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    Documentário traz uma nova luz sobre a vida de Tiger Woods

    “Ele não vai gostar nem um pouco dessa m***a”: disse uma das pessoas entrevistadas na produção

    Don Riddell, da CNN

     

    Tiger Woods
    Tiger Woods
    Foto: Reprodução/Instagram

    Tiger Woods sempre quis que acreditássemos que ele era gente como a gente. “Somos todos iguais, somos todos humanos”, disse Woods à CNN Sport em 2006.

    Ainda assim, ao mesmo tempo, ele entendeu o quão diferente ele realmente era. Questionado na mesma entrevista para onde poderia viajar no mundo e não ser reconhecido, ele disse: “Embaixo d’água! É por isso que gosto de mergulhar”.

    O jogador de golfe mais famoso do mundo, um dos atletas mais icônicos de nosso tempo, nunca se sentiu confortável com a fama – ele sofreu uma quase total falta de privacidade desde a infância.

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    Em 2019, com amargura na voz, ele contou à CNN Sport: “Eu não gosto disso. Nunca gostei disso”.

    Portanto, Tiger Woods provavelmente não vai gostar do novo documentário em duas partes do canal HBO que coloca a trajetória de sua extraordinária história de vida sob o microscópio. Woods não respondeu a um pedido de entrevista da CNN para falar do documentário.

    Uma das pessoas a dar depoimento no filme, o amigo da família Woods Joe Grohman, que diz ter sofrido antes de compartilhar um detalhe particularmente delicado, disse: “Ele não vai gostar nem um pouco dessa m***a”.

    “Ele tem defeitos”

    Muitos estarão familiarizados com os traços gerais da história de Woods: a profecia de grandeza, o domínio implacável e o estrelato global, a bela família, a espetacular e humilhante queda em desgraça e o retorno hollywoodiano de proporções épicas.

    Mas, quantas pessoas entendem as nuances e a complexidade do homem? Os pequenos detalhes que moldaram o arco de sua jornada? Como Woods aconteceu? Um dos codiretores, Matthew Heineman, disse à CNN Sport que tentar entender Woods foi o tipo de desafio que os cineastas gostam.

    “Como todos nós, ele é humano, ele tem defeitos”, disse Heineman. “Só que, ao contrário de todos nós, sua vida se desenrolou aos olhos do público de uma forma que provavelmente ninguém mais fez. Tiger é uma pessoa incrivelmente complexa; queremos realmente abraçar essa matiz e essa complexidade”.

    Ao mesmo tempo triunfante e inspiradora, a história também é trágica e dolorosa. Poucos personagens deixam a órbita de Woods ilesos, segundo os cineastas. Na maioria das vezes, eles são marcados e descartados, e o espectador sentirá simpatia por muitos deles. Até, às vezes, pelo próprio Woods.

    “Quero dizer, você não pode deixar de sentir alguma coisa por um cara”, diz o codiretor Matthew Hamachek, “que foi lançado aos holofotes nacionais aos dois anos de idade”.

    Hamachek e Heineman acreditam que o ponto crucial dessa história é o relacionamento entre um pai e seu filho. “Earl tinha uma visão do que seu filho se tornaria”, acrescentou Hamachek. “Não se tratava apenas de golfe”.

    A aparição no programa de televisão de Mike Douglas quando Woods tinha apenas dois anos agora é icônica, mas aquele estava longe de ser seu único encontro com a mídia quando criança. Em uma entrevista particularmente estranha para a TV mostrada no filme, ele inconscientemente quebrou a tensão ao responder à pergunta “Você gosta de jogar golfe?” com a resposta: “Eu quero fazer cocô”.

    O depoimento de uma de suas primeiras professoras, Maureen Decker, afirma que o pequeno Woods queria experimentar outros esportes, mas seu pai não permitia. “O mundo está pronto para o sucesso de um jogador de golfe não-branco. Eu criei o Tiger para isso, e ele leva essa responsabilidade a sério”, declarou Earl.

    A visão de Earl era que seu filho seria muito mais do que apenas um jogador de golfe

    O filme começa com um discurso que ele deu no banquete da premiação Haskins Collegiate em 1996. Earl fala ao público: “Ele vai transcender este jogo e trazer ao mundo um humanitarismo que nunca foi conhecido antes. O mundo será um lugar melhor para se viver, em virtude de sua existência e sua presença”.

