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    Entenda a importância da taxa de abstenção nas eleições presidenciais dos EUA

    Em 2016, dos 224 milhões de cidadãos aptos a votar no país, somente 137,5 milhões participaram de fato

    Em 2016, dos 224 milhões de cidadãos aptos a votar nos EUA, somente 137,5 milhões participaram de fato
    Em 2016, dos 224 milhões de cidadãos aptos a votar nos EUA, somente 137,5 milhões participaram de fato Foto: Divulgação / Unsplash

    Jéssica Otoboni,

    da CNN, em São Paulo

    Se o voto não fosse obrigatório no Brasil, você votaria? Nos Estados Unidos, votar é uma opção e quase metade da população não costuma participar das eleições. 

    Segundo dados da Pesquisa de População Atual (CPS, em inglês) do Departamento do Censo dos EUA, dos cerca de 224 milhões de norte-americanos aptos a votar, aproximadamente 157,5 milhões estavam registrados para isso nas eleições de 2016. Dentre estes, 137,5 milhões realmente votaram, o que corresponde a 61,4% de todos os cidadãos do país.

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    Ao longo dos anos, a composição demográfica da parcela votante sofreu algumas alterações. Por exemplo, no começo dos anos 1980, a maior parte do grupo que participava das eleições tinha entre 45 e 64 anos. Já no começo da década seguinte, tinha entre 30 e 44 anos. 

    No geral, os jovens são os que mais se abstêm do pleito. Em 1980, 22,3% dos norte-americanos com 18 a 29 anos votaram, contra os 15,7% que o fizeram em 2016. Na outra ponta, com mais de 65 anos, foram 16,8% em 1980 e 24,2% em 2016. A faixa etária que mais costuma marcar presença nas eleições é a de 45 a 64 anos (37,6% em 2016).

    Até mau tempo justifica ausência

    Os norte-americanos não registrados alegam que não buscam o registro por motivos como falta de interesse, perda de prazos e acharem que não vão fazer diferença, conforme indicado pelo Censo. Já as explicações para os cidadãos registrados não participarem do pleito vão de falta de interesse, falta de tempo, problemas de saúde, problemas para se registrar, falta de transporte e até mesmo mau tempo. 

    Meredith Rolfe, professora de Ciências Políticas na Universidade de Massachusetts Amherst, afirmou no livro Voter turnout: a social theory of political participation (Participação eleitoral: uma teoria social sobre participação política, em tradução livre), de 2012, que a participação é maior em estados que facilitam o registro para o voto. Dentre essas medidas, estão pontos como deixar os locais de registro abertos durante noites e finais de semana e permitir o voto à distância. Apesar disso, a justificativa mais utilizada pela população registrada é simplesmente não gostar dos candidatos. 

    Mas de acordo com a Instituição Brookings, uma organização política pública sem fins lucrativos sediada em Washington, os eleitores se dizem mais interessados em política em 2020. E isso levou a um maior engajamento, já que 78% dos democratas e 77% dos republicanos alegam que pensaram “muito” sobre a eleição deste ano, em comparação aos 44% dos democratas e 52% dos republicanos que o fizeram em 2000.

    Mais confiança em 2020

    Segundo o instituto de pesquisa Gallup, 67% dos norte-americanos afirmam que estão mais entusiasmados do que o normal para as eleições de 2020. Este é o maior número já registrado pela instituição desde 2004. E esse entusiasmo cresceu nos dois polos: 80% entre os democratas e 75% entre os republicanos. Entre os independentes, o aumento foi menor – 54%.

    Além disso, 59% da população diz que está “muito” ou “de alguma forma” confiante de que os resultados serão apurados de forma precisa nestas eleições – assim como em 2008, quando registrou a mesma taxa, as mais baixas desde 2004. Neste aspecto, os democratas (74%) estão mais confiantes do que os republicanos (44%).

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    E em um ano marcado pelas manifestações do movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), que pedem o fim do racismo e da violência policial, o voto da população negra será fundamental para definir o candidato vencedor nos chamados swing states – aqueles que ora são majoritariamente republicanos, ora majoritariamente democratas e, portanto, é onde a disputa é mais acirrada.

    O instituto Pew Research Center informou que 57% dos negros votaram nas eleições presidenciais em 2000, 60% em 2004, 65% em 2008, 67% em 2012 e 60% em 2016 – os dois maiores índices registrados quando o democrata Barack Obama se candidatou. 

