Veja os principais pontos do novo marco fiscal apresentado pelo governo nesta semana
Texto da nova âncora fiscal foi entregue ao Congresso na terça-feira (18); apesar da promessa de do presidente da Câmara de agilizar a votação da pauta na casa, instalação de CPMI pode atrasar
Após meses de debate, o Ministério da Fazenda apresentou na terça-feira (19) o novo marco fiscal desenhado para substituir o teto de gastos como principal âncora das contas públicas do governo federal.
O texto foi levado pessoalmente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Congresso Nacional e entregue nas mãos do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
O novo marco fiscal determina que as despesa da União poderão crescer até 70% do aumento registrados nas receitas recorrentes. A medida foca na sustentabilidade da trajetória da dívida pública e limita os pontos máximos e mínimos para a variação dos gastos do governo federal.
Caso o governo falhe na meta e entregue um resultado abaixo do limite mínimo, o aumento que poderá dar para os gastos do ano seguinte será menor (cai de 70% para 50% do aumento da receita pelas regras até 2027).
Por outro lado, caso o resultado saia melhor do que o esperado e supere a banda máxima, os recursos excedentes deverão ser direcionados para investimentos nos anos seguintes.
O texto idealizado pela equipe do ministro Fernando Haddad segue as premissas gerais apresentadas no fim de março, quando a Fazenda divulgou as linhas gerais da proposta.
Os limites de crescimento para o substituto do teto de gastos serão sempre redefinidos no começo de cada mandato, válidos para os próximos quatro anos.
As metas para o resultado primário, por sua vez, bem como suas bandas de tolerância, serão definidas anualmente, também sempre por quatro anos à frente.
Elas deverão ser incluídas pelo governo nas propostas anuais de Orçamento, o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO).
Pelo novo desenho, os gastos do governo em um determinado ano só poderão crescer uma parcela do que cresceu a receita com impostos no ano anterior. Isso garante que, na maioria das vezes, os gastos sempre crescerão menos do que a receita.
Além das regras delimitando o crescimento dos gastos, o novo regime fiscal também estipula metas de resultado primário, ou seja, em quanto os gastos do governo poderão exceder a receita (déficit) ou quanto o governo deverá economizar, com seus gastos, do que arrecada (superávit).
Essas metas serão definidas anualmente pelo governo, no texto do Orçamento, estipulando a meta de resultado primário para o ano em questão e para os três seguintes.
Exceções à regra
Assim como a antiga âncora fiscal, o novo marco vem com exceções. A medida inclui a capitalização dos bancos públicos como um tipo de despesa que passará a ser considerada no limite de gastos que o governo deve respeitar a cada ano.
Por outro lado, os gastos das universidades federais feitos com verbas próprias, que, na versão original do teto de gastos, de 2016, eram consideradas na conta, agora passam a ser excluídas, o que deixa um espaço livre um pouco maior para que o governo consiga acomodar suas despesas dentro das limitações das regras.
Entre outras exceções que estão dispensadas de cumprir o limite anual de despesas, listadas tanto pela regra antiga quanto pela nova, estão os créditos extraordinários (como os usados em 2020 para pagar os pacotes de ajuda durante a pandemia), os gastos com eleições e outras transferências constitucionais.
O novo marco fiscal também deixou de fora as receitas extraordinárias da conta que permitirá ampliar as despesas públicas.
É o caso de royalties, pagamentos de dividendos das estatais para o governo e receitas levantadas com os leilões de concessões, por exemplo.
Na prática, isso significa que o governo não poderá gastar a mais naquele ano, mesmo se sua arrecadação tiver um aumento acima do esperado por conta de alguma dessas verbas.
Arrecadação é a principal dúvida, dizem especialistas
O mecanismo para chegar na arrecadação para atingir as metas de superávit, assim como o resultado primário de 2024, estabelecidas pelo marco fiscal, são os principais pontos de dúvidas levantados pelos especialistas ouvidos pela CNN.
“Ainda sobram as dúvidas, a maior é se de fato a Fazenda vai conseguir aumentar o nível de receita como eles tem dito. A capacidade de aumento de receita que estava sendo indicada será uma frente de batalha para esse arcabouço funcionar, ele precisa desse aumento”, disse Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central (BC).
De acordo com um estudo feito pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco), para dar certo a nova regra, a arrecadação precisará de um incremento de R$ 150 bilhões a R$ 200 bilhões.
Analistas também chamaram a atenção para a possibilidade de a nova âncora fiscal pressionar pelo aumento da carga tributária, apesar de o Ministério da Fazenda descartar o movimento.
Segundo Haddad, uma das alternativas para turbinar a arrecadação será o combate a “jabutis fiscais”, com a retirada de benefícios supostamente indevidos de determinados setores.
Segundo o economista e especialista em contas públicas Murilo Viana, as opções para que o governo gere aumento de arrecadação sem expansão da carga tributária são limitadas.
“Quando você tira o incentivo fiscal de uma empresa, você está aumentando a carga sobre a atividade daquela empresa — além de que esse aumento de carga pode ser repassado ao consumidor”, apontou o especialista.
Votação na Câmara
Após a apresentação do novo marco fiscal, Lira disse que não vai dificultar a votação da pauta. O presidente Câmara dos Deputados afirmou que vai trabalhar e se dedicar com os líderes da Casa, pois, segundo ele, nada acontece sem o envolvimento dos líderes partidários.
“Não é o presidente que determina a aprovação ou não. A gente somente vai fomentar as discussões, facilitar o debate e pautar o projeto em um tempo adequado”, afirmou em coletiva na terça-feira.
Na avaliação de Lira, a proposta atende bem as metas econômicas do país. “Nós não vamos antever problemas. As polêmicas e as situações de discussões internas caberão aos partidos políticos”.
O presidente da Câmara reforçou que tem um desafio e um compromisso de discutir uma reforma tributária no primeiro semestre. Por isso, considerou ser importante ter a regra fiscal como todas as condicionantes discutidas e votadas antes da reforma tributária.
“Se pudermos cumprir o prazo de até dia 10 de maio na Câmara, eu acho que atende bem e dá um debate num tema que você passaria mais o menos quase que 15 dias discutindo.”
CPMI
Parlamentares próximos ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmam que o prazo dado pelo presidente da Câmara para aprovação do arcabouço fiscal na Casa não deve ser cumprido. “Fica muito arriscado garantir o prazo de 10 de maio”, disse um líder em reservado.
Isso porque, as imagens reveladas pela CNN tornaram “irreversível” a instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito para investigar o que aconteceu no dia 8 de janeiro, avaliam líderes partidários no Congresso Nacional.
Assim, o andamento de pautas consideradas vitais para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como o novo marco fiscal e a reforma tributária, inevitavelmente, sairão do holofote, mesmo sendo consideradas essenciais para o Planalto.