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    Governo Biden não considera viável sancionar príncipe saudita por caso Khashoggi

    A resposta do governo democrata a relatório sobre o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi é considerada fraca para alguns e suficiente para outros

    Vivian Salama, Alex Marquardt e Kylie Atwood, , da CNN, em Washington

    O governo de Joe Biden nunca considerou as sanções contra o poderoso príncipe herdeiro saudita como uma opção viável, embora o novo presidente dos Estados Unidos tenha prometido punir os líderes sauditas durante as eleições. O príncipe Mohammed bin Salman é apontado como responsável pelo assassinato do jornalista Jamal Khashoggi.  

    Autoridades do governo disseram à CNN que houve pouco debate ou tensão dentro da Casa Branca na semana passada na preparação para o lançamento de um relatório de inteligência há muito aguardado sobre o brutal assassinato de Khashoggi em 2018. As fontes também contaram que a ideia de sancionar o príncipe herdeiro, o líder de fato da Arábia Saudita, nunca esteve realmente em discussão.

    A Casa Branca foi atacada sobre o que muitos críticos dizem ter sido sua resposta fraca às descobertas do relatório, especialmente devido ao discurso duro do governo sobre recalibrar o relacionamento com a Arábia Saudita, e as promessas de campanha de Joe Biden de fazer os sauditas pagarem um preço por seu papel no assassinato de Khashoggi. Nascido na Arábia Saudita, ele era colunista do jornal “The Washington Post” e fazia críticas ao governo saudita.

    Como a reportagem KFile da CNN informou, nos últimos anos, muitas das autoridades do alto escalão do governo criticaram duramente a falta de ação do ex-presidente Donald Trump contra a Arábia Saudita e Bin Salman.

    Em resposta ao relatório da semana passada, o Departamento de Estado colocou 76 sauditas em uma lista de proibição de viagens. Já o Departamento do Tesouro impôs sanções financeiras aos oficiais sauditas envolvidos no assassinato de Khashoggi. Mas bin Salman não estava entre eles.

    Sancionar o príncipe herdeiro, conhecido como MBS, teria sido “muito complicado”, de acordo com dois membros do governo, e poderia prejudicar os interesses militares dos EUA no reino saudita. Como resultado, o governo nem mesmo solicitou ao Departamento de Estado que elaborasse opções sobre como atingir MBS, segundo uma autoridade do Departamento de Estado. Outro atual membro do governo disse que sancionar o príncipe herdeiro nunca foi uma “opção viável”, já que poderia derrubar iniciativas importantes na região. 

    A principal razão é que MBS tem controle quase total sobre todas as alavancas de poder do país. Ele não é apenas o príncipe herdeiro: é vice-primeiro-ministro, ministro da defesa, presidente do Conselho de Assuntos Econômicos e de Desenvolvimento, presidente do Conselho de Assuntos Políticos e de Segurança e chefe da Aramco, a empresa estatal de petróleo e gás natural.

    Jamal Khashoggi
    O jornalista saudita Jamal Khashoggi
    Foto: CNN

    O pai de MBS, o rei Salman, que supostamente não está bem de saúde, mudou a governança saudita de décadas depois que assumiu o poder em 2015. Em vez de vários príncipes controlando diferentes ramos do governo, Salman criou um sistema no qual um único indivíduo detém todo o poder. Essa pessoa agora é MBS.

    Nas palavras de um ex-membro do governo, a inteligência dos EUA nunca encontrou uma “prova irrefutável” ligando diretamente a MBS ao assassinato do jornalista.

    “Não é suficiente sancionar alguém tão sênior apenas com base no fato de que ele toma todas as decisões importantes”, afirmou a fonte, acrescentando que o relatório da inteligência tinha poucos trechos para sugerir qualquer evidência específica ligando diretamente a MBS à decisão de matar o jornalista.

    Ao se abster de impor sanções diretamente contra MBS, fontes do governo dizem que estão fazendo uma aposta pragmática para preservar as relações diplomáticas com os sauditas, um movimento que esperam lhes comprará alguma influência sobre o aliado do Oriente Médio.

    “Recalibrar” e não “romper”

    A Casa Branca se manteve firme nos últimos dias, defendendo sua decisão de poupar o príncipe, embora às vezes se esforce para explicar seu raciocínio.

    No domingo (28), a secretária de imprensa da Casa Branca Jen Psaki afirmou de forma incorreta a Dana Bash, da CNN, que mesmo na história recente, os EUA não sancionaram “líderes de governos estrangeiros onde temos relações diplomáticas – e mesmo onde não temos relações diplomáticas”. Psaki fez uma afirmação mais restrita e precisa durante uma coletiva de imprensa na segunda-feira (1), dizendo que os EUA “normalmente” não impunham sanções diretas a líderes de países com os quais mantêm relações diplomáticas.