    Falando quase em um sussurro e sem qualquer tentativa de subestimar sua grandiosidade, Earl conclui: “Este é o meu tesouro. Por favor, aceitem-no e usem-no com sabedoria”. O pai de Woods morreu em 2006 aos 74 anos, após um longo tratamento contra o câncer.

    “Criando este robô”

    Os cineastas disseram à CNN Sport que os representantes de Woods disseram que o jogador de golfe se recusou duas vezes a ser entrevistado para o documentário, citando um compromisso anterior com outra empresa de mídia. 

    No entanto, os produtores estavam ansiosos para ouvir sua voz e perspectiva durante todo o tempo, mesmo com o excesso de material de arquivo com entrevistas para usar no documentário. Em um vídeo mais antigo, Woods deu de ombros às expectativas de seu pai, dizendo: “É apenas meu pai falando, um pai orgulhoso”.

    Mas Earl pregava ao mundo que seu filho estaria um pouco aquém ao retornar aos campos, mas, assim que se profissionalizasse, seus patrocinadores ficaram muito felizes. Como Hamachek observou: “Parecia que ao longo de toda a sua vida as pessoas colocavam expectativas e projetavam o que queriam que ele fosse em Tiger”.

    O filme apresenta a narrativa de que Earl e Kultida, a mãe do campeão, criaram um autômato capaz de lidar com a pressão intensa no campo de golfe, com uma busca implacável pelo sucesso.

    Mas parece que eles também criaram um ambiente que atrofiou seu crescimento emocional, resultando em um ser humano imperfeito. No auge de seus poderes, Woods parecia encontrar conforto assistindo desenhos animados matinais com uma tigela de cereal.

    Alguns dos testemunhos mais reveladores são fornecidos por sua primeira namorada, Dina Parr, que diz ter visto para onde tudo estava indo.

    “Eu senti que o plano deles era de criar este robô. Havia toda essa preparação para o golfe, mas ele não tinha habilidades para a vida. Ele não estava preparado para a vida. E eu provavelmente era a única pessoa por perto que realmente o mantinha sob controle”.

    Parr diz que o relacionamento deles terminou abruptamente quando ela recebeu uma carta de rescisão fria e profissional de Woods, que “nunca mais queria vê-la ou ouvir falar” dela novamente. “Eu sei que isso é repentino e uma surpresa, mas na minha opinião é muito justificado”, escreveu o jogador de golfe.

    Parr ficou arrasada. Ela disse que eles haviam se apaixonado e eram felizes juntos. “Foi como uma morte, o Tiger que eu conhecia havia morrido. Sua doçura foi roubada dele”.

    Woods aprendera golfe com seu pai, com quem também aprendeu a ser duro. Earl foi boina verde nas Forças Armadas dos Estados Unidos, e lutou atrás das linhas inimigas durante duas missões na horrível Guerra do Vietnã.

    “Meu pai sempre foi a pessoa que plantava sementes e me encorajava, mas também dizia coisas que se apodreciam dentro de mim e que não iriam dar frutos por um tempo”, disse Woods em 2017 ao jornal “USA Today”.

    “Ele era uma pessoa muito terrena e pensava profundamente. Minha mãe era a executora. Meu pai pode ter estado nas Forças Especiais, mas nunca tive medo dele. Minha mãe ainda está aqui, e ainda morro de medo dela. Ela é uma senhora muito dura, muito exigente. Ela era a mão, ela era única, eu a amo muito, mas ela era dura”.

    Comportamento autodestrutivo

    Aos 13 anos, de acordo com o documentário, Tiger aparentemente foi ensinado a se hipnotizar, a desligar qualquer ruído estranho. Como a própria vida de Woods subsequentemente saiu do controle, os detalhes da história se tornaram um pouco mais sórdidos.

    Alguns espectadores conservadores podem adorar ver a parte em que ele traiu sua esposa, Elin, em um estacionamento de igreja. Foi um padrão de comportamento autodestrutivo que apresentou aos diretores do filme outro desafio: quanto deveria ser revelado?

    Hamachek e Heineman dizem que relutaram em exagerar o lado sensacionalista dos detalhes, mas também não podem subestimar a relevância deles.

