Ganhar o Oscar de atriz não é a prioridade, diz Fernanda Torres
Atriz evocou importância de premiar o filme para a cultura brasileira
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O papel de uma mãe que reconstrói sua vida após o desaparecimento do marido durante o regime militar brasileiro na década de 1970, retratado em “Ainda Estou Aqui”, rendeu à atriz Fernanda Torres, 59, sua primeira indicação ao Oscar. Mas ela diz que ganhar o prêmio de Melhor Atriz não é sua prioridade.
O que a atriz brasileira gostaria de ver acontecer em Los Angeles, Estados Unidos, em 2 de março é que o filme em si, que retrata a história real do ex-político Rubens Paiva e sua esposa Eunice, ganhasse. “Ainda Estou Aqui” foi indicado para Melhor Longa-Metragem Internacional e Melhor Filme, a primeira vez para um filme brasileiro totalmente falado em português.
“A família Paiva merece, e Eunice Paiva merece”, disse ela em entrevista à Reuters na sexta-feira (24), um dia após sua indicação, acrescentando que um prêmio na categoria internacional “já é ótimo”.
O filme, que conta a história da luta de Eunice Paiva para descobrir a verdade sobre o desaparecimento forçado do marido em 1971, “cumpriu um dever cívico” de mostrar às pessoas o que significa viver sob um regime autoritário, disse Torres.
“Quando você lê em um livro de história, ‘os direitos civis foram suspensos’, isso é apenas uma frase. Mas no filme, isso significa que eles podem entrar na sua casa, levar seu pai, depois levar sua mãe, sua irmã, deixar você sozinho”, afirmou a estrela.
A história de Paiva ressoa
Torres acredita que a história de Eunice Paiva repercutiu fortemente fora do Brasil porque, em sua essência, é sobre uma família em sofrimento, o que evocou empatia do público. A maneira como a protagonista se comportou serve de inspiração, acrescentou ela, em um nível pessoal e político.
“Estamos em uma situação muito difícil, então é natural que em momentos de medo no mundo, como o que vivemos, haja a ideia de que um governo autoritário resolverá nossa situação”, disse ela.
O filme fez os brasileiros falarem sobre Eunice Paiva e revelou a eles “o poder dessa mulher, que manteve a calma, que apostou no tempo, que confiou na justiça”, disse Torres. “Eunice é quase um guia para períodos de crise.”
É raro que filmes feitos no Brasil, o único país de língua portuguesa na América Latina, capturem audiências globais, acrescentou ela.
“Nós consumimos nossa própria cultura intensamente”, disse. “Mas existimos interiormente.”
Torres acredita que a visibilidade internacional e o reconhecimento de “Ainda Estou Aqui” podem ajudar as produções brasileiras a atrair investimentos.
Em 1999, o diretor de “Ainda Estou Aqui”, Walter Salles, 68, teve outro filme, “Central do Brasil”, brilhando no Oscar. O filme foi indicado para Melhor Longa-Metragem Internacional, enquanto Fernanda Montenegro, 95, que interpretou sua protagonista, estava concorrendo para Melhor Atriz. Nenhuma das duas ganhou o Oscar.
Montenegro é a mãe de Torres e interpreta uma Eunice Paiva mais velha em “Ainda Estou Aqui”.
“Ainda Estou Aqui” foi selecionado para mais de 40 festivais internacionais e acumulou prêmios importantes, como o prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Cinema de Veneza e um Globo de Ouro para Torres.
Nas redes sociais, os fãs brasileiros estão torcendo alto para que Torres ganhe o prêmio que sua mãe, agora com 95 anos, não recebeu. Mas Torres disse que o prêmio de Melhor Atriz é difícil de ganhar e não escreveu um discurso de agradecimento.
Ela aprendeu lições com a experiência de Montenegro há 26 anos, o que a ajudou a se preparar para a intensa campanha do filme e dezenas de entrevistas, incluindo uma aparição no “Jimmy Kimmel Live!” este mês.
“Quando ela fez ‘Central do Brasil’, ela não tinha ideia. Ela disse ‘Fiz um pequeno filme brasileiro e de repente fui arrastada para o mundo e não tinha me preparado, não sabia o que era'”, relembra.
Quando a temporada de premiações acabar, Torres não tem planos de se concentrar em uma carreira mais internacional. “Olha, eu sou uma mulher de 59 anos com sotaque, certo? Então, sou realista”, brincou a atriz.
Em outro momento de sua vida, ela poderia ter considerado se mudar para o exterior para trabalhar. Mas não agora. Seus pés, ela acrescentou, estão “firmemente plantados no Brasil”.
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