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    Como nasce um acordo climático? Histórico mostra idas e vindas das COPs

    Conferências anteriores provam que há dificuldade em consenso e interferência do cenário geopolítico mesmo quando o tema é salvar o planeta 

    Giovanna Galvanida CNN

    Neste domingo (31), começa a 26ª Conferência das Partes da Organização das Nações Unidas, a COP26. Este é o encontro anual sobre o estado atual das mudanças climáticas causadas pela humanidade – e o que precisa ser feito para combatê-las, no menor tempo possível, em nível global.

    A COP26 será a primeira no contexto da pandemia de Covid-19 (a COP25 foi em dezembro de 2019) e, por conta de diferentes níveis de vacinação ao redor do globo, as comitivas de diferentes países foram afetadas.

    Agora, 26 anos depois da primeira edição, a COP26 desponta como a “cúpula da ambição”, com objetivos definidos (leia mais abaixo) pelo último grande consenso da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC): é preciso aumentar os esforços para conter o aumento da temperatura média do planeta em até 1,5ºC, conforme estabelecido pelo Acordo de Paris.

    Com a ajuda de autoridades no tema, a CNN elaborou uma linha do tempo com os principais acontecimentos das últimas cúpulas do clima, bem como quais eram os temas centrais, a importância de cada acordo, seus objetivos finais e onde estava – e está – localizado o Brasil em meio aos debates, ações e promessas.

     

    1972 – Convenção de Estocolmo: nascem as primeiras conversas

    “O homem é ao mesmo tempo obra e construtor do meio ambiente que o cerca”, diz a primeira frase da Declaração de Estocolmo sobre o Ambiente Humano, um dos documentos resultantes da Convenção de Estocolmo, de 1972 – uma espécie de antecessor das COPs, quando as nações se reuniram pela primeira vez para discutir o clima.

    O evento conclamava que, pela primeira vez, os países se engajassem na preservação ambiental, mas em tons diferentes das cobranças atuais. “Por ignorância ou indiferença, podemos causar danos imensos e irreparáveis ao meio ambiente da Terra do qual dependem nossa vida e nosso bem-estar”, diz a Declaração de Estocolmo.

    Apesar do marco inicial e da percepção de que o uso dos recursos do planeta era finito, apenas em 1988 a ONU decidiu encerrar a hipótese da destruição por “ignorância ou indiferença” e atribuiu responsabilidades ao consolidar o Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas (IPCC), principal fonte científica com estudos, análises e medições sobre o clima do planeta.

    “Já se reconhecia que havia um acúmulo de emissões de gás de efeito estufa, com conhecimento científico suficiente para entender que aquilo era um problema que estava provocando aceleração do aumento de temperatura da Terra e, por consequência, mudanças climáticas”, explica Carlos Rittl, especialista sênior em política ambiental da Rainforest Foundation da Noruega.

    1992 – Rio 92: as COPs começam a ganhar forma

    O caminho até a primeira COP ainda seria percorrido por mais alguns anos. Mas um dos eventos mais importantes para ditar o tom multilateralista das próximas convenções do clima aconteceu no Brasil com a Rio 92, também conhecida como Eco 92 ou Cúpula da Terra. O evento foi essencial para colocar o Brasil como protagonista nos debates ambientais, explica Rittl.

    A escolha do Brasil como anfitrião desse grande evento, relembra Rittl, já havia sido acordada anos atrás. O contexto da redemocratização de um país que colocou como direito um meio ambiente preservado em sua recém-aprovada Constituição impulsionou a imagem do país como proeminente quando o assunto era preservação ambiental.

    Um levantamento produzido pela organização Observatório do Clima sobre o histórico das COPs a define como “o maior ajuntamento de chefes de Estado da história, [que] produziu três convenções das Nações Unidas, uma declaração sobre florestas e uma carta de intenções sobre desenvolvimento sustentável, a Agenda 21”, mencionando o nascimento das convenções de Biodiversidade e do Combate à Desertificação. A principal delas trataria sobre as mudanças climáticas.

    Assim, foi na Rio 92 que se estabeleceu a Convenção-Quadro das Nações Unidas para Mudança do Clima (UNFCCC), que ditaria, a partir dali, quais seriam as prioridades frente às expectativas já identificadas de aquecimento dos oceanos, ocorrência de secas, enchentes, ondas de calor mais frequentes e a extinção de espécies – incluindo os seres humanos. A consolidação das intenções presentes no tratado recém-assinado viria pela realização anual das Conferências das Partes, as COPs (da sigla em inglês “Conference Of the Parties”).

