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    Controle de preços e redução de incertezas: saiba o que é meta de inflação e como ela funciona no mundo

    Este ano, Brasil precisa ter inflação de 3,25% para atingir objetivo; entenda como acontece a decisão

    Meta de inflação do Brasil é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN)
    Meta de inflação do Brasil é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) Monstera/Pexels

    Amanda Sampaioda CNN

    Em São Paulo

    O Conselho Monetário Nacional (CMN) se reúne nesta quinta-feira (29) para debater a possibilidade de mudanças nas metas da inflação, que, entre tantas finalidades, dá mais segurança à sociedade e permite um maior controle dos preços.

    Mas você sabe o que é, na prática, a meta de inflação?

    A professora de economia do Insper, Juliana Inhasz Kessler, explica que a política da meta de inflação se trata do estabelecimento de um valor considerado “aceitável” e “razoável” para a inflação dentro de um país.

    “O Banco Central (BC), que é o guardião da política monetária e responsável pela estabilidade monetária no país, estabelece qual é o valor da taxa de inflação que nós estamos dispostos a suportar num determinado período”, explica.

    Juliana acrescenta que, uma vez que a meta é estabelecida, o BC cria uma espécie de compromisso com a sociedade, que espera que os números sejam cumpridos.

    Porém, como nem sempre isso acontece, existe uma “banda” — margem de tolerância — que determina a variação aceitável para cima ou para baixo da meta.

    “Entende-se que uma inflação muito mais baixa do que aquele mínimo pode significar uma desaceleração muito grande da atividade econômica, e que uma taxa de inflação muito alta prejudica a sociedade, porque traz um aumento de desigualdade, por exemplo”, afirma.

    Para 2023, a meta de inflação no Brasil é de 3,25%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para baixo ou para cima — ou seja, entre 1,75% e 4,75%.

    Kessler explica que a meta de inflação existe porque é uma forma do governo mostrar à sociedade compromisso e estabilidade.

    “Mas, mais do que isso, é uma forma dele criar o hábito na sociedade de se formar de uma maneira adequada à expectativa para a economia”, diz.

    “Quando uma taxa de inflação baixa é anunciada, o governo está dando um recado para a sociedade de que ele irá fazer aquilo que está ao alcance dele, um esforço grande, para que a inflação fique naquele valor”, acrescenta.

    A professora diz ainda que, num cenário de inflação alta, é esperado que a autoridade monetárias faça o esforço necessário para que os números baixem.

    “Para isso, ele vai aumentar a taxa de juros e apertar as rédeas da parte monetária, o que pode causar uma desaceleração, inclusive, econômica”.

    “O contrário também é verdade: se o governo está para baixo dessa meta, a gente sabe que ele vai poder, então, permitir mais flexibilidade na política monetária”, explica Kessler.

    Todas essas políticas adotadas pelas autoridades monetárias visam reduzir as incertezas da sociedade.

    No Brasil, o regime de metas de inflação é definido pelo CMN, que é o responsável pela definição da meta. O Banco Central, por sua vez, define a taxa de juros, que é o que garante o cumprimento dessa meta.

    “De forma hierárquica, o CMN aponta para onde devemos ir, e o Banco Central se coloca à disposição com a política monetária para atingir esse objetivo”, afirma Kessler.

    Em casos de economia desaquecida, por exemplo, é esperado que o BC diminua a taxa de juros por meio de operações de compra e venda de títulos, para que a economia volte a acelerar. “A taxa de juros é um resultado de uma política monetária para atingir um determinado resultado”, explica.

    O regime de metas de inflação deve ser de conhecimento público, uma vez que ela influencia diretamente a vida e a tomada de decisão das pessoas físicas e jurídicas.

    Brasil mais errou do que acertou o alvo

    Nos 24 anos desde 1999, quando o Banco Central implementou o sistema de metas para a inflação no Brasil, foram bem poucas oportunidades em que a economia do país conseguiu cumprir o alvo que deveria perseguir.

    Em alguns momentos, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador oficial de inflação do país, caiu demais e errou as metas para baixo.

