STF retoma julgamento sobre autonomia do BC em meio à escalada da inflação
O caso começou a ser analisado no plenário virtual da Corte, quando ficou empatado
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou no período da tarde desta quarta-feira (25) o julgamento sobre a lei da autonomia do Banco Central, alvo de ação apresentada pelo PT e PSOL. O caso começou a ser analisado no plenário virtual da Corte, quando ficou empatado. Enquanto o relator, ministro Ricardo Lewandowski se posicionou a favor de derrubar a legislação, o ministro Luís Roberto Barroso votou para manter o texto e declarar a lei constitucional. No entanto, um pedido do ministro Dias Toffoli levou a ação ao plenário presencial, onde o julgamento começa do zero.
No início da sessão, o presidente do STF, Luiz Fux, afirmou que a análise do caso, assim como da demarcação de terras indígenas, é prioridade. Portanto, outras pautas não serão chamadas até que a Corte finalize esses julgamentos. “Hoje o STF tem dois processos muito importantes para o nosso país, razão pelo qual vamos julgá-los até exaurir o julgamento dos dois para fazer nova pauta. Julgamentos são prioritários para hoje, amanhã e dias subsequentes”, avisou Fux.
A atenção do governo Bolsonaro ao processo de autonomia do BC no STF foi reforçada após o procurador-geral da República, Augusto Aras, se manifestar pela derrubada da legislação. A posição da PGR foi baseada numa formalidade do processo legislativo, a partir do entendimento de que a autonomia do órgão não poderia ser instituída via projeto de lei de autoria do Congresso, mas apenas por meio de proposta de iniciativa do Presidente da República.
A análise feita pela PGR foi considerada no voto do relator. Lewandowski afirmou que a deliberação sobre a alteração no regime jurídico do presidente do Banco Central é matéria administrativa, que envolve a organização do Poder Executivo. Portanto, o projeto de lei aprovado deveria ser de origem do Executivo, na avaliação do ministro.
Já Barroso teve outra interpretação. No entendimento do ministro a lei de autonomia do Banco Central se enquadra entre as regras do Sistema Financeiro Nacional, sobre as quais o Legislativo pode disciplinar por meio de lei complementar, sem a exigência de iniciativa do presidente.
“Ela (a lei) dá configuração a uma instituição de Estado – não de governo -, que tem relevante papel como árbitro neutro, cuja atuação não deve estar sujeita a controle político unipessoal”, disse o ministro. Mais cedo, em evento promovido pela XP Investimentos, Barroso apontou que a Corte não deveria alterar a decisão do Congresso.
O governo Bolsonaro enviou no primeiro ano de gestão um projeto de lei para conferir autonomia à autoridade monetária. No entanto, o projeto que foi aprovado pelo Congresso é de autoria de um senador. A proposta do governo chegou a ser agrupada (apensada) ao texto de origem do Senado, mas formalmente, o PL do Executivo acabou arquivado.
A lei de autonomia estabelece mandatos fixos e não coincidentes para os dirigentes da instituição. Além disso, determina que o BC tenha como objetivos, além do controle da inflação e a estabilidade do sistema financeiro, a suavização dos ciclos de atividade e o pleno emprego.
Segundo a legislação, o presidente do Banco Central e os oito diretores da instituição – responsáveis pela condução da política monetária no Brasil – têm mandatos fixos de quatro anos. O mandato da presidência do BC, hoje ocupada por Roberto Campos Neto, começará sempre no terceiro ano de governo do presidente da República. O presidente do BC e os diretores poderão ser conduzidos por mais quatro anos, uma única vez.
Aras mantém posição
Para Aras, o Banco Central trata-se de uma autarquia federal, com função relevante na política monetária e finanças do país. Na manifestação, Aras ressalta que o órgão não analisou as questões de mérito que foram levantadas pelo PT e PSOL, partidos contrários à autonomia da autoridade monetária.
“Logo no primeiro dispositivo, a lei define os deveres do BC e atribui as metas e dispões sobre a composição e tempo de mandato dos membros. E estabelece vedações aos presidentes e diretores do BC, disse o PGR, reforçando a manutenção de sua posição.
