Cientistas descobrem uma nova espécie de cobra que estava à vista de todos
Trata-se um novo gênero de cobra chamado Levitonius e de uma nova espécie, a Levitonius mirus
Às vezes, olhar para coisas que pensávamos conhecer com novos olhos (e novas ferramentas) pode levar a descobertas incríveis.
Foi o que aconteceu quando Jeff Weinell, um assistente de pesquisa da Universidade do Kansas, descobriu que três espécimes de cobras preservadas na coleção do Instituto de Biodiversidade da universidade, encontradas em missões de campo entre 2006 e 2012 e ignoradas até agora, pertenciam a uma categoria própria.
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Os três espécimes são os únicos membros conhecidos de um novo gênero de cobra, chamado Levitonius, e da nova espécie Levitonius mirus.
As descobertas de Weinell e colegas, baseadas em métodos que incluem análise de DNA e tomografias computadorizadas para examinar a estrutura óssea das cobras, foram publicadas na quarta-feira (23) na revista científica “Copeia”.
A recém-identificada Levitonius mirus, também conhecida como cobra-buraqueira anã de Waray, é nativa das ilhas de Samar e Leyte, nas Filipinas, um arquipélago de biodiversidade excepcional que inclui pelo menos 112 espécies de cobras terrestres, de acordo com o estudo.
A Levitonius mirus tem o menor número de vértebras entre todas as espécies de cobra conhecidas e um crânio longo e estreito em relação ao seu tamanho, descreveu Weinell em uma conversa com a CNN. Suas escamas são altamente iridescentes (ou seja, furta-cor) e é provável que sua dieta seja baseada em minhocas.
Uma descoberta fortuita
Originalmente, Weinell estava interessado em aprender mais sobre um grupo de cobras chamado Pseudorabdion.
“Ao sequenciar o DNA de espécimes Pseudorabdion, percebi que a Levitonius mirus estava erroneamente identificada como pertencente a esse grupo. A princípio pensei que era apenas um erro da minha parte, ou contaminação das amostras”, relatou Weinell.
Uma análise mais aprofundada das escamas das cobras e tomografias que iluminam sua estrutura óssea revelou que Weinell havia encontrado algo novo.
Uma cobra “miniaturizada”
A cobra é descrita como um gênero e espécie “miniaturizados”, muito menores do que seus parentes mais próximos, disse Weinell. Embora a Levitonius mirus tenha no máximo 17 centímetros de comprimento, o tamanho de um lápis, “os parentes mais próximos dela podem ser até três a quatro vezes maiores”.
“Isso tem muitas consequências, como a redução do número de ossos, uma espécie de simplificação do corpo”, disse Weinell.
“A miniaturização não foi observada com frequência, pelo menos em cobras”, afirmou o pesquisador da Universidade do Kansas. Essa cobra representa, segundo ele, um dos casos mais extremos dentro do clado (ramo) maior ao qual pertence, chamado Elapoidea. O clado também inclui cobras maiores e venenosas, como mambas. Weinell disse que a Levitonius mirus provavelmente não é venenosa.
Uma escavadeira indescritível
Os três espécimes examinados no estudo são os únicos conhecidos até agora, e a cobra nunca foi fotografada viva, disse Weinell à CNN.
Ele tentou fazer isso em 2017, viajando para as Filipinas, mas sua expedição não teve sucesso.
“Ainda há um bom habitat para elas lá, mas, como vivem no subsolo, é difícil encontrá-las a menos que você tenha as condições perfeitas para que eles saiam do buraco”, explicou Weinell.
Um novo gênero também
As descobertas vão além de uma espécie, levando a todo um novo gênero de cobras.
“Descrevemos a cobra não apenas como uma nova espécie, mas também como um novo gênero, porque ela é muito diferente morfologicamente da Oxyrhabdium, e porque a quantidade de divergência genética entre Levitonius e Oxyrhabdium é tão alta quanto o que é geralmente observado entre diferentes gêneros”, explicou o pesquisador.
Weinell prevê que mais espécies do gênero serão eventualmente encontradas nas Filipinas, embora o fato de essas cobras estarem adaptadas à vida no subsolo possa complicar a tarefa dos cientistas.
Como batizar espécies
Para Weinell, um aspecto especialmente excitante desse estudo foi a capacidade de nomear um novo gênero e uma nova espécie.
O nome comum da cobra homenageia o povo Waray-waray que habita a área onde os espécimes foram encontrados. O nome científico, Levitonius mirus, homenageia Alan Leviton, pesquisador da Academia de Ciências da Califórnia que passou décadas estudando cobras nas Filipinas, e continua fazendo isso até hoje.
“Ele não sabe, então isso será uma surpresa”, disse Weinell, falando antes da publicação das descobertas.
A palavra mirus, latim para “extraordinário”, fala sobre a natureza da descoberta de Weinell. “Eu procurava outra coisa e consegui achar isso, o que é muito mais importante do que eu estava procurando”.
A importância das coleções de biodiversidade
O fato de os cientistas poderem identificar um novo gênero e uma nova espécie de cobra com base em espécimes em uma coleção fala sobre a importância de manter repositórios de biodiversidade em instituições de pesquisa e universidades, destacou o coautor do estudo Rafe Brown, professor de ecologia e biologia evolutiva. Brown também é o curador responsável pelo Instituto de Biodiversidade e Museu de História Natural da Universidade do Kansas.
“Neste caso, os ‘biólogos especializados em campo’ identificaram erroneamente os espécimes – e fazemos isso repetidamente, ao longo dos anos. Eles não reconheceram o significado de nossos achados, que foram preservados e considerados como espécimes juvenis de cobras comuns um tanto normais e indefinidos”, Brown escreveu num comunicado.
“Muitas vezes, as pessoas que estão no campo, inclusive eu mesmo, podem não saber o que estão vendo no momento. Ninguém pode realmente ser o especialista em tudo”, disse Weinell.
As coleções de biodiversidade permitem que os cientistas retornem aos espécimes e continuem estudando-os de novas maneiras.
Há muito mais a ser descoberto ou redescoberto, especialmente à medida que a tecnologia avança e novos dados se tornam disponíveis para os cientistas.
“Agora que estamos obtendo dados de genomas inteiros de cobras, o que realmente está mudando nossa maneira de entender a evolução como um todo, a forma como definimos as espécies está mudando continuamente. Como isso afeta as coisas no futuro ainda não está claro”, concluiu Weinell.
(Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês).