Desaceleração da China pode ajudar na queda da inflação brasileira, dizem analistas
Atividade menor tende a reduzir demanda e preços por commodities, entre elas o petróleo
A desaceleração econômica da China apontada pelos dados de varejo e produção industrial nesta segunda-feira (15) podem ajudar a reduzir a inflação no Brasil, afirmam economistas ao CNN Brasil Business.
Os números acabaram não apenas apontando desaceleração, como também vieram levemente abaixo do esperado pelo mercado, levando a uma revisão das expectativas para a economia do país em 2022.
A tendência é que, se o mercado esperar um desempenho mais fraco da economia chinesa, passe a recalcular também medidas como a demanda por commodities. Com a previsão de demanda menor, há também uma revisão dos preços para baixo.
Efeitos no Brasil
Como a China é um dos maiores consumidores de commodities do mundo, qualquer desaceleração na economia implica em demanda e preços menores para diversos produtos, entre eles o petróleo.
Essa deve ser a principal “ajuda” no processo de queda da inflação do Brasil, segundo o professor do Insper Roberto Dumas.
Dumas ressalta que o quadro da economia global já apontava para um cenário de queda nas commodities devido à desaceleração das economias na Europa e dos Estados Unidos, que elevam juros enquanto combatem níveis recordes de inflação.
Nesse sentido, o quadro chinês piora a situação, reforçando a tendência de queda nos produtos projetada para o segundo semestre de 2022 e 2023.
“A queda no preço de commodities pode ajudar na inflação, principalmente na questão do petróleo. Tem um tempo para chegar à população devido à política de preços da Petrobras, mas ajuda”, avalia o professor.
Livio Ribeiro, pesquisador do Ibre-FGV, acredita que a grande novidade do quadrão econômico mundial é que, diferente de outras crises, a China não será mais um estabilizador econômico, quando manteve demanda alta por commodities mesmo em quadros de desaceleração.
Mas, apesar de contribuir para uma inflação menor, a situação chinesa deve prejudicar especialmente os países em desenvolvimento, que mantém fortes fluxos comerciais com a China. É o caso do Brasil.
Ribeiro afirma que a pauta de exportação brasileira para a China, em especial de soja, proteínas, petróleo e minério de ferro, tende a ser prejudicada pelo quadro econômico chinês, mas de formas diferentes.
“Soja, proteínas e petróleo vão ter problemas pela demanda menor. Mas minério de ferro está ligado ao ciclo de infraestrutura, que ainda teve ter uma sustentação, então a desaceleração será menor”, diz o pesquisador.
A expectativa de Ribeiro é de uma queda na balança comercial, que já dá sinais de fraqueza com um quadro geopolítico ruim. As exportações de petróleo brasileiro para a China, por exemplo, caíram, indicando uma substituição pela commodity russa.
“Vai ter efeitos de balança comercial múltiplos que vão nos atingir, o que ajuda é que muitos choques de importação tendem a diminuir, o que ajuda na inflação, desde que a taxa de câmbio não sofra”, afirma.
Já Dumas acredita que a política governamental voltada para infraestrutura e o setor imobiliário devem manter a demanda por minério de ferro em níveis positivos, mesmo que haja uma queda no curto prazo.
No caso das commodities agrícolas, ele espera que o governo busque evitar uma queda na demanda para contornar qualquer tensão social que um fornecimento menor de alimentos possa gerar, em um quadro econômico já deteriorado e um esforço do governo para um “crescimento mais voltado para o consumo”.
Desafios
Dumas, do Insper, acredita que o corte de juros de 2,85% para 2,75% anunciando pelo banco central da China na segunda-feira não deve resolver os problemas econômicos do país.
“O problema sério não vai ser resolvido, que é a política de Covid zero. Não adianta resolver cortando os juros, as pessoas não vão começar a comprar se não podem nem sair de casa, é um baixo consumo, não restritividade da política monetária”, afirma o professor.
Ele afirma que a resolução do governo só viria por uma “política fiscal mais expansionista para ajudar setores como imobiliários, infraestrutura”.
Ribeiro considera que os dados quantitativos de varejo e indústria passaram agora a refletir uma desaceleração econômica, com dificuldades para a economia se dinamizar.
“O problema é carência de demanda interna, com origens de choques de confiança por questões sanitárias, incerteza econômica, questões geopolíticas, isso leva ao aumento da poupança das famílias chinesas”, diz.
O economista avalia que, como a economia chinesa passou a partir de 2013 a ser centralizada em serviços, o receio da população de consumir acaba criando uma falta de demanda e, consequentemente, uma desaceleração da economia. Por isso, a economia enfrenta problemas mesmo com níveis baixos de inflação.
“O governo tem buscado medidas para estimular a economia que divergem das soluções para o choque atual, é algo diferente e o governo não consegue atacar. Eles querem fazer a economia crescer via construções, infraestrutura, mas não estão conseguindo”, afirma Ribeiro.
Entre essas medidas está o corte recente de juros, em uma modalidade voltada para obras de infraestrutura. Por isso, ele também espera que a redução “não deve ajudar a economia”. “Os países asiáticos têm essa visão de maneira geral, de ter poupança alta, é pouco usual pensar em transferência de rendas, e talvez fosse o necessário para resolver o problema agora”.