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    Passagem a R$ 200 tenta reviver período “dourado” do setor e pode elevar preços, dizem especialistas

    Para executivos e especialistas ouvidos pela CNN, projeto mencionado pelo ministro dos Portos e Aeroportos, Márcio França, foi recebido com surpresa e pode causar desequilíbrio na formação de preços das companhias

    Tamara NassifPedro Zanattada CNN , em São Paulo

    O programa de passagens aéreas a R$ 200, mencionado pelo ministro dos Portos e Aeroportos, Márcio França, em entrevista à CNN nesta semana, causou surpresa para executivos e especialistas do setor aéreo ouvidos pela CNN.

    A percepção é que o governo está tentando criar uma situação para reviver um momento desse mercado, mais especificamente do segundo mandato do governo Lula, tido como um período dourado para o setor, quando crescia muito o número de passageiros.

    “O que de fato populariza as passagens aéreas é a economia e um bom desempenho de PIB, geração de emprego, queda da inflação. Tudo isso fez o brasileiro viajar mais no passado”, diz Marcus Quintella, diretor da FGV Transportes.

    Ainda que o governo não confirme planos para o programa, o ministro disse durante a entrevista que seria focado nos assentos ociosos das companhias durante os meses de menor procura, e direcionado apenas a aposentados, estudantes e servidores públicos.

    “Durante esses meses, os aviões saem com 21% de passageiros a menos. Então, por que não comprar essas passagens e as pessoas voarem a R$ 200? A ideia é mais ou menos essa, duas passagens para cada um ao ano. O aposentado, por exemplo, pode comprar uma para ele e uma para a esposa, ou para um filho. Nesse caso, o governo não entra com subsídio, ele ajuda a financiar”, disse França.

    De fato, a ociosidade em voos, hoje, ronda a casa dos 20% no Brasil, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) (veja no quadro abaixo). No entanto, isso não significa que ocupar esses lugares não traria custos ou mudanças de planejamento às empresas.

    Ocupação dos voos
    Ocupação dos voos / CNN

    “A ociosidade não é necessariamente ruim para elas. Elas têm uma margem de segurança nas aeronaves, não existe sair um voo 100% lotado em nenhum lugar no mundo. Tem que ter vaga para atraso, por exemplo, reposições de voos”, diz Quintella. Vale ressaltar que a ocupação média dos aviões no Brasil, que em janeiro chegou a 85,7%, é superior à média mundial, de 78,7% em 2022.

    Além disso, a estratégia do governo não está livre de gerar desequilíbrios nos custos do setor, que tem um dos cálculos mais complexos para definir seus preços.

    “No fim, alguém tem que pagar a conta. Talvez o preço da passagem encareça”, diz Quintella.

    “Se o governo ficar com as passagens mais baratas, outros clientes vão ficar com as mais caras”, disse um executivo do setor ao analista de economia da CNN Fernando Nakagawa.

    Por faixas de preço das passagens vendidas em 2022, 11% custaram de R$ 100 a R$ 200. As pessoas que hoje compram esses bilhetes mais baratos passariam a pagar mais caro, segundo o executivo. Não tem nada de graça na economia.

    Preços médios das passagens aéreas
    Preços médios das passagens aéreas / CNN

    Aéreas se dizem “abertas” à proposta

    De uma forma geral, as empresas do setor se demonstraram até agora “abertas ao diálogo” com o governo.

    A CNN procurou as três maiores companhias aéreas do país — Gol, Latam e Azul.

    Em nota, a GOL disse estar disposta a contribuir com o projeto.

    “A GOL, empresa que nasceu com o propósito de democratizar a aviação no Brasil, está sempre à disposição para contribuir com o Governo na viabilização de um projeto que amplie ainda mais o acesso da população ao transporte aéreo. Por isso, participará com a ABEAR e Secretaria de Aviação Civil de um grupo de trabalho para aprofundar o tema nos próximos meses”, declarou em nota.

    A companhia ainda disse apoiar políticas públicas que tenham como objetivo “o crescimento e o desenvolvimento do turismo”, em meio à retomada de atividades do setor aéreo após a crise pandêmica.

    A Azul diz ter uma percepção semelhante. “A empresa vê com bons olhos a iniciativa apresentada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para incentivar aposentados, estudantes e funcionários públicos a utilizarem o transporte aéreo. A companhia está aberta e disposta a conversar sobre o projeto que vai beneficiar grande parte da população brasileira”, afirmou.

    Já a Latam disse que a proposta “vai na direção de aumentar de forma sustentável as viagens de avião no país, permitindo que mais brasileiros descubram o nosso território e requer um trabalho conjunto entre a indústria da aviação civil, governo e sociedade”.

    “A Latam quer que mais pessoas viajem de avião no Brasil. Por isso, está à disposição para analisar, propor e viabilizar iniciativas que continuem ampliando o acesso da população ao transporte aéreo.”

    CNN também procurou a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear). Em nota, a associação disse que está acompanhando a proposta do governo tem se colocado à disposição para contribuir.

    “Desde o início do ano, a Abear e suas associadas mantêm diálogo constante com o Ministério de Portos e Aeroportos sobre o cenário do setor aéreo e as possíveis soluções para o crescimento do número de passageiros e destinos atendidos”.

    É cedo, porém, para saber como, de fato, o setor recebeu a informação, diz Quintella.

    “Como tudo ainda é muito incipiente, não dá para saber o real posicionamento delas, porque, como envolve a democratização de passagens, elas não serão contra nesse primeiro momento. Como as companhias estão nesse momento de recuperação, duvido que sacrifiquem um mercado consolidado aumentando o preço”, diz.

    “Em resumo, precisamos de mais detalhes para analisar as consequências desse plano mais a fundo”.

    Governo nega planos

    O ministro da Casa Civil, Rui Costa, afirmou nesta terça-feira (14), depois de uma reunião com o presidente Lula e ministros da área social do governo, que a pasta ainda não recebeu as informações do programa “Voa Brasil”.

    “Nós ainda não recepcionamos o detalhamento desse programa e haverá o momento de ter essa reunião”, disse Rui.

    A declaração aconteceu horas depois do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dar uma bronca nos seus ministros e os proibir de anunciar “absolutamente nada” sem passar pelo crivo da Casa Civil.

    *Com informações de Fernando Nakagawa

     

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