-19 e de seus próprios problemas com a lei.
Recentemente, Bannon demonstrou seu apoio mais uma vez, dizendo em comunicado à CNN: “Meloni, assim como Thatcher, lutará e vencerá”.
Meloni discursou em diversas convenções do CPAC dos EUA, dizendo ao grupo em 2022 que os conservadores estão sob ataque.
“Nós [conservadores] temos orgulho de nossa identidade, daquilo que defendemos. Vivemos em uma época em que tudo o que acreditamos está sob ataque: nossa liberdade individual, nossos direitos, a soberania de nossas nações, a prosperidade e o bem-estar de nossas famílias, a educação de nossas crianças. Diante disso, as pessoas entendem que, nesta época, a única maneira de mostrar resistência é preservar quem somos, a única maneira de resistirmos é sendo conservadores”, afirmou.
Ela foi criada por uma mãe solteira no enérgico bairro de esquerda de Garbatella, longe das atrações turísticas no centro da capital. Um grupo de idosos sentados nos bancos da praça central do distrito balançou a cabeça ao ouvir o nome de Meloni.
“Ela não me representa”, disse à CNN Marizio Tagliani, proprietário de uma cafeteria. “Ela não representa este bairro”.
Meloni, contudo, representa um número crescente de italianos conservadores que concordam com seus ideais de família tradicional que se alinham com a poderosa Igreja Católica. Ela é mãe solteira e abertamente anti-LGBT, e ameaça que as uniões do mesmo sexo, que foram legalizadas na Itália em 2016, possam ser revistas.
A ultranacionalista também chamou o aborto de uma “tragédia”, e as regiões da Itália onde seu partido governa já vivenciam restrições ao aborto e a falta de serviços, como a não adesão a uma política nacional que permite que as clínicas forneçam a pílula do aborto, e a permissão de abortos apenas até sete semanas, incluindo um período de espera obrigatório de uma semana para que as mulheres “reflitam” sobre sua decisão – enquanto as diretrizes nacionais estipulam 9 semanas.
Seus parceiros na aliança política de centro-direita da Itália, Matteo Salvini e Silvio Berlusconi, também são parcialmente responsáveis por sua popularidade. Berlusconi a nomeou para o Ministério do Esporte durante seu governo em 2008, tornando-a a mais jovem ministra a ocupar esse cargo.
Meloni regularmente entra em discussões com Salvini, cuja popularidade tem diminuído de forma contínua. Nas eleições de 2018, ela foi sua parceira minoritária na aliança de centro-direita.
Mas, desta vez, ela está no comando e sugeriu que, se eleita, pode não dar a Salvini um portfólio ministerial, o que o privaria do poder de potencialmente derrubar seu governo.
Ela diverge de Salvini e de Berlusconi em várias questões, incluindo a Ucrânia, e não tem conexão com o presidente russo Vladimir Putin, ao contrário de seus parceiros eleitorais, que disseram que gostariam de rever as sanções contra a Rússia por causa de seu impacto na economia italiana.
Em vez disso, Meloni tem se mantido firme em seu apoio à defesa da Ucrânia.
A perspectiva de uma líder feminina em um país tradicionalmente dominado por homens faz algumas pessoas duvidarem se ela será julgada sob um conjunto diferente de regras em relação a seus homólogos masculinos.
“Nunca tivemos uma primeira-ministra. Acho que estamos definitivamente prontos para isso. Já passou da hora, eu diria”, afirmou à CNN Dario Fabbri, analista político e editor da revista Domino. “Mas não sei de que maneira a sociedade como um todo a receberá. Isso é algo desconhecido, tanto para ela como para nós”.
Emiliana De Blasio, consultora de diversidade e inclusão na Universidade LUISS em Roma, explicou à CNN que a política de Meloni é mais importante do que seu gênero, mas que ela não provou ser uma feminista em primeiro lugar.
“Precisamos refletir sobre o fato de que Giorgia Meloni não está levantando todas as questões sobre os direitos das mulheres e o empoderamento em geral”, comentou.
Fabbri reconhece que pode ser mais fácil para Meloni encontrar aceitação no cenário global do que na Itália, onde apenas 49% das mulheres trabalham fora de casa, de acordo com uma pesquisa de gênero do Fórum Econômico Mundial.
“Vai depender de como ela vai agir, de como ela se apresentará aos líderes mundiais. Acho que ela caminha numa linha muito tênue quando se trata de sua imagem, de suas posições passadas sobre uma série questões, mas até agora ela não cometeu muitas gafes nesta campanha eleitoral”, contou Fabbri à CNN.
“Mas, obviamente, estar à frente de um governo é algo muito diferente. Portanto, acho que a maneira como ela será recebida não terá muito a ver com os preconceitos em relação à Itália, porém com a forma como ela se apresentará aos líderes mundiais”.