    1995 – COP1: de Berlim, o papel de cada um

    Três anos depois, em 1995, seria realizada a COP1, em Berlim, capital alemã, sob a tutela da então ministra do meio ambiente Angela Merkel. Foram desenhados os primeiros rascunhos de um instrumento legal a fim de implementar a convenção e determinar quais seriam os papéis dos países desenvolvidos e das nações em desenvolvimento. Tais esforços seriam concluídos na COP3, no Japão, com a elaboração do Protocolo de Kyoto.

    1997 – COP3: em Kyoto, a do famoso protocolo

    “O Protocolo de Kyoto, assinado em 1997, foi o primeiro tratado definindo responsabilidades em termos de limites de emissões para países, na época chamados de desenvolvidos ou em transição para a economia de mercado”, explica Carlos Rittl.

    Divididos entre Anexo 1 e Anexo 2, os países signatários receberam responsabilidades distintas, mas complementares: enquanto o primeiro grupo deveria traçar metas para reduzir, até 2012, suas emissões em 5,2% em relação a 1990, o segundo grupo poderia contribuir com o esforço de mitigação por meio do Mecanismo de Esforço Limpo.

    Seria estabelecido um mercado para incentivar economicamente as nações em desenvolvimento, pertencentes ao Anexo 2, para receberem pagamentos por seus esforços. Era a base “inovadora” do chamado “mercado de carbono”, afirma Marina Grossi, economista e presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).

    O Protocolo de Kyoto propõe que países em desenvolvimento podem vender créditos de carbono para países mais ricos a fim de fomentar a preservação daquela região. Assim, o dinheiro recebido ajuda na manutenção de florestas, por exemplo, que são capazes de absorver grandes quantidades de carbono. O acordo seria vantajoso para ambos, já que geralmente é mais caro reduzir a emissão de poluentes em países cuja base energética, por exemplo, é amparada no funcionamento das termelétricas.

    Porém, entre a elaboração, aprovação e implementação de Kyoto, passaram-se mais de 10 anos. Os Estados Unidos travaram as discussões e rejeitaram aprovar o protocolo no Senado porque a China e a Índia encontravam-se na lista dos países em desenvolvimento – logo, não seriam obrigadas a refrear suas economias e suas emissões como os americanos.

    2007 – COP13: Em Bali, o mapa do caminho

    O Protocolo de Kyoto só seria ratificado em 2004, após uma imposição do cenário global do comércio: eram necessários 55 países que representassem pelo menos 55% das emissões globais de CO2. Naquele ano, a Rússia decidiu assiná-lo apenas para ser aceita na Organização Mundial do Comércio (OMC), pontua Rittl.

    No entanto, os anos seguintes demonstrariam que a conta das emissões não fecharia caso todos os países, incluindo os em desenvolvimento, não se engajassem no tema. Tais compromissos foram chamados de “Mapa do Caminho de Bali” e foram formalizados na COP13, em 2007, que aconteceu na capital da Indonésia.

    “As emissões dos países em desenvolvimento ultrapassariam as dos países desenvolvidos se você não estabelecesse formas de engajar todos”, explica Rittl. “Então, na época, não se visavam ainda compromissos obrigatórios para países em desenvolvimento, mas criaram-se incentivos de como obter financiamento climático para apoiar especialmente os mais pobres”, complementa.

    Para resolver o problema, os países signatários da UNFCCC, mas não de Kyoto, apresentariam metas “voluntárias” que pudessem ser mensuráveis e verificáveis pela comunidade internacional. Dessa forma, tanto os EUA quanto a China deveriam se comprometer com o clima e não havia a necessidade de aprovação por parte do Congresso americano. Daí em diante, era esperar uma mudança na maré política dos países para que as pautas climáticas, enfim, engrenassem.

    2009 – COP15: a frustração de Copenhague

    Porém, nada ocorreu como o previsto na COP15, realizada em Copenhague, na Dinamarca. Novamente por tensões entre China e EUA, a definição de compromissos factíveis ficou para depois.

    Vale destacar, no entanto, que o Brasil acabou surpreendendo os países ao apresentar, de forma inédita, suas próprias intenções voluntárias de redução das emissões em 40% até o ano de 2020, além da promessa de cortar o desmatamento na Amazônia em 80%.