    Sob uma ótica mais ampla, a participação negra aumentou nas votações ao longo das últimas três décadas. Em 1980, por exemplo, eles eram 8,9% do total de eleitores. Já em 2008 eram 12,1%; em 2012, 12,9% e em 2016, 11,9%.

    Apesar de o candidato democrata à presidência, Joe Biden, contar com o apoio de Obama, do qual foi vice, pesquisas mostram que ele não tem a mesma conexão com os eleitores negros. De julho a setembro, o Gallup mostrou que Biden tinha 75% de apoio entre o grupo, marca um tanto distante dos mais de 90% registrados por Obama de agosto a outubro de 2008.

    Mas, afinal, por que a participação é tão baixa?

    Uma das peculiaridades do sistema eleitoral dos EUA é o processo conhecido como gerrymandering. Na maioria dos estados, parlamentares e governadores são responsáveis por desenhar o mapa dos distritos eleitorais. Normalmente isso acontece a cada dez anos, após a publicação do Censo norte-americano, que indica mudanças demográficas no país. O objetivo é desenhar os distritos com base nos dados do Censo.

    Gerrymandering é a prática de manipular esse desenho para favorecer (ou desfavorecer) um determinado partido ou grupo. Isso é feito ao se reunir o maior número de representantes possível para fortalecer um lado ou diluir o apoio ao outro. Em outras palavras, é uma forma de controlar quem fica no poder. E isso não é novidade: acontece na política do país há mais de 200 anos. 

    Para Louis Caldera, ex-secretário do Exército dos EUA e professor de Direito da Universidade Americana, em Washington, esse é um dos motivos que levam a uma baixa participação dos norte-americanos nas eleições. 

    “Aqueles que controlam quem pode votar e como os distritos legislativos são sorteados podem definir quem tem mais chance de vencer as eleições”, afirmou ele à CNN. “Muitas vezes, isso é um duro exercício de poder político que permite a um partido com apoio eleitoral minoritário vencer as eleições com mais de sua parcela de apoio entre a população votante e se consolidar como partido majoritário”, explicou. “Leis destinadas a suprimir os votos de apoiadores de partidos desfavorecidos [nanicos] é uma das razões pelas quais a participação eleitoral é tão baixa nos EUA.”

    Como funciona o gerrymandering

     

    O ‘problema’ do Colégio Eleitoral

    O peso desse sistema nas eleições presidenciais fica claro quando se analisa o formato eleitoral do país. Diferente do Brasil – onde os eleitores votam diretamente no candidato que preferem e vence quem obtiver a maioria dos votos –, nos EUA o processo é um pouco mais complicado. 

    Quem participa do pleito vota no candidato à presidência, porém o voto vai para os delegados, representantes que se reúnem em seus respectivos estados e votam no presidenciável e vice. Cada estado tem um determinado número de delegados – que compõem o Colégio Eleitoral – e, na maioria deles, o candidato que tiver a maioria dos votos leva todos os delegados, independente da diferença percentual – processo conhecido como “winner takes all” (o vencedor leva tudo).

    Com isso, determinar os limites dos distritos pode minimizar a força do partido rival naquela região. E para muitos norte-americanos, esse sistema dá a sensação de que o voto deles não importa.

    Segundo uma pesquisa divulgada pelo Gallup em setembro, três em cada cinco norte-americanos são favoráveis à aprovação de uma emenda na Constituição para substituir a votação por Colégio Eleitoral pelo sistema de voto popular. O instituto informou que 89% dos democratas são a favor da troca, enquanto 77% dos republicanos preferem manter o formato atual.

    A explicação para essa diferença está nos números das eleições. Candidatos que se elegeram após vencer a disputa no Colégio Eleitoral e perder no voto popular aconteceu somente quatro vezes até hoje na história do país, sendo as duas últimas em 2000 e 2016. Nos dois casos, os republicanos ganharam no Colégio Eleitoral, apesar de perderem para os democratas no voto popular, e levaram a Casa Branca.

    No entanto, para aprovar uma emenda na Constituição e abolir o sistema do Colégio Eleitoral, é necessário o apoio de dois terços da Câmara e do Senado, além de três quartos dos 50 estados dos EUA. Dada à grande polarização entre os partidos sobre o assunto, é pouco provável que uma mudança no tema seja aprovada em um futuro próximo.