Relembre o caso da Evergrande, gigante imobiliária chinesa que possui dívidas de R$ 1,7 trilhão
Crise se alastrou para outras companhias do setor e especialistas se preocupam com o seu risco de contágio
O Grupo Evergrande entrou com pedido de proteção contra falência na quinta-feira (17), renovando as preocupações com a saúde financeira da empresa.
O pedido foi feito por meio do “Chapter 15”, ou “Capítulo 15”, o capítulo relativamente novo da lei das falências norte-americanas destinado a lidar com os processos de recuperação judicial internacionais, originados em outros países.
A gigante imobiliária da China foi responsável pelo pontapé da crise que atravessa o setor no país desde 2021, quando anunciou que não conseguiria pagar suas dívidas de 2,4 trilhões de yuans (cerca de R$ 1,7 trilhão), valor equivalente a 2% do Produto Interno Bruto (PIB) da China.
Desde então, a incorporadora tem encarado dificuldades para honrar os empréstimos feitos. Mas, enquanto isso, a crise se alastrou para outras companhias do setor e especialistas se preocupam com o seu risco de contágio.
Relembre o caso
O que é a Evergrande?
A Evergrande é uma das maiores incorporadoras imobiliárias da China. A empresa fez parte do Global 500 – o que significa que também era uma das maiores empresas do mundo em receita.
Listada em Hong Kong e sediada na cidade de Shenzhen, no sul da China, ela possui mais de 1.300 projetos em mais de 280 cidades em toda a China.
Fora da habitação, o grupo investe em veículos elétricos, esportes e parques temáticos. A incorporadora ainda possui uma empresa de alimentos e bebidas, vendendo água engarrafada, mantimentos, laticínios e outros produtos.
Como começou?
Nos anos anteriores à 2021, as dívidas da Evergrande aumentaram à medida que ela fazia empréstimos para financiar suas várias atividades.
O grupo ganhou a fama negativa por se tornar o desenvolvedor mais endividado da China, com passivos no valor de mais de US$ 300 bilhões.
A incorporadora começou a alertar os investidores sobre problemas de fluxo de caixa no segundo semestre de 2021, dizendo que poderia entrar em default se não conseguisse levantar dinheiro rapidamente.
De acordo com especialistas, as ambições agressivas da empresa foram responsáveis por provocar a uma situação incontornável.
O grupo “se afastou muito de seu negócio principal, que é parte de como ele entrou nessa confusão”, disse Mattie Bekink, diretor da Economist Intelligence Unit para a China na época.
Os analistas da Goldman Sachs disseram que a estrutura da empresa tornou “difícil determinar um quadro mais preciso de [sua] recuperação”.
Qual o impacto?
Os problemas do grupo também abriram feridas antigas na economia chinesa. “A história de Evergrande é a história dos desafios profundos [e] estruturais para a economia da China relacionados à dívida”, disse Bekink.
Isso porque o setor imobiliário é responsável por cerca de 1/3 do PIB da China.
Analistas já apontavam para a possibilidade de bolha no setor, com preços altos e uma oferta superior à demanda, e que o estouro dela poderia gerar uma crise econômica global nos níveis da de 2008.
O colapso contínuo da Evergrande chamou a atenção para o impacto que uma onda de inadimplências de incorporadoras imobiliárias teria no crescimento da China.
Desde 2021, várias outras incorporadoras da China, incluindo Kasia, Fantasia e Shimao Group, também ficaram inadimplentes.
Mais recentemente, outra gigante imobiliária chinesa, a Country Garden, alertou que iria “considerar a adoção de várias medidas de gerenciamento de dívida” — alimentando especulações de que a empresa poderia estar se preparando para reestruturar seus débitos
Além disso, sinais de estresse financeiro em uma grande gerente de ativos da China deixam investidores cautelosos sobre o eventual contágio diante da fraqueza do setor imobiliário, renovando um debate sobre se um “momento Lehman” poderia ocorrer na segunda maior economia global.
A Zhongrong International Trust, vendedora de produtos financeiros que tinha o equivalente a US$ 108 bilhões em ativos sob gerenciamento no fim de 2022, tornou-se a mais recente preocupação do mercado.
Quatro produtos de trust gerenciados pela empresa deixaram recentemente de pagar juros e o principal, em um total de US$ 14 milhões para três companhias publicamente listadas na China, segundo documentação à bolsa de valores.
Sediada em Pequim, a Zhongrong tem dado financiamento a muitas incorporadoras e ajudou-as a financiar projetos de construção.
O que foi feito até aqui?
No início deste ano, a Evergrande revelou seu tão esperado plano de reestruturação de dívidas — o maior da história da China. A empresa disse que chegou a “acordos vinculativos” com seus detentores de títulos internacionais sobre os principais termos do acordo.
“A reestruturação proposta aliviará a pressão de endividamento offshore da empresa e facilitará os esforços da empresa para retomar as operações e resolver problemas em terra”, disse a empresa em comunicado.
Como parte do plano, ela se concentraria em retornar às operações normais nos próximos três anos, mas exigiria financiamento adicional de US$ 36,4 bilhões a US$ 43,7 bilhões.
A empresa também alertou que sua unidade de veículos elétricos corre o risco de fechar sem novos aportes.
Desde a divulgação da proposta, já houve financiamentos.
No início desta semana, a NWTN, empresa automobilística com sede em Dubai, anunciou um investimento estratégico de US$ 500 milhões no grupo EV de Evergrande em troca de uma participação de cerca de 28%.
*Publicado por Iasmin Paiva. Com informações de Estadão Conteúdo