Quem foi ‘cancelado’ em 2020 e o que disse o tribunal da internet no ano
Diversas pessoas e empresas foram duramente criticadas nas redes sociais por comentários ou atitudes consideradas infelizes e/ou preconceituosas


A cultura do cancelamento não começou em 2020, mas muitos artistas e empresas acabaram sendo “cancelados” neste ano – e nem a Netflix escapou.
O movimento é aquele no qual pessoas são condenadas ao ostracismo em razão de um determinado comportamento ou comentário considerado ofensivo ou repreensível. Ou seja, é o famoso boicote.
Assista e leia também:
Lia Bock: Cultura do cancelamento é muito perigosa e detona a vida da pessoa
A cultura do cancelamento deve ser cancelada?
O Grande Debate: como evitar o linchamento na internet?
Confira abaixo uma lista com alguns nomes que foram cancelados nas redes sociais em 2020.
Alessandra Negrini

Logo no início do ano, no Carnaval, a atriz foi muito criticada por se vestir de índia ao desfilar no bloco Acadêmicos do Baixo Augusta. Vestindo um cocar e com pinturas no corpo, ela foi acusada por alguns internautas de apropriação cultural, debate cada vez maior durante a festa brasileira.
Após as críticas, Negrini publicou no Instagram uma nota oficial da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que defendeu a atitude dela. “Causa-nos indignação que uma aliada seja atacada por se juntar a nós em um protesto. Alessandra Negrini colocou seu corpo e sua voz a serviço de uma das causas mais urgentes. Fez uso de uma pintura feita por um artista indígena para visibilizar o nosso movimento”, segundo o comunicado.
“É preciso que façamos a discussão sobre apropriação cultural com responsabilidade, diferenciando quem quer se apropriar de fato das nossas culturas, ou ridicularizá-las, daqueles que colocam seu legado artístico e político à disposição da luta”, continuou a Apib.
Anitta

A cantora já foi cancelada e “descancelada” diversas vezes por motivos relacionados a posicionamento político, relação com outros artistas, entre outros. Uma das maiores “tretas” do ano no mundo do funk na verdade começou em 2019, em razão de uma polêmica com a cantora Ludmilla envolvendo a autoria da música “Onda diferente”.
Em 2020, Ludmilla fez um desabafo no Instagram sobre Anitta, relatando momentos de atritos entre as duas e criticando a colega pelo tratamento que teria recebido em ocasiões anteriores. Em um longo vídeo publicado no meio do ano, Ludmilla diz que “ela [Anitta] passou a vida me taxando de inferior a ela”.
“Teve uma época, que ela me chamava de projetinho de Alcione, como se fosse uma ofensa. Mas mal sabe ela que Alcione é uma das minhas maiores referências”, afirmou. Com isso, muitos fãs saíram em defesa de Ludmilla e dispararam críticas contra Anitta.
Em outubro, em uma entrevista à revista Quem, Anitta disse que não se importava com as críticas. “Não estou nem aí se vou ser cancelada ou não. Se eu for, o problema é de quem estiver perdendo tempo com isso. Vou gastar o meu tempo com coisas mais importantes. Não é da minha preocupação. Sou muito certa de quem eu sou, do meu caráter, dos meus princípios”, afirmou.
Gusttavo Lima

O cantor causou furor nas redes sociais em maio quando publicou uma foto junto ao também cantor Leonardo em que ambos seguravam galinhas. A legenda: “Garantindo a janta, mais tarde tem franguinho na panela”. Na imagem, não dava para ter certeza se os animais estavam mortos ou imobilizados.
Após uma enxurrada de críticas, com muitas pessoas dizendo que a imagem era “ridícula” e uma “exposição desnecessária”, Gusttavo Lima falou durante uma live nas redes sociais sobre a política do cancelamento e que a internet estava de “mimimi”. “Esse povo que está querendo me cancelar… Depois de 10, 12 anos de sucesso? Cancelar eu? Vai ser difícil”, disse ele.
Gabriela Pugliesi
No final de abril, em meio à pandemia de Covid-19, a influenciadora digital foi duramente criticada após postar uma série de stories no Instagram mostrando uma festa que ela realizou na própria casa, ignorando as determinações de isolamento social. Em um desses stories, ela e amigos aparecem gritando “F***-se a vida”, o que foi visto como um deboche à doença, diante do sofrimento de tantas pessoas.
Pugliesi chegou a publicar um vídeo no dia seguinte à festa se desculpando pelo ocorrido e no qual dizia estar arrependida, mas já era tarde demais. Além de ser cancelada pelos internautas, acabou perdendo diversos patrocínios.
Em uma entrevista ao site UOL em agosto, ela comentou o episódio do cancelamento. “Sou colocada na mesma cela que um estuprador, que um cara que é acusado de assédio, de um pedófilo. Não tem critério para o cancelamento”, afirmou ela. Apesar disso, ressaltou: “Não justifico meu erro de forma alguma, pois ele me fez entender e evoluir em questões pessoais.”
Thaila Ayala
No auge da pandemia no Brasil e no mundo, a atriz lançou uma grife de roupas com o nome Vir.Us 2020. Muitos a acusaram de tentar ganhar dinheiro com a pandemia. Mais tarde, ela decidiu mudar o nome para Amar.ca.
À revista Veja, Ayala disse que “nunca quis romantizar a pandemia”. Semanas depois, à revista Vogue, ela explicou que “a intenção era associar à ideia de viralizar na rede social”. “Fizemos uma leitura equivocada do contexto do momento. Porque agora a palavra ‘vírus’ é algo extremamente presente no nosso dia a dia, só que de outra maneira, por causa da pandemia”, afirmou.
Na época, ela comentou as críticas que recebeu e a cultura do cancelamento. “É importante falarmos dessa prática do cancelamento online. Acho que acaba inibindo as pessoas ao diálogo e ao aprendizado. Às vezes só conseguimos aprender a acertar depois de errar. A gente só melhora e evolui com diálogo, com empatia, com troca.”
JK Rowling