    Eles dizem que reconheceram que os filhos de Woods poderiam um dia ver o filme, então cada decisão na edição foi tratada com muito cuidado. “Não seria como no site TMZ, e também não seria um sopro suave”, contou Hamachek.

    Heineman acrescentou: “É um retrato psicológico do homem através dessas entrevistas, e há detalhes na série que tocam em coisas que eu não necessariamente gostaria que fosse revelado [se fosse um documentário sobre a minha pessoa]. Mas essa é a história dele e não poderíamos fugir disso”.

    Através da visão do primeiro amor de Woods, Parr e dois amigos da família, Pete McDaniel e Grohman, o filme afirma explicar como o homem se fez. Mas é através do testemunho original de Rachel Uchitel, falando diante das câmeras pela primeira vez, que vemos no que o homem se tornou.

    Rachel Uchitel, que se tornou uma figura pública como resultado de seu relacionamento com Tiger, lança uma nova luz sobre um homem que parecia estar tentando escapar da pressão de tudo isso, e ela se viu no centro da tempestade quando o caso dos dois foi descoberto.

    Quando adolescente, o relacionamento de Parr com Woods terminou com uma carta. Já Uchitel diz que sua “rescisão amorosa” foi planejada por um advogado. Seu caddie de longa data Steve Williams também descobriu que a amizade com Woods pode ser revogada a qualquer momento e não há como voltar atrás.

    No entanto, não parece haver nenhum ressentimento daqueles que dizem que foram deixados de lado. “Acho que uma das coisas psicológicas mais interessantes é o quão incrivelmente protetores essas pessoas ainda são com Tiger. Não havia raiva nem amargura. Ainda sentiam muito amor por este homem, embora ele pudesse tê-los ferido profundamente”, contou Heineman

    Questionados sobre o que eles acham que a moral da história de Woods pode ser, os diretores lutam para identificá-la. Por ser um personagem tão complexo, ele não pode ser “colocado em uma caixa”. Mas Hamachek acredita que ninguém foi apenas um espectador descompromissado de seu golfe: todos estiveram mais envolvidos do que isso.

    “Nós meio que desempenhamos um papel em torcer por ele quando ele estava em ascensão, e muitas pessoas ficaram muito felizes com sua queda. E então estamos de volta lá para torcer por ele no retorno. Uma das coisas que achei fascinante nessa história é como o público em geral também é culpado por sua história. Todos nós nos projetamos neste homem”, diz Heineman. 

    “Queríamos que ele fosse o garoto-propaganda perfeito para romper e quebrar barreiras e fazer muitas coisas, e quando isso não aconteceu, nossas próprias expectativas foram quebradas e nossas próprias visões de nós mesmos e nossas próprias visões foram quebradas. Espero que, ao assistir ao documentário, as pessoas possam ao menos se sentir no lugar dele, [sentir] como é essa pressão e como é realmente esse holofote.” 

    Pai e filho

    Poucas semanas antes do lançamento do filme, Woods estava de volta ao noticiário. Ou, melhor dizendo, seu filho de 11 anos Charlie estava no noticiário: jogando golfe em público pela primeira vez.

    A presença de Charlie no campo, quando seu pai venceu o Masters de 2019 para concluir seu extraordinário retorno ao esporte, representou a conclusão do arco pai-filho. O surgimento de Charlie como um jovem e excepcional talento para o golfe por seu próprio mérito marca uma mudança de geração e o início de um novo capítulo.

    “É muito interessante ver Charlie e Tiger jogando juntos. O que ele aprendeu como ser humano? O que ele aprendeu como pai? Porque ele recebeu muitas lições de Earl, algumas das quais obviamente o beneficiaram muito, e eu acho que algumas obviamente o feriram muito”.

    Quinze vezes campeão, Tiger parece ter aprendido algo mais com seu pai, como proteger a privacidade de seus filhos. Embora Charlie tenha nos impressionado com seu talento prodigioso, ele não foi autorizado a dar entrevistas.

    O garoto pode agradecer a seu pai por isso, mas é uma lição que seu pai aprendeu da maneira mais difícil.

     Dan Kamal contribuiu para esta reportagem.

    (Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês)

     

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