    2011- COP17: a retomada do diálogo em Durban

    Com esse estímulo, países como a China, Índia, África do Sul e México também anunciaram metas voluntárias e, na COP17, em Durban, África do Sul, os primeiros consensos envolvendo a necessidade de formalizar um acordo do clima universal, obrigatório e para todos os países signatários da UNFCCC foram formados.

    Em 2014, na COP20, realizada em Lima, Peru, seriam criadas as contribuições nacionalmente determinadas pretendidas, as famosas NDCs em seu estado embrionário. Também foram discutidos aspectos de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, à necessidade de transparência internacional e mais estratégias de longo prazo. Em 2015, as discussões foram reunidas no que ficou conhecido como Acordo de Paris, assinado na capital francesa durante a COP21.

    2015 – Enfim, o Acordo de Paris

    Amparados pela publicação do 5º relatório do IPCC, o Acordo de Paris trazia a noção de que todos os países deveriam pagar uma conta a fim de limitar o aumento da temperatura média do planeta até 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais, com consequências catastróficas caso uma temperatura 2ºC acima da atual fosse atingida.

    “É provável que o aquecimento global atinja 1,5°C entre 2030 e 2052, caso continue a aumentar no ritmo atual. Um aquecimento acima da média global anual vem acontecendo em muitas regiões e estações, inclusive sendo duas a três vezes maior no Ártico”, diz o documento.

    “O Acordo de Paris fala do mundo inteiro pagando uma conta. Só há um modelo de desenvolvimento, e ele é qualificado com aquela sigla do ambiental, social e o econômico. As pessoas precisam estar no centro, mas temos que reduzir brutalmente as emissões”, analisa Marina Grossi.

    O Acordo seria formalizado em 2015 e já ratificado em 2016, na COP22, em Marrakech, Marrocos. Um acontecimento a parte da conferência, no entanto, teria um grande impacto global sobre o sucesso do ambicioso acordo: Donald Trump seria eleito presidente dos Estados Unidos em 9 de novembro de 2016, no meio da cúpula daquele ano. Entre suas promessas, estava a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris.

    “Eu estava ali na conferência, e o silêncio nos corredores na manhã seguinte à eleição dele era como se tivesse ocorrido um terremoto”, relembra Carlos Rittl.

    Já em 2020, todo o mundo se paralisaria diante da pandemia de Covid-19. Nesse contexto, a decisão de Trump sobre o Acordo de Paris acabou sendo revertida por Joe Biden, seu sucessor, que se elegeu com um forte discurso ambiental e denominou esta década como decisiva no enfrentamento às mudanças climáticas.

    No ano passado, a COP foi cancelada e os debates sobre o que ficou pendente do Acordo de Paris foram postergados para a conferência de Glasgow.

    O que esperar da COP26

    Para a cúpula do clima deste ano, há expectativas sobre quais serão as regulamentações acerca do mercado de carbono e de um fundo de U$S 100 bilhões de financiamento anual para nações em desenvolvimento. Também são esperadas as atualizações das NDCs de países que ainda não submeteram suas metas em relação ao que havia sido acordado em 2015.

    Além disso, com a publicação, em 2021, do 6º e mais recente relatório do IPCC, a noção de emergência climática espalha-se, de vez, a todos os tomadores de decisão.

    “O último relatório é bastante robusto. Você precisa estar em cenários de muito baixas emissões para que tenha acima de 50% de chance de ainda conseguir chegar nesse aumento de 1,5ºC”, explica Thelma Krug, pesquisadora aposentada do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

    “Foram mesmo observadas mudanças nos extremos climáticos, e eles aumentaram em frequência e intensidade. Nos eventos particularmente relacionados à temperatura, já existe um sinal claro da influência humana”, analisa a pesquisadora.

    O Brasil aparece pressionado pelos dados do desmatamento, mas com possibilidades de colocar metas “ambiciosas” e factíveis em jogo, diz Marina Grossi.

    “O Brasil tem uma grande vantagem porque nós somos mais limpos na indústria do que o resto do mundo, assim como na energia. O nosso grande problema de emissão é, sobretudo, o desmatamento ilegal. Se a gente amplia a agricultura de baixo carbono e acaba com o desmatamento ilegal, a gente resolve muito mais facilmente o nosso compromisso”, analisa.

    Além da comitiva do governo federal, que não contará com o presidente Jair Bolsonaro, a COP26 terá a presença de ao menos 13 governadores, que têm buscado maior engajamento no tema a fim de buscarem financiamentos verdes por conta própria. As negociações devem começar em peso a partir da 2ª semana de conferência.

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