TCU interrompe análise após voto que autoriza governo a renegociar contrato do Galeão com concessionária
Proposta permite que a empresa Changi desista de devolver operação do aeroporto, o que evitaria nova licitação
O Tribunal de Contas da União (TCU) interrompeu a análise de uma consulta que pode permitir ao governo renegociar o contrato de concessão do aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, sem ter que fazer uma nova licitação do empreendimento.
Os ministros Walton Alencar e Jhonatan de Jesus pediram vista e terão mais tempo para examinar a proposta do relator, ministro Vital do Rêgo. O prazo de paralisação do julgamento é de até 30 dias. Alencar, no entanto, disse que tentaria devolver o caso ao plenário do TCU em até duas semanas.
A Corte de contas analisa uma consulta feita pelos ministérios de Portos e Aeroportos e o dos Transportes. O governo quer saber se é possível uma concessionária desistir de devolver um empreendimento.
Segundo a lei que trata do assunto, a decisão de entrega do ativo para posterior relicitação pelo governo é “irrevogável e irretratável”. Ou seja, a concessionária não pode voltar atrás na sua decisão, e o governo deve fazer uma nova licitação.
Para o ministro Vital do Rêgo, o caráter irrevogável da lei se refere só à declaração do concessionário e não atinge o poder concedente – no caso, o governo.
A proposta, se confirmada pela maioria dos ministros, permitirá que a concessionária Changi desista de devolver a operação do Galeão e tenha seu contrato renegociado.
A área técnica do TCU teve interpretações divergentes sobre a possibilidade.
O governo defende a tese de que é melhor aceitar a desistência e repactuar os contratos do que fazer uma nova licitação. Esse caminho, além de mais curto, permitiria resolver eventuais problemas contratuais e de receitas das empresas e conter aumento de tarifas que poderiam vir com uma nova concessão.
O relator votou no sentido de que o governo deve verificar as possibilidades de encerramento do processo de nova licitação. Eventual constatação de ilegalidade ou desvio de finalidade da concessionária poderá levar à nulidade do pedido de relicitação.
Vital do Rêgo ainda entendeu que o governo pode encerrar por conta própria o processo de relicitação, desde que obedeça 14 condições.
As normas propostas “dizem respeito à demonstração de interesse público que motivaram a opção pelo encerramento da relicitação e a demonstração da vantajosidade de celebrar eventual acordo de readaptação no contrato”, conforme o ministro.
Entre as condicionantes, há a necessidade de manifestação formal do concessionário registrando interesse em continuar prestando o serviço público, manutenção do calor da outorga original, caso haja recálculo de pagamentos ao governo.
O ministro dos Portos e Aeroportos, Márcio França, tenta costurar um acordo para manter operadora no Galeão e evitar uma nova licitação.
O processo de relicitação tem sido tocado de maneira lenta e burocrática. Também esbarra em dificuldades técnicas, como o cálculo das indenizações necessárias.
O Galeão foi concedido em 2013 por um prazo inicial de 25 anos. É operado pela Changi desde 2014.
Desde a concessão, no entanto, as expectativas para o aeroporto não se confirmaram. Além da crise econômica de 2015 e 2016, a pandemia de Covid-19 também contribuiu para impactar a demanda por voos.
Pesa na conta a outorga anual paga pela companhia de Cingapura, de R$ 1,3 bilhão. Diante do cenário, a operadora decidiu anunciar, em 2022, que devolveria concessão do Galeão.
Já durante o governo Lula (PT), a Changi se manifestou pela desistência da relicitação, buscando permanecer operando o Galeão.
O movimento se insere em um contexto de novas perspectivas para o empreendimento, que passa pela decisão do governo em restringir a operação do aeroporto Santos Dumont no segundo semestre. O local só vai operar voos do Rio de Janeiro para São Paulo e para Brasília.
O Galeão viu o volume de passageiros diminuir de 17 milhões em 2014 (primeiro ano da concessão) para 5,9 milhões em 2022. Já os voos do Santos Dumont, aeroporto central do Rio, aumentaram, e a movimentação superou 10 milhões de passageiros no ano passado.
Há também planos para incrementar os negócios no Galeão, com a instalação de um centro para movimentação de cargas dos Correios.
Eventual decisão do TCU autorizando a possibilidade de concessionárias “desistirem da desistência” abriria caminho para a repactuação de outras licitações. Além do Galeão, estão no radar outros oito contratos. Já manifestaram sobre a devolução de concessões as operadoras do aeroporto de Viracopos, em Campinas, de seis rodovias e de conjunto ferroviário da malha oeste, em São Paulo e Mato Grosso do Sul.