Foi o pior momento de Haddad no governo, diz executivo do mercado
Ministro não respondeu se a meta fiscal zero para 2024 está mantida
A primeira coisa que chamou atenção de executivos e economistas do mercado ao assistirem à entrevista coletiva de Fernando Haddad foi a dificuldade do ministro em responder a uma pergunta simples: a meta de déficit zero em 2024 está mantida?
“O ministro teve três dias para preparar seu posicionamento e convocou espontaneamente a coletiva de imprensa. E não conseguiu responder a um questionamento muito simples, mas central”, disse uma fonte à CNN.
A irritação de Haddad também acionou um alerta entre jornalistas e no mercado. Nos 10 meses de governo, mesmo em situações de pressão, o ministro sempre manteve a calma e contornou os embates. Nesta segunda-feira foi diferente.
“A expectativa era que ele viria acalmar sobre a condução da política fiscal. Ao final, o ministro não passou a confiança de que teve apoio de Lula. Sempre que houve alguma bola dividia, Haddad se fortaleceu com apoio do presidente, mesmo contra o PT e outros ministros”, disse à CNN um economista com passagens pelo governo e que hoje atua no setor privado.
“Em outras situações de pressão, ele conseguiu ser mais assertivo porque tinha o aval de Lula. Dessa vez teria que ser a mesma coisa. O que vimos foi o ministro muito irritado, o que não é comum. Isso acendeu um sinal amarelo porque, talvez, dessa vez, Haddad não tenha recebido apoio que ele esperava do presidente”, completou.
Na entrevista coletiva, o ministro da Fazenda distribuiu responsabilidades pela deterioração das contas públicas dos últimos seis anos e se colocou numa posição de quem quer resolver os problemas do país e o mercado, o Banco Central, o Congresso Nacional e até o Judiciário não deixam – ou não querem.
“Foi uma comunicação muito ruim e Haddad pecou em vários fundamentos que somos treinados para não fazer quando estamos no governo. Colocar a culpa nos outros não resolve e não conta a história real. Os problemas estruturais de receita são problemas que perpassam governos, sendo construídos na cultura das instituições e muito difíceis de serem revertidos”, disse à CNN uma pessoa que já esteve por muitos anos na equipe econômica de governos passados, inclusive do PT.
Economistas ouvidos pela CNN lembram que a deterioração fiscal do país começou nos mandatos petistas – Lula 2 e Dilma 1. O endividamento excessivo para financiar bancos públicos como o BNDES e a disparada nas desonerações no governo Dilma foram citados como exemplos de medidas que promoveram o desequilíbrio fiscal do país.
“Ele estava com tanta raiva que falou coisas que não fazem nenhum sentido. A partir de 2016 os governos fizeram, sim, ajuste fiscal, tanto que o déficit caiu. Haddad estava chateado e respondeu com o fígado. O que dizer da nova política de salário mínimo adotada por esse governo que vai promover aumento real da maior despesa do governo que é a previdência? Foi criada pelo PT, neste governo”, diz a mesma fonte.
A nova política do salário mínimo considera a inflação do ano anterior e o PIB de dois anos antes para determinar o reajuste. Na conta de muitos economistas, a medida deve promover aumento real de despesas de 3% em 2024 e em 2025, portanto acima do limite determinado pelo arcabouço fiscal.
A reação do mercado foi o recado dos investidores e gestores à forma como Fernando Haddad se posicionou depois das falas de Lula na última sexta-feira (27). A bolsa de valores caiu, o dólar subiu – ambos na contramão do mercado internacional que teve recuperação.
Os juros futuros dispararam sinalizando que o Banco Central terá limitações para reduzir a taxa Selic diante da piora das contas públicas contratada pelo governo.
Nesta quarta-feira (1º) o Copom vai anunciar mais uma redução dos juros e deve trazer no comunicado da decisão algum alerta para a piora fiscal. Na última reunião, quando a percepção sobre a dificuldade do cumprimento da meta de déficit zero já existia, os diretores do Copom relativizaram os risos fiscais.