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    Análise: debate entre Biden e Trump pode expor contrastes decisivos para eleição

    Equipe do democrata aposta na ideia de que presidente não precisa ser popular, mas apenas mais aceitável que o adversário

    Stephen Collinsonda CNN

    O Todo-Poderoso não estará no palco ao lado de Joe Biden na noite de quinta-feira (27). Mas Donald Trump estará.

    A equipe de Biden está aproveitando o debate presidencial mais crítico dos últimos anos para expor a diferença de caráter e política que acredita que vai decidir as eleições de 2024, desde que os eleitores percebam isso.

    A personificação de uma das piadas de Biden, um tanto defensiva, é a ideia de que ele não precisa ser universalmente popular, mas apenas mais aceitável do que a outra opção, que, felizmente para ele, é o ex-presidente mais radical dos tempos modernos.

    “Meu pai costumava dizer: ‘Joey, não me compare com o Todo-Poderoso. Mas me compare com a alternativa'”, disse o presidente durante os seus comícios. O argumento é uma rede de segurança para um presidente que apresenta baixos índices de aprovação, o que normalmente o condenaria a um único mandato, tendo muitas dificuldades para vender suas realizações para os eleitores.

    A equipe de Biden coloca Trump como um agente de vingança “desequilibrado” e criminoso, incapaz de retornar à presidência, que só cuidará de si mesmo, dos amigos ricos e dos fanáticos antiaborto. Biden se vê inserido nesse conceito como um defensor da estabilidade e um guardião dos valores democráticos do país que está se esforçando incansavelmente para melhorar a vida dos trabalhadores.

    A campanha de Biden lançou as premissas para o debate em Atlanta, organizado pela CNN, em um memorando no fim de semana. “O debate de quinta-feira (27) será um dos primeiros momentos desta campanha presidencial em que uma fatia maior do eleitorado americano terá a oportunidade de testemunhar a escolha gritante entre Joe Biden, que está lutando pelo povo americano, e Donald Trump, que está lutando por si mesmo como um criminoso condenado com uma campanha desequilibrada de regência e retribuição”, escreveu o diretor de comunicações da campanha de Biden, Michael Tyler.

    O copresidente da campanha, Mitch Landrieu, também destacou o contraste no programa Meet the Press da NBC no domingo (22). “O povo americano precisa pensar na sabedoria, no caráter e no julgamento da pessoa que será indicada para liderar os Estados Unidos, não apenas em casa, mas também no resto do mundo.”

    A jornalista Kayla Tausche, da CNN, informou na terça-feira (25) que vários democratas de destaque fora da Casa Branca querem que Biden pare de tentar reivindicar o crédito por suas conquistas – incluindo o crescimento vertiginoso do número de empregos e um sólido histórico legislativo – e vá atrás de Trump diretamente. “Ele quer o crédito, mas não está funcionando”, disse um importante democrata, que compartilhou preocupações com a campanha.

    Como a eleição de 2024 será diferente

    Não é incomum que o presidente em exercício tente destruir o caráter e as credenciais de um oponente para reforçar uma difícil candidatura à reeleição. Em 2004, a equipe do presidente George W. Bush difamou o heroísmo do democrata John Kerry em relação à Guerra do Vietnã para retratá-lo como fraco demais para liderar a guerra contra o terrorismo. Em 2012, a campanha do presidente Barack Obama colocou o candidato republicano Mitt Romney como um tubarão corporativo rico e insensível, com uma alma vazia, que gostava de demitir trabalhadores.

    Esses dois ataques funcionaram. Mas esta não é uma campanha tradicional e Trump não é um candidato comum. Os democratas se sentem frustrados com o fato de que o retorno do ex-presidente aos holofotes políticos e sua corrida para a indicação do Partido Republicano ainda não tenha consolidado a comparação e o tornado politicamente inaceitável.

    E essa ideia de que os eleitores finalmente ligarão os pontos depende da premissa de que a maioria dos americanos, ao contrário dos obcecados por política nas campanhas e nos setores de mídia, geralmente não pensa em política e em eleições presidenciais. A ideia é que eles só precisam de um empurrãozinho para se lembrarem de como as coisas costumavam ser.

    Se Trump esbravejar e desabafar suas mentiras sobre a eleição de 2020 na quinta-feira, ele entrará no jogo de Biden. Mas, embora a audiência televisiva seja enorme, a ideia de que haverá um momento de conscientização nacional sobre a ameaça de Trump parece mais adequada à era de Cronkite do que à era do TikTok.

    Biden, cujo eleitorado acredita que o candidato seja muito velho para cumprir um segundo mandato – o qual terminaria aos 86 anos – também está sob pressão para criar uma visão de futuro para os eleitores que estão cansados com os preços altos. Portanto, ele precisa projetar certeza, resistência e autoridade em seu próprio nome para que a comparação funcione.

    Mas existe uma questão mais profunda sobre a estratégia do presidente. Será que é realmente verdade que, oito anos depois de Trump ter conquistado a Casa Branca e três anos depois de sua turbulenta presidência encerrada com violência, os eleitores ainda não entendem completamente quem é Trump? O domínio dele na cobertura da mídia dá a impressão de que ele nunca desapareceu.

    Por isso, os eleitores teriam que ser extremamente desinteressados para não saber que ele foi condenado recentemente, que foi alvo de dois processos de impeachment, que se recusou a aceitar a derrota em 2020, e convocou uma multidão para Washington, DC, pedindo aos seus apoiadores que “lutassem como o inferno” antes deles espancarem policiais e invadirem o Capitólio dos Estados Unidos.

