Potência de mulheres negras inspirou triunfos da Viradouro no Carnaval
Nos últimos anos, a escola levou a força e poder das mulheres negras para a Marquês de Sapucaí três vezes
Após retornar ao grupo especial do Carnaval do Rio de Janeiro em 2019, a Unidos do Viradouro se cravou como uma das principais potências da folia carioca, com destaque para enredos que elevam a potência feminina e exaltam a importância do matriarcado negro ao longo da história.
O pontapé inicial da vermelha e branca de Niterói para levar tais narrativas para a Marquês de Sapucaí se deu ainda em 2020.
Naquele ano, a agremiação se inspirou nas Ganhadeiras de Itapuã – quinta geração de mulheres que lavavam roupa na Lagoa do Abaeté e faziam outros serviços em Salvador em busca da compra de sua alforria – para compartilhar uma história de luta e resistência na passarela do samba.
O resultado? Após 23 anos, a escola encerrou o jejum e saiu vitoriosa no grupo especial com o enredo “Viradouro de Alma Lavada”, assinada pelos carnavalescos Marcus Ferreira e Tarcísio Zanon. Esse foi o segundo título da Viradouro na elite carioca, o primeiro se deu em 1997.
Já em 2022, diante da pandemia de Covid-19, que alterou a dinâmica do mundo, incluindo todas as comemoração carnavalescas, a agremiação foi em busca do bicampeonato com o enredo “Não há tristeza que possa suportar tanta alegria”, destacando o sentimento dos foliões cariocas na folia de 1919 – que marcou o fim da pandemia da Gripe Espanhola.
O samba, inclusive, trazia uma proposta diferenciada, uma vez que se apresentava como a carta de um pierrô para uma colombina.
A Viradouro, com a mesma dupla de carnavalescos, frente à em um cenário tão diferenciado e repleto de incertezas, fez um paralelo sentimental entre as doenças que assombraram o mundo e garantiu a 3ª colação na disputa.
O poder feminino de volta
No último ano, a força feminina falou mais alto novamente. Com “Rosa Maria Egipcíaca”, a santa africana que foi escravizada e viveu no Brasil, o enredo refletia aspectos importantes da história diante dos olhos de uma mulher negra, feiticeira, beata e escritora.
Rosa, inclusive, foi autora de “Sagrada Teologia do Amor Divino das Almas Peregrinas”, o mais antigo livro escrito por uma mulher preta no Brasil.
O desfile, dessa vez assinado somente por Zanon e que alcançou o segundo lugar, ficando atrás da Imperatriz Leopoldinense, chamou atenção com diversas alas dedicadas à mineiridade da figura central, que veio da África ainda no período pré-Inconfidência.
Para 2024, o carnavalesco resgatou a ancestralidade africana, feminina, negra e religiosa que tiveram grande importância na construção cultural da sociedade brasileira.
Com o enredo “Arroboboi Dangbé”, o público recebeu a história das guerreiras Mino, no reino Daomé, atual Benin.
Nesta região, onde são as protagonistas, elas são iniciadas espiritualmente pelas sacerdotisas voduns, uma dinastia escolhida por Dangbé e, dessa forma, nasce o culto à serpente vodum, que acaba se disseminando pelo reino e chega ao Brasil, em terreiros da Bahia, anos mais tarde, sob a liderança da sacerdotisa daomeana Ludovina Pessoa, que espalhou a fé nos voduns pelo território.
Novamente, a aposta feminina e bem executada diante dos critérios exigidos para o desfile, rendeu bons frutos e o título de campeã do Carnaval 2024.