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    Entenda a crise política que pode levar a Itália ao 68º governo em 76 anos

    Desde o fim da Segunda Guerra, tempo médio de governo italiano é de 13 meses; no período, somente um premiê exerceu mandato completo

    Renata Souzada CNN , em São Paulo

    Embora o mandato de um premiê italiano seja de cinco anos, nas últimas duas décadas — que, pelas contas básicas, deveriam ter abrigado cerca de quatro composições — a Itália passou por 11 diferentes governos e oito presidentes do Conselho de Ministros (o título italiano para chefe de governo).

    Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, quando o país voltou a ser uma República, somente um primeiro-ministro cumpriu todo o tempo de mandato: Silvio Berlusconi, entre 2001 e 2006, em dois governos diferentes. Nesse mesmo período foram 66 governos até chegar ao atual chanceler, Mario Draghi. Na média, seriam cerca 13 meses para cada gestão.

    Agora, o país europeu enfrenta uma nova turbulência política com o pedido de renúncia apresentado por Draghi ao presidente italiano, Sergio Mattarella.

    “O presidente do Conselho dos Ministros, para se sustentar no cargo, depende do apoio do Parlamento. Como tem muitos partidos no Parlamento, as coalizões parlamentares são, historicamente, muito instáveis. Por isso, a troca de governos e primeiros-ministros é muito frequente na Itália”, explica o professor de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP) Kai Enno Lehmann.

    O premiê apresentou sua renúncia na última quinta-feira (14), alegando que a “coalizão de unidade nacional” que sustentava seu governo não existe mais.

    No mesmo dia, Mattarella rejeitou o pedido, solicitando que Draghi compareça ao Parlamento para ter uma visão clara da situação política, segundo informou um comunicado do gabinete do chefe de Estado.

    Caso o primeiro-ministro não concorde em manter seu cargo, a alternativa seria convocar uma eleição no outono (do Hemisfério Norte), disse o ministro das Relações Exteriores, Luigi Di Maio, advertindo que uma votação antecipada prejudicaria a economia italiana.

    “A preferência do presidente nesse momento, me parece, é não ter novas eleições. Talvez seja inevitável que haja, mas a preferência é tentar formar um novo governo sem que haja novas eleições”, avalia Lehmann.

    A Itália não tem eleições no outono desde a Segunda Guerra Mundial, pois é neste período em que o orçamento costuma ser elaborado e aprovado pelo parlamento.

    Contexto

    A tentativa de renúncia de Mario Draghi, que iniciou seu governo em fevereiro de 2021, ocorre após o partido Movimento 5 Estrelas se posicionar contrário em uma votação da coalizão governista.

    A legenda boicotou uma votação de confiança parlamentar que envolvia os planos do premiê para enfrentar a alta do custo de vida, argumentando que eles não foram suficientemente longe.

    A moção abrangeu um pacote de ajuda financeira no valor de cerca de 26 bilhões de euros. Também inclui uma disposição que autoriza a capital da Itália, Roma, a construir um incinerador de lixo gigante — projeto que o 5 Estrelas sempre se opôs.

    Segundo Lehmann, contar com o “apoio duradouro” da legenda é “difícil”, dado que “o Movimento 5 Estrelas é um partido relativamente novo que já entrou em coalizão com partidos da extrema-direita e já entrou em coalizão com partidos liberais e sociais-democráticos. Então, vamos dizer, é ideologicamente flexível”.

    A avaliação da oposição é de que o partido, que sofreu uma cisão no último mês, está agindo por interesse próprio, visando melhorar seu desempenho dentre os eleitores.

    Eleições

    Se não forem antecipadas, as eleições gerais na Itália acontecem em 2023. Caso os eleitores sejam convocados às urnas antes disso, Draghi poderia permanecer na função como interino, mas não elaboraria um Orçamento para o próximo ano, nem poderia decretar reformas exigidas pela Europa.

    “A Itália não pode passar sem Mario Draghi”, disse Renato Brunetta, ministro da Administração Pública e membro do partido de centro-direita Forza Italia. “Não podemos perder a credibilidade e a confiança que ganhamos na Europa e no mundo em tempos tão difíceis”, publicou no Twitter.

    Nenhum dos partidos que integram a unidade nacional exigiu eleições depois que Draghi anunciou seu pedido de renúncia. Somente o partido de extrema-direita Irmãos da Itália, o único grande grupo que ficou de fora da coalizão, manifestou apoio à antecipação das eleições.

    “Com a renúncia de Draghi, esta legislatura acabou”, escreveu Giorgia Meloni, líder do partido, no Twitter. “Eleições imediatamente.”

    Por outro lado, caso Mario Draghi permaneça como presidente do Conselho dos Ministros, o desafio será retomar o apoio da maioria dos parlamentares. “O primeiro-ministro não pode se manter no cargo a longo prazo sem o apoio estável do parlamento, porque ele não teria como passar leis ou o Orçamento. Sem isso, ele não teria como se sustentar no cargo”, explica o professor da USP.

     

    *Com informações da CNN e de Angelo Amante, Crispian Balmer e Gavin Jones, da Reuters

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