    Para completar, Trump ainda perdeu um grande julgamento por fraude civil, foi considerado responsável por agressão sexual em um caso de difamação e comentou durante a pandemia sobre o uso de desinfetante para tratar a Covid-19 dentro do corpo. Nas últimas semanas, Trump enfrentou um julgamento relacionado a suborno em Nova York, atacando juízes, testemunhas e o sistema jurídico com a promessa de usar a presidência como um veículo de vingança pessoal e política caso ganhe um segundo mandato.

    Mesmo assim, ele ainda está em uma disputa acirrada com Biden e vem liderando em muitos dos estados decisivos que abrem caminho para os 270 votos eleitorais necessários para ganhar a presidência. Biden e seus colegas democratas podem ver Trump como inaceitável. Mas para milhões de eleitores ele não é.

    A disputa acirrada reflete na divisão de uma nação em duas, tanto política quanto culturalmente, e é um comentário sobre a impopularidade de Biden. Isso mostra um dos aspectos mais incomuns desta eleição. Nesse pleito, estão dois presidentes, ambos com um histórico de um único mandato, competindo pela Casa Branca. Os eleitores não precisam realmente questionar como Trump se comportaria como presidente – eles já viram isso, mesmo que um segundo mandato do 45º presidente já pareça mais extremista e volátil do que o primeiro.

    Como Trump deve tentar enfraquecer a estratégia de Biden

    Supondo que a campanha de Biden se mantenha fiel a essa estratégia de contraste, Trump poderia prejudicá-la dando um show de moderação e apresentando uma lista de planos para impressionar os eleitores preocupados com suas finanças pessoais.

    Durante a presidência de Trump, houve momentos isolados em que ele atendeu às expectativas de decoro. Karl Rove, o responsável pela vitória de Bush na reeleição de 2004, escreveu em sua coluna do Wall Street Journal na semana passada que “o Sr. Trump não pode parecer desequilibrado ou enfurecido. As palavras ‘eleição fraudada’ não devem passar por seus lábios. Ele tem que manter a calma e não pode fazer com que tudo seja sobre ele mesmo”. Esse é um conselho perspicaz, mas Trump geralmente não se comporta dessa forma.

    Alguns dos apoiadores do ex-presidente estão transmitindo conselhos na TV. A governadora de Dakota do Sul, Kristi Noem, por exemplo, disse na NBC no fim de semana que o debate seria uma “grande oportunidade para o presidente Trump falar a respeito (…) de como suas políticas quando ele era presidente do país eram boas para todas as famílias que viviam aqui, de como os preços dos alimentos e os preços da gasolina caíram”.

    O ex-presidente participou de várias sessões de política com seus apoiadores, apesar de seu desdém pela prática do debate formal. Entretanto, o roteiro geralmente é descartado quando ele entra ao vivo.

    As circunstâncias incomuns do debate de quinta-feira podem favorecer Trump. E para garantir que ambos os candidatos possam usar seu tempo sem interrupções, os microfones serão silenciados, evitando o caos do primeiro debate entre Trump e Biden em 2020.
    O comportamento do presidente na época durante debate foi explicado parcialmente dias depois, quando Trump foi levado às pressas para o hospital com um caso grave de Covid-19. Mas a reação de Biden, “Cale a boca, cara!”, deu voz aos eleitores cansados de quatro anos de cacofonia trumpiana.

    Outra diferença em relação aos anos anteriores é que o debate não terá público ao vivo em um estúdio da CNN em Atlanta. Muitas vezes, a retórica mais extrema de Trump irrompe quando ele discursa com uma multidão e repete os comentários que provocam uma forte reação.

    Mesmo assim, o encontro marcará o reencontro do ex-presidente com um oponente que ele culpa pelo que ele erroneamente acredita ser uma campanha de perseguição que ameaça sua fortuna e sua liberdade. E Trump não tem sido muito estratégico na preparação para o debate. Sua campanha passou dias tentando reverter suas expectativas em relação a Biden como um presidente idoso e decrépito que não consegue juntar duas palavras. Agora, sua equipe está insistindo que Biden estará “chapado” de drogas.

    Mesmo depois de meses de insinuar que Biden está senil demais para servir, a estratégia da campanha de Trump agora parece ilógica, uma vez que apresenta uma imagem de um argumentador supremo que, por implicação, parece ser de nível presidencial. O conselheiro sênior de Trump, Jason Miller, por exemplo, disse na terça-feira: “Sabemos que quando se trata de grandes eventos, quando se trata de debates, quando se trata do Estado da União, coisas dessa natureza, eles terão Joe Biden muito bem preparado”. Miller acrescentou: “Ele vai estar pronto para ir. Ele tem uma certa memória muscular que entra em ação pelo fato de ter feito isso por 50 anos”.

    Os democratas esperam que isso seja verdade e que Biden possa estar à altura da oposição do seu rival, o atual presidente que foi apresentado pela senadora Elizabeth Warren, de Massachusetts, durante dois dias de campanha em Wisconsin. Segundo Warren, Biden é “um homem bom e decente que protegerá a liberdade das mulheres em todo o país e que está lutando para reduzir os custos para as famílias trabalhadoras”.

    Warren acrescentou: “Deixe Donald Trump ser Donald Trump, o cara que atende a uma base extremista e que diz aos seus doadores ricos que, somente se eles colocarem mais dinheiro em sua campanha, ele lhes dará grandes reduções de impostos e reduzirá as regulamentações sobre o clima”.

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