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    Covid-19 nos Jogos frustra atletas e retoma debate sobre recuperação

    Bruno Schimidt, dupla de Evandro no vôlei de praia, teve 70% do pulmão comprometido em fevereiro e está nas oitavas de final; outros atletas perderam os Jogos

    Leandro Iamin e Paulo Junior, colaboração para CNN

    Ondrej Perusic chegou a Tóquio ocupando o quinto lugar do ranking mundial no vôlei de praia. Faltavam alguns dias para a cerimônia de abertura das Olimpíadas de 2020, e pouco depois viria a estreia nas areias. Mas o tão temido teste para Covid-19 terminou em resultado positivo para o tcheco. O atleta, um dos primeiros casos confirmados da doença entre as delegações na Vila Olímpica, temia perder os Jogos. Pior: acompanharia o desenrolar dos dias sozinho, em quarentena, torcendo para haver tempo o suficiente para entrar em quadra.

    Ondrej Perusic testou positivo para Covid-19 em Tóquio, mas se recuperou
    Tcheco Ondrej Perusic testou positivo para Covid-19 em Tóquio, se recuperou em tempo de participar das Olimpíadas. O atleta perdeu a primeira partida sem entrar em quadra
    Foto: Felipe Dana – 29.jul.2021/AP

    Ele não compareceu à rodada de abertura, na primeira segunda-feira de competições (26). O protocolo da súmula marca 2 sets a 0 para o time da Letônia. “Time Perusic e Schweiner estava impossibilitado de jogar a partida 08 por conta de protocolos de Covid-19”, guarda o documento oficial do jogo. Mas deu tempo de competir.

    Depois de dez dias isolado, relatando à imprensa local leves sintomas como coriza, dor de garganta e fadiga, além de poucas informações sobre os próximos passos e a liberação ou não para jogar, Perusic entrou na quadra central às 4h (horário de Brasília) da última quinta-feira (29), e, dois minutos depois, fez seu primeiro ponto nos Jogos.

    Os tchecos venceram a dupla mexicana do grupo B e sobreviveram na disputa, ganhando a possibilidade de jogar pela classificação na rodada final, realizada na madrugada de hoje (31). O jogo contra Viacheslav Krasilnikov e Oleg Stoyanovskiy terminou em 2 sets a 1 para o Comitê Olímpico Russo. Com o resultado, Perusic se despediu dos Jogos.

    Casos

    O Comitê Organizador dos Jogos divulga um balanço dos casos positivos desde o início do mês. Nesta sexta-feira (30), a lista chegou a 225 infectados, sendo 26 atletas. Alguns deixaram suas delegações desfalcadas, outros puderam ser substituídos e há quem tenha achado tempo de cumprir a quarentena obrigatória e voltar para a Vila Olímpica para competir.

    Não foi o caso de Candy Jacobs, skatista holandesa. Sua modalidade foi disputada nos primeiros dias das Olimpíadas, o que lhe tirou margem de espera. Nas redes sociais, assimilando o silêncio e a solidão da quarentena compulsória, Jacobs se disse com o coração partido. “Fiz tudo que estava ao meu alcance para evitar esse cenário e tomei todos os cuidados”, afirmou.

    “Vou precisar de algum tempo para deixar que meu coração partido se cure”, disse Candy, a skatista holandesa em isolamento e ejetada dos Jogos. Ela reclamou das condições da estadia e da falta de mais ventilação ou uma área aberta para o período trancada no hotel. Ela é a oitava do ranking mundial e tinhas grandes chances de disputar uma medalha no street junto de Rayssa Leal e companhia.

    Sam Kendricks, norte-americano, favorito no salto com vara, teve o mesmo destino. Se a prova dele está alojada em um lugar posterior na agenda, seu exame positivo também veio sem que houvesse tempo para quarentena e competição posterior. Bicampeão mundial, Sam, de 28 anos, foi um caso que aqueceu de novo a pauta sobre os testados positivos, já que não se trata de um competidor coadjuvante.

    Sequelas

    O corticóide é um medicamento usado geralmente no sexto dia do tratamento de internados com Covid-19. Enquanto combate a evolução do vírus, ele também diminui o número de mitocôndrias nos músculos. O corticóide, então, para salvar o paciente, compromete a performance atlética, já que é agente direto na redução da produção energética das mitocôndrias, que são parte da estrutura celular que pega o oxigênio e transforma em energia. Menos energia, menos performance.