    Também na segunda-feira, Psaki disse que o governo se reserva o direito de fazer mais pela Arábia Saudita, mas isso depois de passar por um fim de semana de fortes críticas. Ainda durante a coletiva de imprensa de segunda-feira, questionada sobre como o presidente está reagindo aos ataques de que foi muito brando com os sauditas, Psaki respondeu: “Não acho que ninguém se candidata à presidência ou é eleito sem ter um casca grossa. Certamente, como em qualquer ação tomada em uma questão como diplomacia global ou uma questão em que haja uma relação complicada, acho que ele [o presidente] esperava que pudesse haver algumas críticas”.

    Psaki acrescentou que, como presidente, o papel de Biden “é agir no interesse nacional dos Estados Unidos. E é exatamente isso que ele está fazendo”. 

    No mesmo dia, no Departamento de Estado, o porta-voz Ned Price sugeriu que o governo Biden está tentando “recalibrar” e não “romper” a relação EUA-Arábia Saudita.

    “Estamos trabalhando para colocar o relacionamento com os sauditas nos Estados Unidos no caminho certo”, declarou Price a repórteres.

    Na terça-feira (2), Psaki reiterou a intenção do governo Biden de tratar o relacionamento com a Arábia Saudita de maneira diferente de Trump e observou as ações tomadas antes da divulgação do relatório, incluindo o fim do apoio dos EUA à guerra dos sauditas no Iêmen e criticando o reino por abusos dos direitos humanos.

    Foi pouco para apaziguar legisladores furiosos, incluindo muitos democratas, que atacaram a decisão da equipe de Biden de não sancionar MBS. Apesar do discurso duro do governo Biden, a recalibração completa que eles prometeram “não aconteceu”, disse um assessor democrata no Capitólio.

    Segundo dois assessores do Congresso, o governo Biden também falhou em manter o Congresso informado na preparação das ações que planejava tomar. Com isso, muitos políticos do Capitólio tentavam descobrir sozinhos na sexta-feira o que seria revelado no relatório.

    As sanções que vieram – contra um alto funcionário da inteligência saudita e a força protetora do príncipe herdeiro – foram “necessárias, mas não suficientes”, disse um assessor democrata à CNN.

    Um grupo bipartidário de legisladores anunciou imediatamente na semana passada que mais precisava ser feito para responsabilizar MBS, e alguns estão trabalhando em uma legislação.

    Embora o senador Ron Wyden, um democrata do Oregon, tenha elogiado o governo por suas ações, em um comunicado ele deixou claro que deveria “haver consequências pessoais para MBS – ele deve sofrer sanções, incluindo financeiras, de viagens e legais – e o governo saudita deve sofrer consequências graves enquanto ele permanecer no governo”.

    Em comunicado à CNN, o deputado democrata de Nova York Gregory Meeks, presidente do Comitê de Relações Exteriores da Câmara, disse que está “atualmente revisando outras medidas potenciais para responsabilizar todos os envolvidos, incluindo aqueles no topo. A repatriação forçada, intimidação ou assassinato de dissidentes pelo governo saudita, ou qualquer outro governo, não deve passar sem controle”.

    Membro do Comitê de Relações Exteriores da Câmara, a deputada Ilhan Omar, uma democrata de Minnesota, também notificou defensores por meio de seu escritório sobre sua intenção de apresentar uma legislação de sanções.

    “Não acho que ele [Biden] vá longe o suficiente, embora mereça no crédito, porque na verdade ele aumentou as sanções e as proibições de viagens para aqueles indivíduos que eram diretamente responsáveis”, disse o senador republicano Rob Portman no programa “This Week”, da rede ABC.

    “Não creio que alguém pense que o príncipe herdeiro não foi o responsável, ou seja, que ele não sabia ou aprovava. Acho que deve haver algo adicional concentrado nele”.

    Sábio em adiar

    O presidente eleito dos EUA, Joe Biden
    O presidente dos EUA, Joe Biden
    Foto: Kevin Lamarque – 19.nov.2020 / Reuters

    Nem todo mundo pensa que o governo Biden adotou a abordagem errada. Varsha Koduvayur, analista sênior de política da Foundation for Defense of Democracies, um instituto de política de Washington combativo nas questões exteriores, disse que o governo foi “sábio em adiar” as sanções ao príncipe herdeiro.

    “Obviamente, há um equilíbrio difícil que o governo Biden está tentando encontrar”, acrescentou a analista. “O governo está fazendo um ato de equilíbrio muito bom, no qual Biden está dizendo que não vai tolerar a abordagem transacional ou a diplomacia via Whatsapp”.

    O uso de bases militares da Arábia Saudita para operações regionais continua sendo uma prioridade para os EUA. Uma autoridade do governo disse à CNN que esse é um dos fatores que levaram à decisão da semana passada de não incluir MBS na lista de sanções.

    Brett McGurk – que atualmente chefia a diretoria do Oriente Médio no Conselho de Segurança Nacional – já havia conversando com a Arábia Saudita em busca de financiamento para apoiar a estabilização da Síria e outros interesses regionais quando trabalhou nos dois governos anteriores.

    “Não há dúvida de que ele e outros conselheiros consideram a Arábia Saudita muito importante para justificar” as sanções a MBS, disse o ex-funcionário do governo.

    Connor Spielmaker, da CNN, contribuiu para esta reportagem.

    (Texto traduzido. Clique aqui para ler o original em inglês).

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