    Mas foi em desvios para cima que a inflação brasileira passou a maior parte das últimas duas décadas — incluindo as vezes em que furou completamente o teto, que é a margem de tolerância máxima de flutuação que o sistema prevê.

    Levantamento feito pela CNN mostra que, até janeiro deste ano, dos 282 meses corridos desde que o sistema de metas passou a operar no país, em julho de 1999, em 212 deles a inflação errou o centro da meta para cima. O número representa 75% do tempo total.

    Em 102 desses meses, o erro extrapolou, inclusive, o teto da meta. É o equivalente a 36%, ou um terço do período com a inflação rodando acima do limite máximo tolerado pelas bandas estipuladas pelo governo.

    Por outro lado, foram 69 meses, ou um quarto do tempo (24,5%), com a inflação rodando abaixo da meta. Isso aconteceu entre 2006 e 2007 e depois, de 2017 a 2020.

    Desde a criação do sistema, o Brasil encerrou o ano em sete oportunidades fora dos limites. Desses, em seis o estouro foi para cima – 2001, 2002, 2003, 2015 e 2021, além de 2022.

    Somente em 2017 o descuido foi para baixo: naquele ano, o IPCA ficou em 2,95%, para uma meta que era de 4,5%, com tolerância entre 3% e 6%.

    Meta de inflação no mundo

    Além do Brasil, outros países também adotaram o sistema de meta de inflação, como os Estados Unidos, Canadá, África do Sul, México, Turquia e Reino Unido.

    Nos Estados Unidos e na Coreia do Sul, por exemplo, o sistema de meta de inflação é de longo prazo e sem margem de tolerância. Ambos os países têm meta estabelecida de 2% ao ano.

    Já países como o Canadá e Reino Unido devem sempre manter a inflação dentro da banda de tolerância, que varia de 1% a 3% ao ano.

    Na África do Sul, o sistema de metas é focado no intervalo, e não no objetivo central — no país, a inflação deve sempre ficar entre 3% e 6%. Isso dá maior liberdade ao banco central para conseguir qualquer objetivo dentro dessa margem.

    Por fim, alguns países possuem metas de inflação mais altas, como no caso da Turquia, cuja meta é de 5% com dois pontos de tolerância. O Brasil também pode ser citado no exemplo, já que passou muito tempo com meta de 4,5%.

    Juliana afirma que a política é bem sucedida em diversas economias mundo afora, e diz que o Brasil é um caso de sucesso deste tipo de programa.

    “É uma política que realmente tem mostrado efeitos para conter a inflação e avanços inflacionários”, afirma.

    “Por aqui, a meta deu certo e ajudou a garantir a estabilidade econômica”, acrescenta.

    O que esperar da reunião do CMN

    A respeito da reunião desta quinta-feira (28), a professora Juliana Kessler diz não acreditar que haverá mudanças na meta de inflação para este ano.

    “3,25% é um valor que parece bem ajustado à realidade de países como o Brasil e, ao contrário do que muito se falou, não acho que a meta é excessivamente baixa. Temos visto essa política dar efeito agora mais do que nunca”, disse.

    Além disso, ela afirma que a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) reforça essa ideia.

    “Talvez isso gerasse uma incerteza muito grande, que não seria bem-vinda nesse momento em que a gente está conseguindo chegar perto de um cenário de inflação baixa e de uma taxa de juros que começa a cair”, pontua.

    Para o também professor de economia do Insper, Roberto Dumas, uma possível mudança na meta de inflação por parte do CMN faria com que o governo perdesse credibilidade.

    “Se por acaso mudarem a meta de 3,25% para 4,25%, isso irá prejudicar a ancoragem, já que a precificação de bens e serviços foram feitas baseadas em outro valor. E se ano que vem não atingirem a meta também, vão mudar a meta de novo?”, questiona.

    Dumas também acredita que uma possível solução para o CMN seria criar uma meta de inflação contínua, de pelo menos 12 meses.

    *Com informações da repórter Juliana Elias.