Prime Time

seg - sex

Apresentação

Ao vivo

A seguir

    Alexandre Garcia: Ter assinatura do príncipe Philip é sinal da presença dele

    Jornalista foi condecorado pela Ordem do Império Britânico, oferecida pela Rainha

    Alexandra Garcia, da CNN

    Terminada a guerra das Falklands (Malvinas), o embaixador do Reino Unido em Brasília convidou-me para almoçar e tinha uma pergunta. Queria saber se a Rainha me oferecesse a Ordem do Império Britânico, eu aceitaria. Era apenas uma consulta e eu soube depois que a Rainha não poderia ser surpreendida com um “não”. 

    “Claro que sim!”, respondi, sem pestanejar. A mesma com que ela havia condecorado os Beatles e os heróis da Inglaterra!

    Eu não poderia usar o Sir, por não ser súdito britânico, mas poderia ostentar o OBE (Order of the British Empire) depois do nome. Muita honra. A condecoração ocupa lugar especial na minha vitrine de medalhas. E o certificado, com pompa e circunstância, tem a rubrica da Rainha no canto superior direito e a assinatura principal é do Grão-Mestre da Ordem, Príncipe Philip. Por isso, me tocou muito a morte dele. Ter sua assinatura na parede de minha casa é um sinal da presença dele. 

    Cobri a guerra no Atlântico Sul, em 1982, pela revista Manchete e pela rádio Manchete. Não pude entrar nas ilhas – o que era vedado -, mas estar na Argentina, naqueles dias, era como estar no front.

    No hotel, eu era seguido por um agente “secreto”, que descobri logo, pois quando estava na recepção ouvi o policial requisitando um quarto “vecino al huesped, Alejandro García”. O concierge me olhou e fez um sinal para que eu ficasse quieto. Quando eu transmitia pelo telefone os boletins para a rádio e ele discordava, dava chutes na parede.

    Os ingleses ainda estavam se equipando para zarpar para a zona de guerra e aproveitei para passar uns três dias em Brasília. O alto-comando da Marinha me chamou. Almirantes em torno de uma mesa criticavam minha cobertura, que previa a vitória dos ingleses. Diziam ser impossível uma marinha retomar ilhas que estivessem sob cobertura aérea do continente próximo. Aí, perguntei:

    – Almirante, como se chama essa insígnia que o senhor tem aí na manga?

    – Nó de Nélson – respondeu um deles.

    – Então não é uma Marinha qualquer que vem aí. É a de Nélson, que virou símbolo. Depois, fui ao Presidente Figueiredo e perguntei a ele porque estava ajudando a Argentina invasora, com peças de reposição e técnicos. Ele foi ao mapa-múndi na parede e me mostrou a distância entre Brasil e Inglaterra e a vizinhança da Argentina.

    – Quando a guerra acabar, a Inglaterra vai continuar a 10 mil quilômetros de distância e a Argentina vai continuar nossa vizinha.

    Fiz uma entrevista com o ex-chanceler argentino Camilión, e ele fez uma frase forte: “Galtieri atravessou o Rubicão; agora terá que provar que é César”. Foi preso no dia seguinte.

    Quando os ingleses retomaram as ilhas Georgias do Sul, fui chamado para o briefing do porta-voz-coronel argentino. Ele fez uma longa peroração, falando em batalha sangrenta, praias manchadas de sangue e o heroísmo da pequena guarnição argentina, atacada por forte esquadra naval. Levantei o braço e disse:

    – Desculpe, coronel, mas bastou uma salva de artilharia de uma fragata inglesa e os argentinos ergueram bandeira branca, rendendo-se a uns poucos ingleses que chegaram em dois botes.

    – Mentira! – gritou ele. E veio em minha direção, arrancou minha credencial e me expulsou dali. 

    Denunciei um plano argentino para invadir as ilhas chilenas de Beagle se a Senhora Thatcher não tivesse reagido. Atravessei os Andes e entrevistei o Presidente Pinochet.

    Ele me revelou, em segredo, que já sabia disso, e que, por isso, o exército chileno estava nos Andes, a Marinha no sul e a aviação no norte, se houvesse tentativa de retomada de territórios perdidos por Peru e Bolívia na Guerra do Pacífico.

    Argumentei que o Chile estaria cercado por inimigos. Ele inflou o peito e observou: “Si, pero será una buena pelea”. Quando os ingleses afundaram o Belgrano, a Marinha do Chile foi a primeira a chegar para resgatar os náufragos. Estava ali, pronta.

    Conversei com o Secretário de Estado dos Estados Unidos, logo depois de uma tentativa com o Presidente Galtieri, para que se retirasse das Malvinas. Alexander Haig resumiu: “He’s a drunk”. 

    Hoje, os ingleses estão de volta com as ilhas, os dois países estão pacificados e ainda discutindo o assunto, e estou com essas lembranças – e tantas outras, que não cabem neste pequeno espaço. Minha última reportagem da guerra na Manchete comparava a guerra à letra trágica de um tango.

    Foi um ano belicoso. Depois dessa, cobri guerra em Angola e no Líbano.

    Tópicos