Presidente do Fed evita responder sobre eleições e despista corte de juros
Jerome Powell enviou diversa mensagens aos investidores durante discurso ao Congresso
O presidente do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA), Jerome Powell, enviou mensagens contraditórias aos investidores na terça-feira (9), durante seu depoimento semestral ao Congresso.
Em seu discurso perante o Congresso, ele disse que o banco central não espera cortar as taxas de juros “até que tenhamos mais confiança de que a inflação está se movendo de forma sustentável em direção a 2%”.
Entretanto, ele observou que as leituras de inflação caíram significativamente em relação aos máximos de quatro décadas atingidos há dois anos. A economia dos EUA está esfriando, e “mais dados bons fortaleceriam nossa confiança de que a inflação está se movendo de forma sustentável em direção a 2%”.
Powell foi questionado por vários senadores sobre a política da Casa Branca, e ele se esquivou. Quando perguntado sobre a chamada Bidenomics, por exemplo, ele comentou que “não tocaria em uma frase com essa palavra”.
Mas é difícil evitar a política quando o ex-presidente Donald Trump disse que, se eleito, não reconduziria Powell e o acusou de considerar cortes nas taxas para dar aos democratas uma vantagem nas eleições de 2024.
Pode ser por isso que Powell fez questão de enfatizar que o banco central é uma entidade independente na terça-feira.
“O Congresso confiou ao Federal Reserve a independência operacional necessária para adotar uma perspectiva de longo prazo na busca de nosso duplo mandato de emprego máximo e preços estáveis”, disse Powell.
A independência do Fed é tranquilizadora para os mercados de capitais americanos e globais, disse Joseph Brusuelas, diretor e economista-chefe da RSM US.
Isso porque os investidores precisam acreditar que os bancos centrais serão confiáveis e farão o que for melhor para a economia, em vez de estimular as economias e impactar os mercados antes das eleições.
“Temos a ideia de que o Federal Reserve está estabelecendo um marco antes da próxima eleição presidencial”, disse Brusuelas.
“Em uma era de populismo econômico e o possível advento de um segundo governo Trump, a ideia de independência do banco central é muito mais importante do que é comumente entendida ou apreciada entre os atores eleitos e o público”, acrescentou.
Além da inflação
A mensagem de Powell na terça-feira foi amplamente consistente com sua comunicação mais recente sobre a política do Fed — com uma grande exceção. Powell sinalizou sutilmente seu desejo de começar a “recalibrar a política monetária”, disse o economista-chefe da EY, Gregory Daco.
Embora o chefe do banco central norte-americano tenha observado que as decisões de política dependem dos dados, “a inflação elevada não é o único risco que enfrentamos. Reduzir a restrição da política muito tarde ou muito pouco poderia enfraquecer indevidamente a atividade econômica e o emprego”.
Embora a economia e o mercado de trabalho continuem fortes, o crescimento do emprego nos EUA diminuiu em junho, conforme os dados mais recentes sobre emprego.
Isso fez com que alguns analistas se preocupassem com o momento em que o Fed deve reduzir as taxas de juros — se o banco central esperar demais, poderá levar a economia à recessão.
“Sabemos que o desempenho da economia tem sido notável. O que os formuladores de políticas precisam avaliar é como a inflação e as condições do mercado de trabalho se comportarão nos próximos meses”, disse Daco.
Reação discreta do mercado, mas com aumento dos rendimentos
O reconhecimento de Powell de que taxas de juros mais altas por mais tempo poderiam colocar em risco a economia deveria ter sido uma boa notícia para os investidores ansiosos por cortes nas taxas.
Mas essa mensagem foi atenuada por “seu mantra de que o Fed ainda está esperando por mais evidências de que a inflação está esfriando de forma confiável antes de agir”, disse Chris Larkin, diretor administrativo de negociações e investimentos da E*TRADE do Morgan Stanley.
Como resultado, a maioria dos investidores bocejou na terça-feira. O S&P 500 fechou o dia com menos de 0,1% de alta.
“O fato de o S&P 500 ter oscilado lateralmente durante seu depoimento sugere que os investidores estão de olho nos números da inflação”, disse Larkin, referindo-se aos dados do Índice de Preços ao Consumidor dos EUA, que serão divulgados no final desta semana.
Esses dados auxiliarão os investidores a discernir se houve mais progresso na luta do Fed contra a inflação.
Entretanto, os rendimentos do Tesouro subiram na terça-feira, indicando que os investidores não acreditam que haverá um corte nas taxas nas próximas reuniões.
Powell observou diversas vezes que cada decisão de política do Fed é tomada “ao vivo”, usando os dados econômicos mais recentes disponíveis — em outras palavras, as decisões não são tomadas com antecedência.
Mas os investidores ainda acreditam que o resultado da reunião de julho está definido: 95% estão apostando que o Fed manterá as taxas inalteradas, segundo a ferramenta CME FedWatch.
Em setembro, contudo, existe um pouco mais de incerteza. Cerca de 75% dos investidores acham que o Fed reduzirá as taxas, e cerca de 25% acham que elas permanecerão inalteradas.
O presidente do Fed continua seu depoimento perante o Congresso nesta quarta-feira (10), em meio a uma agenda cheia até o final do mês.
Na próxima segunda-feira, ele se juntará a David Rubenstein para uma “ampla entrevista sobre a situação atual da economia americana e global” no Economics Club, em Washington DC, e dará sua coletiva de imprensa habitual após a reunião de política do Fed no final de julho. Em agosto, ele falará no Simpósio Econômico de Jackson Hole.
Isso significa haver bastante tempo para o Fed recalibrar suas mensagens e moderar as expectativas do mercado.