Prime Time

seg - sex

Apresentação

Ao vivo

A seguir

    Bashar al-Assad espera que terremoto ajude a libertar Síria do isolamento global

    Ativistas sírios alertaram que governo está explorando o terremoto para se reabilitar, pedindo aos doadores internacionais que direcionem ajuda para Damasco e removam as sanções contra o país

    Nadeen Ebrahimda CNN , Abu Dhabi, Emirados Árabes Unidos

    Dias depois que um terremoto devastador atingiu a Turquia e a Síria, um avião de socorro pousou na cidade síria de Aleppo, marcando um dos maiores feitos diplomáticos do regime isolado do país em mais de uma década.

    O avião veio da Arábia Saudita, um dos mais ferrenhos opositores do presidente sírio Bashar al-Assad e seu regime aliado do Irã, acusado de reprimir brutalmente um levante iniciado em 2011.

    Foi o primeiro avião saudita a pousar em um aeroporto do regime em mais de uma década e foi veiculado com destaque na mídia estatal de ambos os países.

    Não muito tempo atrás, tal movimento teria sido inconcebível. Em 2016, uma campanha de bombardeio de Assad e sua aliada Rússia atingiu Aleppo em um esforço para retomar a cidade das forças da oposição – que na época eram apoiadas por Riad.

    Depois de anos de luta interna na Síria, Assad – com a ajuda de Moscou – recuperou o controle da maior parte do país, com exceção de uma faixa norte ainda controlada por várias forças de oposição, algumas das quais apoiadas pela Turquia ou pelos Estados Unidos. O terremoto afetou áreas sob o controle do regime, bem como aquelas mantidas pelos rebeldes, às quais os socorristas tiveram dificuldade de acesso.

    Até agora, o terremoto matou mais de 41 mil pessoas na Síria e na Turquia.

    Desde o terremoto, o governo sírio mobilizou seus funcionários e diplomatas para argumentar que as sanções ocidentais contra ele estão prejudicando o esforço de ajuda, mas os ativistas e os estados sancionadores não estão acreditando nisso.

    Ativistas sírios alertaram que o governo de Assad está explorando o terremoto para se reabilitar, pedindo aos doadores internacionais que direcionem a ajuda para Damasco, sua capital, e removam as sanções contra o país. Assad, dizem eles, deve se beneficiar com o terremoto.

    “O terremoto deu ao regime uma vantagem para sobreviver politicamente”, disse Omar Alshogre, um ativista sírio baseado em Washington que diz ter sido detido e torturado pelo regime de Assad. “Porque o regime sírio usará o terremoto para se normalizar”.

    Assad foi marginalizado internacionalmente depois que uma revolta de 2011 se transformou em uma sangrenta guerra civil entre o regime e as forças da oposição, apoiadas por atores estrangeiros, que queriam vê-lo partir.

    A Arábia Saudita tem sido um dos últimos grandes obstáculos à normalização regional com Assad, cujo regime foi suspenso pela Liga Árabe em novembro de 2011. Mas rumores têm circulado ultimamente de que a Síria está perto de ser readmitida, aguardando uma decisão sem objeções da Arábia Saudita e do Catar, que ainda não procurou Assad.

    Presidentes Vladimir Putin, da Rússia, e Bashar Al-Asad, da Síria / Imprensa do Kremlin/Anadolu Agency/Getty Images

    Durante uma reunião com o chefe de política externa da União Europeia, Josep Borrell, esta semana, o ministro das Relações Exteriores saudita, príncipe Faisal Bin Farhan, enfatizou a necessidade de entregar ajuda “a todas as partes da Síria”, acrescentando que “devemos garantir que o enorme fardo humanitário sobre o povo sírio seja retirado.”

    Riad não é o único ator estrangeiro a se coordenar com o regime de Assad após o terremoto. O presidente tem recebido diversas ligações e visitas de líderes e diplomatas estrangeiros. As Nações Unidas e a UE também atenderam à demanda síria de cooperação com o regime se quiserem entregar ajuda às vítimas no país.

    Entre as medidas mais duras contra o regime sírio está a Lei César de 2019 dos EUA, que impôs sanções abrangentes para restringir indivíduos, empresas ou governos de atividades econômicas que auxiliam o esforço de guerra de Assad. O ato tornou toda a economia intocável.

    Algumas autoridades e analistas ocidentais negam que as sanções estejam afetando as entregas de ajuda. Ainda assim, o Tesouro dos EUA emitiu na semana passada uma isenção de sanções de 180 dias sobre transações relacionadas ao alívio do terremoto.

    Charles Lister, membro sênior do Instituto do Oriente Médio em Washington disse que “não há correlação entre as sanções dos EUA e de outros parceiros afins em todo o mundo e a entrega de ajuda humanitária”.

    “Os verdadeiros obstáculos são políticos”, disse ele a Boris Sanchez, da CNN, acrescentando que o regime restringiu a ajuda transfronteiriça ao colocar muita pressão na ONU para coordenar com Assad.

    Alshogre, o ativista sírio, lamenta a decisão da ONU de coordenar com Assad, apesar do histórico de direitos humanos do regime, observando que Assad reteve no passado ajuda para punir rebeldes.

    Mas nem todos concordam que a coordenação levará necessariamente à reabilitação do regime.

    Presidente iraniano, Ebrahim Raisi, recebe o presidente sírio, Bashar al-Assad, em Teerã / 08/05/2022 Presidência/Divulgação via REUTERS

    Justine Walker, chefe global de sanções, conformidade e risco da Associação de Especialistas Certificados em Combate à Lavagem de Dinheiro (ACAMS), disse que discussões difíceis terão que ser feitas com o regime se a ajuda chegar a todas as áreas afetadas da Síria. “Você não pode entregar ajuda humanitária no vácuo sem isso”, disse ela à CNN.

    Walker, que trabalhou com sanções à Síria durante anos, enfatizou a importância de ver a complexidade que acompanha as sanções, especialmente no contexto da ajuda humanitária urgente.

    Embora as sanções não sejam a causa direta da desaceleração da ajuda humanitária no noroeste da Síria, atingida pelo terremoto, elas criaram um ambiente restrito que dificulta o envio de dinheiro, equipamentos e outras formas de ajuda em comparação com um país não sancionado, disse ela.

    Desde a compra de combustível de aviação no país sancionado até o apetite geral pelo risco que as sanções instilam em vários atores internacionais, as sanções acabarão por complicar a ajuda internacional em uma situação como a da Síria, disse ela.

    “É realmente tão complexo quanto a resposta humanitária e as sanções”, disse ela à CNN.

    O governo sírio não respondeu ao pedido de comentário da CNN.

    Muitos duvidam que Assad vá entregar ajuda a seus adversários em regiões que ele já bombardeou. O regime manteve uma estratégia de “cerco e fome” sobre seus oponentes em todo o país, disse Lister.

    “Portanto, se essa ajuda passar por Damasco, há uma chance extraordinariamente pequena de que ela vá para áreas do país controladas pela oposição”, disse ele, acrescentando que, no ano passado, Assad reprimiu o fluxo de ajuda humanitária de controladas pelo regime para áreas controladas pela oposição.

     

    *Com informações de Mostafa Salem e Celine Alkhaldi

    Tópicos