Prime Time

seg - sex

Apresentação

Ao vivo

A seguir

    #CNNPop

    Quem foi Bob Marley, embaixador do reggae e ícone da fé Rastafári

    Músico jamaicano alcançou sucesso internacional quando ainda fazia parte da banda The Wailers

    Sofía Benavidesda CNN

    – Como você começou na música?
    – Comecei chorando.

    Após o estranho comentário também ao músico jamaicano Neville Willoughby, Bob Marley fica sério e diz que precisa pensar bem na pergunta porque não quer ser ingrato com “Jah”, em referência à forma como os membros do movimento Rastafari se referem a Deus.

    Ao longo de toda a entrevista de 1973, mantém-se o esquema: uma pergunta sobre algum aspecto específico de sua carreira – o sucesso, as revistas especializadas, os produtores musicais na Jamaica – e uma resposta na qual, além de algum dado pontual, Marley responde com reflexões sobre Deus, o poder do dinheiro, a Jamaica, as injustiças e a revolução.

    Uma pequena amostra do personagem, e algo que o tornou um artista lendário: Marley era músico, mas, ao mesmo tempo, era muito mais do que isso.

    Origens

    Bob Marley nasceu em 6 de fevereiro de 1945 em Nine Mile, uma comunidade rural da Jamaica. Filho de Norval Sinclair Marley, um supervisor rural branco, e Cedella Malcolm, filha negra de um funcionário local, Marley cresceu nessa pequena aldeia cujos habitantes conservavam costumes derivados de sua ascendência africana. “Os provérbios, as fábulas e as atividades associadas à vida rural” contribuíram para sua carreira como compositor um contexto cultural mais profundo e uma aura de misticismo”, como indicado em seu site oficial.

    Embora tenha levado o sobrenome e a família tenha contado com seu apoio financeiro, o pai de Marley não fez parte de sua vida desde a infância. A biografia oficial afirma que isso se deveu ao forte rechaço da família paterna ao casamento com sua mãe e a um episódio – às vezes relatado como um sequestro – em que Norval leva seu filho para Kingston, a capital do país, para que vivesse com seu sobrinho e fosse à escola, até que sua mãe descobre que ele não estava fazendo nenhuma das duas e o leva de volta com ela para Nine Mile. Segundo o perfil na web da enciclopédia Britannica, o menino Marley se caracterizava por sua timidez, seu olhar fixo e sua afeição por ler as palmas das mãos.

    Ainda adolescente, Marley voltou à capital para se instalar em Trench Town, uma zona de habitações chamada assim porque estava construída sobre um canal de águas residuais. Lá, enquanto se formava para aprendiz de soldador, começou a receber a influência musical do ska, um ritmo que havia surgido da interpretação local do soul e do R&B norte-americanos e que estava se expandindo comercialmente.

    Na mencionada entrevista, quando Willoughby lhe pergunta novamente sobre seus primeiros passos com a música, Marley finalmente responde: “Foi em Kingston. Costumava haver um lugar pequeno (…) onde fui uma noite, cantei uma melodia e ganhei uma libra. E um homem me disse para começar a cantar”.

    Decidido a se dedicar à música, Marley começa a se relacionar com outros aspirantes a cantor como ele e conhece alguns produtores, até gravar seus primeiros singles: “Judge Not”, “Terror” e “One More Cup of Coffee”. Diante da falta de sucesso, Marley recebeu apenas 20 libras por essas músicas.

    Sucesso e consagração

    Na década de sessenta, Marley fundou junto a outros dois amigos a banda The Wailers, enquanto fazia aulas de canto, ritmo e melodia com o respeitado cantor Joe Higgs. O primeiro sucesso do grupo, “Simmer Down” – no qual advertia os jovens a controlar seu temperamento ou “a batalha seria mais dura” – se converteu em um hino dos bairros marginais de Kingston.

