STJ julga caso tributário sob pressão do governo e de contribuintes
Seção da Corte pautou para esta quarta-feira definição sobre exclusão de benefícios do ICMS da base de cálculo do IRPJ e CSLL
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deve julgar nesta quarta-feira (26) um processo tributário que vai definir as regras para todas as instâncias da Justiça em cobrança de impostos sobre benefícios do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
O caso é alvo das atenções do governo federal, pelo potencial de arrecadação. Do outro lado, contribuintes tentam subsidiar o debate com informações de impactos negativos na economia.
O STJ deve decidir se os benefícios relacionados ao ICMS devem compor a base de cálculo para o Imposto sobre a renda das pessoas jurídicas (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
A questão a ser analisada é se esses benefícios, que são como descontos dados por estados no valor total de ICMS devido, devem ser considerados como um “ganho” ou receita das empresas e, portanto, tributados.
A alíquota de IRPJ e CSLL pode chegar a 34%. Se uma empresa tem um benefício fiscal que reduziu em R$ 1 milhão o montante a ser pago do ICMS, por exemplo, a tributação de IRPJ e CSLL desse benefício será no valor de R$ 340.000.
Os casos concretos analisados serão julgados sob o chamado rito dos repetitivos. O instrumento permite que a decisão que for tomada no STJ se aplique a todos os processos sobre o mesmo tema na Justiça. O relator é o ministro Benedito Gonçalves.
Na segunda-feira (24), o magistrado recebeu o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para tratar do caso. Haddad considerou o assunto como parte do que chama de “jabutis tributários”.
De acordo com o ministro, o caso está “corroendo a base fiscal brasileira” e causando “insegurança jurídica”.“São centenas de milhões de reais de prejuízo ao erário.
O orçamento inteiro do MEC [Ministério da Educação] não chega ao valor em julgamento. É metade do orçamento do Bolsa Família”, afirmou Haddad, após se encontrar com o relator, no STJ.
Contribuintes também fazem pressão sobre o julgamento. Há uma busca para que o caso seja julgado depois de mais debate. Há uma percepção de que o caso tramitou de forma acelerada no STJ.
Uma das demandas é para que entidades possam ser admitidas no processo como amicus curiae, o que permite colaborar com informações aos ministros e fazer sustentação oral durante o julgamento.
Associações do agronegócio, por exemplo, se manifestaram sobre o julgamento. Disseram que a não tributação dos benefícios do ICMS possibilita reinvestimento dos valores no setor e expansão de lojas ou fábricas.
“Não há dúvidas sobre a relevância e impacto do tema não só para o agronegócio brasileiro, mas para todos os demais setores econômicos que se beneficiam legalmente da isenção, crédito presumido/outorgado ou redução de base em suas saídas de ICMS, além da possibilidade de excluir da base do IRPJ/CSLL os valores como subvenção para fins de investimento”, disseram as entidades, em ofício enviado à Frente Parlamentar Agropecuária solicitando um posicionamento sobre o tema.
“Todo e qualquer ato que implique em majorar a carga tributária do setor traz consigo importante impacto social, uma vez que o agronegócio é responsável substancial na geração de renda, emprego, economia, desenvolvimento social, local”.
O caso
Os ministros da 1ª Seção do STJ vão decidir se devem ou não fazer parte da base de cálculo do IRPJ e da CSLL os benefícios fiscais do ICMS, como a redução da base de cálculo, a redução de alíquota, a isenção, o diferimento e a aplicação de imunidade tributária.
Esses benefícios são concedidos pelos estados, a quem compete gerir e cobrar o ICMS.
Em 2017, a mesma 1ª Seção da Corte definiu que um dos benefícios do ICMS (o crédito presumido) não deveria compor a base de cálculo para IRPJ e CSLL. Agora, o colegiado deverá decidir se esse entendimento deve ser estendido para todos os outros benefícios do ICMS.
“No julgamento de 2017, se determinou que esse crédito presumido é um incentivo fiscal do ICMS, é incentivo do estado, e a União não poderia tributar, sob pena de violar o pacto federativo”, disse à CNN o advogado Alessandro Borges, membro do escritório Benício Advogados.
“Não adianta o estado incentivar o desenvolvimento regional e a União querer comer um pedaço disso”. Borges considera “muito grande” a pressão sobre o caso. “Quando se tem muita pressão dos dois lados, geralmente os ministros tiram o time de campo para julgar em situação em que todos foram ouvidos”, declarou.
Para o advogado Eduardo Pugliese, sócio do escritório Schneider, Pugliese, a expectativa é que o colegiado mantenha a exclusão dos benefícios fiscais de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.
“Espera-se que seja estendido o entendimento firmado no julgamento dos Embargos de Divergência nº 1.517.492, que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL para os demais incentivos fiscais”, afirmou.
“Ainda, aguarda que a Corte entenda pela desnecessidade de discutir a caracterização de cada benefício de forma isolada, considerando que a própria legislação, expressamente, equiparou os incentivos e benefícios fiscais de ICMS a subvenções de investimento”.
Segundo o advogado Cristiano Luzes, sócio do escritório Serur Advogados, a legislação diferencia as chamadas subvenções entre as de custeio e as de investimento. Só no caso das subvenções de investimento, desde que cumprido alguns requisitos, estava autorizada a exclusão do cálculo do imposto de renda pago pelas empresas.
“O problema se dá quanto aos benefícios fiscais de ICMS concedidos pelos estados, pois em subvenções deste tipo, pouco importando a classificação que fosse atribuída, haverá uma incidência tributária sobre desonerações praticadas pelos estados, o que revela um desequilíbrio ou violação ao pacto federativo”, disse.
“Poderia a União tributar, como lucro das empresas, os valores que os estados deixaram de arrecadar no ICMS?”, questionou o advogado, citando que em 2017 a Corte proibiu a cobrança em cima do crédito presumido do ICMS.“Por que o STJ haveria de mudar seu entendimento agora? Qual fato jurídico novo está colocado à apreciação do tribunal? Há diversas questões levantadas pelas partes nesse novo julgamento do STJ, mas me parece evidente que o déficit fiscal, por si só, não pode levar a qualquer conclusão que restrinja direitos dos contribuintes e leve à mudança do entendimento já firmado pela Corte”, declarou.