A posição de Aras a favor da suspensão da lei foi baseada numa formalidade do processo legislativo. Em seu entendimento, a autonomia do BC não poderia ser instituída via projeto de lei de autoria do Congresso – como ocorreu no caso -, mas apenas por meio de proposta de iniciativa do Presidente da República. No jargão jurídico, a legislação sofreria de um “vício de inconstitucionalidade formal”, avaliou o PGR
O Procurador reforça suas considerações. “A iniciativa privativa do presidente da república é a materialização da Constituição, que versa sobre a harmonia dos poderes. Manifesto pela inconstitucionalidade formal da lei e procedência do pedido. Segurança jurídica é o que promove a circulação de riquezas, é com isso que vamos atrair investimentos.”
Em seguida, o relator da ação, Ricardo Lewandowski iniciou a leitura de seu voto, lembrando que sua posição é pública, já que o julgamento foi iniciado no plenário virtual. Na ocasião, Lewandowski adotou a posição da PGR.
O procurador-geral da República, cuja recondução a mais dois anos no cargo foi aprovada na terça-feira pelo Senado, afirmou que o órgão não se debruçou sobre as questões de fundo apresentadas pelos partidos de oposição ao STF. Além de apontarem “vício de iniciativa” da lei, o PT e o PSOL defenderam que o Poder Executivo possa ter influência sobre as decisões do Banco Central.
“A PGR não adentrou mérito, porque nas questões de fundo suscitadas respeita a autonomia dos poderes, do Legislativo no caso, que disciplinou a matéria e deliberou sobre o tema”, afirmou Aras. “A preocupação da PGR nesse momento se dirige quanto ao aspecto formal”, completou.
Lei viola Constiuição e retira controle político do BC, afirma Lewandowski
Na leitura de seu voto, Lewandowski afirma que o requerimento da lei de autonomia não indica questões favoráveis. “Não é possível aceitar alegações genéricas. Tanto quanto não se permite que a alegação de contrariedade à constituição se apoie em textos superficiais.
O relator, portanto, entende que qualquer mudança teria ter a iniciativa do chefe do executivo federal. “Houve alteração na medida que busca tirar este órgão da órbita da presidência da república. Não posso deixar de concluir que a lei ao dispor sobre nomeação e exoneração dos presidentes e diretores, por ter vindo de iniciativa parlamentar, violou a Constituição.”
Segundo Lewandowski, lei proposta não se limita a especificar atribuições existentes do Banco Central. “O BC integrava a administração indireta da União, que encontrava-se vinculado ao Ministério da Economia. Essa ablação foi feita a partir da iniciativa parlamentar. O controle até então feito pelo ministro da economia, visava a eficiência administrativa.”
Assim, conforme leitura de voto de ministro, a lei, sem vinculação ao ministério e pela estabilidade de seus mandatos, reformula a relação do BC ao ministro da pasta, retirando o controle da instituição do chefe do poder executivo. “A lei visa retirar o controle político do Banco Central.”
No encerramento de sua fala, Lewandowski reforça que regras disciplinadoras do BC só podem ser feitas pelo presidente da República “sob pena de instalar a balbúrdia na gestão da administração pública federal”. Segundo ele, a lei é inconstitucional ao meu ver. “Julgo procedente o pedido para declarar a lei inconstitucional.
Barroso vota a favor
Durante a apresentação de seu voto, o ministro Barroso observou que ilegibilidade da iniciativa do presidente da república no projeto de lei. “Mas a constituição brasileira prevê algumas iniciativas do presidente, mas essa é uma exceção e deve ser interpretada de maneira restrita.”
Ainda segundo ele, a medida não é tratada como regime jurídico de servidores, criação ou extinção de ministério ou órgão público.
Último a votar antes do adiamento da sessão para esta quinta-feira (26), Barroso apresentou voto contrário ao do ministro Lewandowski, sendo a favor da autonomia do Banco Central.
Com Estadão Conteúdo