    Fabrício Braga, cardiologista e diretor do Laboratório de Performance Humana da Casa de Saúde São José, analisa limitações de exercícios em sobreviventes de Covid-19. “No nosso estudo com mais de 700 pessoas, incluindo atletas, 40% têm capacidade aeróbica reduzida. Desses, 12% dos casos são por conta de lesões pulmonares. O maior fator de risco para isso é você ter sido sedentário até ter Covid. Mas, se você é um atleta e treina para competição, a chance de ter a capacidade aeróbica reduzida é 98% menor.”

    E dá tempo de ter Covid e chegar inteiro nas Olimpíadas? Gustavo Magliocca, médico do Palmeiras, explica. “Quem teve Covid em abril, maio, chega com risco aumentado de déficit aos Jogos em julho. Você tem o atleta mapeado e precisa saber como ele sai de 4 a 6 semanas após a infecção. Você documenta os exames cardiopulmonares e bioquímicos, depois acompanha as métricas de treinamento e observa se há sintoma residual da infecção. Isso nos responde se há sequela”.

    O diagnóstico de 4 a 6 semanas, porém, não responde, para Carlos Eduardo Pompilio, clínico e intensivista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, todas as questões. “Há uma síndrome que foi chamada de Covid-19 prolongada, que consiste na presença de sintomas até 12 semanas após a infecção aguda. Essa síndrome é constituída por vários sintomas. Fadiga, falta de ar, dor torácica, problemas de memória ou concentração, insônia, palpitações, tonturas, dores nas juntas, ansiedade e depressão, diarreia, dor epigástrica, dor de cabeça, entre outras coisas. Dá para imaginar o que isso pode causar em um atleta, combinando parte destes sintomas?”.

    Há também a preocupação quanto ao impacto da vacina, ou seja, se ela imuniza amplamente um infectado também para efeitos de sequelas. Luís Fernando Aranha Camargo, infectologista e professor de infectologia da Faculdade de Ciências da Saúde Albert Einstein, esclarece o consenso de que sim. “A vacina reduz o risco de doença grave, mas não elimina. A gravidade da sequela se correlaciona e é proporcional à gravidade da doença de uma maneira geral, mas não 100% linear. Há relatos de sequelas severas em pacientes com quadro leve”.

    A estima do Comitê Olímpico Internacional, anunciada pouco antes do início dos Jogos, era de que 80% das pessoas circulando na Vila Olímpica estariam vacinadas durante a estada – essas, se estiverem entre as infectadas, ao menos tem chances bem reduzidas de desenvolver um caso grave e carregar sequelas. A organização afirma que se trata da comunidade mais testada do mundo, tentando minimizar o impacto do evento esportivo no relevante aumento dos casos em Tóquio e nas cidades vizinhas.

    Bruno Schmidt, jogador de vôlei de praia, ataca bola contra polonês Michal Bryl
    Bruno Schmidt em jogo contra dupla polonesa, nas Olimpíadas de Tóquio
    Foto: AP Photo/Petros Giannakouris

    De volta

    Bruno Schmidt, campeão olímpico no vôlei de praia no Rio de Janeiro, viveu o caso mais grave dentro da delegação brasileira. Ele foi internado com um caso grave de Covid-19 em fevereiro, chegou a passar cinco dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), e quando voltou às quadras, em abril, acabou abandonando a sequência de torneios no México sentindo muita diferença em seu nível de velocidade e resistência.

    “A intenção de ter ido para Cancun era justamente averiguar minha situação atlética. E a gente diagnosticou alguns problemas que estamos atacando diariamente. Pode até ser perigoso eu me lesionar e ficar fora dos Jogos”, disse em maio, à CBV. Ele então retomou os treinos, como se fizesse uma nova pré-temporada de olho em Tóquio, e voltou a jogar só um mês antes de viajar para o Japão. Esteira, bicicleta, elásticos, pesos, flexões… Um passo atrás para iniciar uma rotina de recuperação.

    Nos Jogos, Bruno e Evandro se classificaram às oitavas de final com três vitórias em três partidas, única equipe brasileira sem derrotas – a dupla volta à quadra dia na próxima segunda-feira (2/8), à 1h (horário de Brasília) pelas oitavas de final, contra a dupla Plavins e Tocs, da Letônia. Há cinco meses, metade dessa dupla tinha 70% do pulmão comprometido pelo vírus que paralizou o mundo e adiou as Olímpidas. Agora, eles vislumbram um pódio olímpico enquanto ainda entendem as novas redações de um corpo tocado fortemente pela doença.

    “O Bruno de hoje agradeceria muito o Bruno de cinco meses atrás por ter encarado. Sabendo que não chegaria aqui 100%, chegaria 70% ou 80%, e mesmo assim iria dar o máximo”, afirmou depois de fechar a primeira fase de forma invicta. E