    A canção demonstrou que já não era necessário repetir o estilo de artistas estrangeiros, mas que era possível escrever canções duras e intransigentes que refletissem os sentimentos da população local. A meados dos anos sessenta, o ska mutaria para o rocksteady, um ritmo mais lento que depois daria passagem ao característico ritmo reggae da Jamaica.

    Entre finais da década de sessenta e inícios da década de setenta, The Wailers aumentaram sua popularidade e prestígio localmente e, em 1972, ao lançar “Catch a Fire”, deram ao reggae uma audiência global.

    Esse disco levou The Wailers a uma bem-sucedida turnê pelos Estados Unidos e Reino Unido, após a qual gravaram um novo álbum, “Burnin”, que saiu à venda em outubro de 1973. Esse disco contou com algumas das canções mais célebres de Marley, como “Get Up, Stand Up” e “I Shot The Sheriff”, que Eric Clapton regravou e levou ao topo da lista Billboard Hot 100 em 1974, elevando significativamente o perfil internacional do carismático Marley.

    Nesse momento, o jamaicano havia se casado com Rita Anderson e havia passado alguns meses em Delaware, Estados Unidos, onde viajou para visitar o novo lar de sua mãe. Ao retornar, a situação da Jamaica havia se degradado devido ao desemprego, ao racionamento, à violência política e aos ajustes fiscais requeridos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), tudo o qual chegou a moldar as letras das canções que Marley escreveria então.

    De fato, sua carreira se consagrou com canções como “No Woman No Cry”, “Exodus”, “Could You Be Loved”, “Coming in from the Cold”, “Jamming” e “Redemption Song”, e álbuns emblemáticos como Natty Dread (1974), Live! (1975), Rastaman Vibration (1976), Exodus (1977), Kaya (1978) e Uprising (1980).

    Religião e política

    Em 1976, Bob Marley já era considerado um embaixador mundial do reggae e o responsável por ter popularizado internacionalmente as crenças rastafaris. Isso fomentava orgulho entre seus seguidores na Jamaica, bem como o repúdio de seus detratores, em um ambiente político cada vez mais dividido. Nesse ano, Marley sobreviveu a uma tentativa de assassinato em sua casa em Kingston, na qual alguns membros de seu círculo próximo ficaram feridos.

    Em 1978, ocorreu outro dos marcos na vida de Marley: sua primeira viagem à África, onde visitou o Quênia e Etiópia, este último o lar espiritual dos rastafaris.

    O rastafarianismo é, de acordo com a Britannica, um movimento político e religioso surgido na década de 30 na Jamaica e que combina elementos do cristianismo protestante, do misticismo e da consciência pan-africana. Seus membros consideram que os afrodescendentes em todo o mundo são “exilados na Babilônia” e acreditam que tanto a escravidão quanto a injustiça econômica e a discriminação racial são provações impostas por “Jah”. Além disso, muitos “rastas”, como são chamados os membros do movimento, acreditam que o último imperador etíope, Haile Selassie I, coroado em 1930, era a terceira reencarnação de Deus na terra (depois de Melquisedeque e Jesus) para redimir todos os negros.

    Assim, seu vínculo com essa religião uniu Marley e The Wailers à diáspora africana e vinculou o reggae a uma força unificadora e libertadora.

    Marley soube em 1977 que sofria de câncer no dedão do pé direito, que havia metastatizado e se espalhado por todo o seu corpo. Finalmente, faleceu em um hospital de Miami em 11 de maio de 1981. Nesse ano, o Governo da Jamaica o reconheceu com a Ordem de Mérito.

    Em outro trecho da mencionada entrevista, Willoughby diz a Marley que sempre volta à ideia de sofrimento. “Diria que você é uma pessoa triste ou zangada?”, pergunta.
    “Vejo maldade na Terra”, responde Marley, e acrescenta: “Não é raiva nem nada, é a verdade, e tem que brotar do homem como um rio”.

    Tópicos