A autora da série de livros Harry Potter se complicou com os fãs ao fazer um comentário considerado preconceituoso no Twitter em junho. Em resposta a um artigo de opinião do site de desenvolvimento global Devex, ela comentou uma manchete que falava sobre “pessoas que menstruam” e criticou os termos utilizados.
“‘Pessoas que menstruam’. Tenho certeza de que costumava haver uma palavra para essas pessoas. Alguém me ajude? Wumben? Wimpund? Woomud?”, disse ela, escrevendo modificações propositais da palavra “Woman”, que significa “mulher” em inglês.
Críticos apontaram que as visões de Rowling igualavam feminilidade à menstruação, sendo que muitos homens transsexuais (que nasceram com o sexo biológico feminino) menstruam, e a acusaram de transfobia.
Na mesma sequência de tuítes, Rowling disse que não queria ofender a comunidade transsexual, apenas destacar que “o sexo é real e tem consequências vívidas”. “Respeito o direito de todas as pessoas transsexuais de viverem da maneira que seja autêntica e confortável para elas. Eu protestaria com vocês se vocês fossem discriminados com base em serem trans”, escreveu ela. “Ao mesmo tempo, minha vida foi moldada por ser mulher. Eu não acredito que seja odioso dizer isso.”
Madonna

Lá no mês de março, quando a pandemia começou a se agravar em muitos países do globo, a cantora norte-americana publicou no Instagram um vídeo dela dentro de uma banheira cheia de pétalas de rosas. Na gravação, disse aos fãs que o novo coronavírus é “o grande nivelador”.
“É disso que se trata a Covid-19″, afirmou ela no vídeo. “Ela não se importa com seu dinheiro, sua fama, se você é engraçado ou inteligente, onde você mora, quantos anos tem, quantas histórias incríveis pode contar.” E continuou: “É o grande nivelador, e isso é ao mesmo tempo a pior e a melhor característica”.
Madonna disse também que “o terrível é que isso nos fez iguais em muitos aspectos, mas a melhor coisa é que nos fez iguais em muitos aspectos”. Muitos seguidores dela criticaram a publicação e defenderam que a doença seria pior para os mais desfavorecidos. Após a repercussão negativa, a cantora apagou a publicação.
Jimmy Fallon

No fim de maio, o apresentador e comediante norte-americano Jimmy Fallon pediu desculpas pela interpretação do ator e também comediante Chris Rock durante um episódio do programa “Saturday Night Live”. Na ocasião, Fallon pintou o rosto de preto para se parecer com o colega, prática muito criticada conhecida como “blackface”.
Ele se desculpou após o vídeo do episódio, exibido no ano 2000, e as críticas voltarem a circular nas redes sociais.
“Em 2000, durante o ‘SNL’, tomei a terrível decisão de fazer uma imitação de Chris Rock com ‘blackface’. Não há desculpa para isso. Sinto muito por tomar uma decisão indiscutivelmente ofensiva e agradeço a todos vocês por me responsabilizar”, escreveu o apresentador do “The Tonight Show” no Twitter.
Fallon fez parte do elenco do “Saturday Night Live” de 1998 a 2004, enquanto Chris Rock participou da atração de 1990 a 1993. Apesar do pedido de desculpas, muitos seguiram com as críticas ao apresentador.
Netflix
Nem a Netflix escapou do “cancelamento”. A plataforma de streaming foi muito criticada após o lançamento do filme francês Mignonnes (Lindinhas, em português), no início de setembro, e registrou um aumento significativo na taxa de cancelamento do serviço.
A obra tem uma premissa delicada e discute a hipersexualização de pré-adolescentes nos tempos atuais. Diferente dos assinantes da Netflix, o filme foi muito bem recebido no Festival de Sundance, rendendo à diretora o prêmio de melhor da categoria.
“O filme fala por si. É uma história muito pessoal sobre crescimento, é a história da diretora. O filme foi muito bem em Sundance, sem essa controvérsia, e muito bem nos cinemas da Europa, sem essa controvérsia”, afirmou o co-CEO da empresa, Ted Sarandos, em uma entrevista à revista Variety.
“É um pouco surpreendente que, em 2020, a gente esteja discutindo censurar histórias aqui nos EUA”, completou. O filme segue disponível na plataforma.
Nubank
Em outubro, Cristina Junqueira, uma das sócias do Nubank, foi duramente criticada após afirmar que a empresa não tem negros em cargos de liderança por que a seleção “não pode nivelar por baixo”. A declaração, feita durante uma entrevista ao programa “Roda Viva”, da TV Cultura, foi considerada racista.
No dia seguinte, após a enxurrada de críticas, a empresária publicou um vídeo nas redes sociais em que pede desculpas pelas declarações feitas no programa. “Queria pedir desculpas, não me expressei da melhor maneira. Queria agradecer todo o feedback, todo o mundo tem o que aprender”, disse ela.
Dias depois, os três fundadores da empresa assinaram uma carta pública pedindo desculpas pelas declarações de Junqueira. No texto, eles não citam diretamente o episódio, mas dizem que o banco, que já possui ações voltadas para diversidade de gênero e orientação sexual, erra ao não fazer um esforço maior de inclusão étnico-racial e em se acomodar nessa posição.