Por que presentes de fim de ano com gênero-neutro são importantes para os filhos
Grandes empresas e até varejistas online deixaram de classificar os brinquedos por gênero.
Irina Gonzalez encontrou o presente de Natal perfeito: um carrinho de puxar Mega Blocks com rodas da cor lilás e cesto rosa. Ela ficou satisfeita em comprá-lo – para seu filho de 20 meses.
“Eu realmente tento incorporar todas as cores do arco-íris nos brinquedos do meu filho e especialmente em seu guarda-roupa”, disse ela. “Quero educar meu filho para que ele entenda que roupas são apenas roupas e brinquedos são apenas brinquedos, e que essas coisas não têm sexo definido”.
Ela espera que ele aprenda que nada está fora dos limites dele e que não há nada de errado em gostar de um brinquedo ou peça de roupa que foi comercializada como sendo “para meninas”.
Não muito tempo atrás, isso pode ter parecido uma abordagem radical para a educação dos filhos, para não mencionar as compras de fim de ano. Mas lutar contra o marketing de hiper-gênero dos mundos dos materiais infantis é cada vez mais comum, e não apenas por parte dos pais ou grupos de defesa. Alguns na indústria de brinquedos e no mundo dos negócios também aderiram.
Indústria de brinquedos se torna gênero-neutro
Em 2015, a Target parou de rotular alguns brinquedos e outros produtos como itens para meninas e meninos, afastando a sinalização de gênero nas lojas. Em 2017, a Toy Association substituiu as categorias “menino” e “menina” por outras, como action figures do ano ou a boneca do ano (embora os action figures sejam geralmente bonecos para meninos).
Segundo Kristin Morency Goldman, porta-voz da Toy Association, a decisão “foi refletir o mercado atual, os hábitos de compra dos pais e a realidade do mundo em que vivemos”.
Os brinquedos vencedores deste ano incluem o urso de pelúcia do ano e um outro que ajuda nos estudos e desenvolvimento. Comercializados dessa forma, qualquer criança pode se interessar por eles.
“As empresas deixaram de classificar seus brinquedos por gênero e até mesmo os varejistas online e físicos não estão mais os organizando dessa forma”, disse Goldman. “Muitos dos limites baseados em gênero que foram impostos às crianças nas gerações anteriores, felizmente, não existem mais”.
A Hasbro, por exemplo, mudou o marketing das marcas como Baby Alive, NERF e Easy-Bake para torná-las mais inclusivas em termos de gênero. Enquanto isso, a Disney encontrou uma maneira de acomodar tanto os pais que acreditam que os brinquedos devem ser comercializados usando o gênero quanto os que não acreditam. No site da Disney, os compradores ainda podem selecionar um gênero, mas quase não há diferença no resultado da pesquisa.
Existem 304 brinquedos marcados como meninos e 307 para meninas. O Minnie Mouse Garden Play Set, a Aurora Classic Doll e a Disney Princess Enchanting Messages Musical Vanity estão tanto na seção masculina quanto na feminina. Assim como o Mickey Mouse-Ka-Golf Set.
Os três brinquedos exclusivos para meninas eram a boneca de pelúcia Elsa, a rainha da neve, a boneca de pelúcia Rainha Anna e o pacote de acessórios da boneca clássico Elsa, todos de “Frozen II”.
As empresas menores estão se lançando sem mensagens de gênero. BE-ME vende tutus, coroas e esmaltes para todas as crianças, e a Ten Little não coloca gênero às roupas ou brinquedos.
Em breve, isso pode se tornar a norma, e até mesmo por lei. Em outubro, o governador da Califórnia, Gavin Newsom, sancionou o projeto de lei 1084, que obriga os grandes varejistas a ter seções de brinquedos gênero-neutro até 2024. (Isso não proíbe as seções de brinquedos tradicionais para meninos e meninas).
Enquanto isso, após alcançar altos níveis de vendas, mas também de crítica quando introduziu LEGO Friends, com grande distinção de gênero em 2012, este ano a LEGO anunciou uma nova pesquisa e uma nova campanha, “Ready for Girls” (Pronto para Meninas, na tradução livre), em conjunto com o Instituto Geena Davis on Gender in Media. A campanha incentiva as meninas a brincar com todos os produtos LEGO, para “neutralizar os estereótipos generalizados sobre as meninas que as desencorajam de brincar com brinquedos voltados para o aprendizado e desenvolvimento”.
Estereótipos permaneceram
Essa é uma grande mudança em um curto período de tempo, mas colocar gênero nos brinquedos infantis é, na verdade, um fenômeno recente.
“Os brinquedos na virada do século 20 não eram um grande bem de consumo e muitas famílias acabavam fazendo seus próprios brinquedos”, disse Elizabeth Sweet, professora assistente de sociologia da San Jose State University. “O gênero não era um fator de categorização tão primário”. As bonecas, disse ela, eram um presente popular para bebês meninos ou meninas.
O gênero de roupas e brinquedos infantis pegou para valer há pouco mais de 100 anos, em um esforço para ensinar as crianças desde cedo como desempenhar seus papéis de gênero adequadamente. Os brinquedos deixaram de ser comercializados por idade e passaram a tentar explicitamente moldar as preferências e o futuro das crianças: conjuntos de esfregão e vassoura para meninas e conjuntos de montagem e maquinário para meninos.
Essa mensagem de gênero diminuiu um pouco durante o movimento feminista dos Estados Unidos na década de 1970, disse Sweet. Ela descobriu que menos de 2% dos brinquedos no catálogo da Sears, de 1975, tinham marcadores de gênero explícitos. Mas a década de 1980 viu a desregulamentação da TV infantil, o que permitiu um novo nível de marketing de brinquedos, disse Rebecca Hains, professora de mídia e comunicações da Salem State University, em Massachusetts. Isso foi seguido pela ascensão do “poder feminino” na década de 1990, e o marketing impôs o gênero aos brinquedos novamente.
“Existe uma espécie de oscilação que vai e volta ocorrendo constantemente em nossa cultura”, disse Hains.
No final do século 20, os brinquedos pararam de preparar as crianças para os papéis tradicionais de gênero e passaram a se concentrar nas fantasias: princesas para meninas e super-heróis para meninos.
Os fabricantes de brinquedos “pegaram os estereótipos e os reembalaram em papel com gliter, mas eles têm as mesmas idéias sobre o gênero”, disse Sweet. “As mulheres são passivas, carinhosas e cuidadosas, e os homens são ativos, enérgicos e capazes”.
As bonecas de princesas e outros personagens são muito esguias, observou Hains. “Elas não parecem que poderiam ser fisicamente fortes, porque são muito delicadas”. Os brinquedos de super-heróis, por outro lado, têm os falsos músculos.
Sweet descobriu que os brinquedos costumam ter mais gênero hoje em dia do que em qualquer outra época da história – mas claramente isso começou a mudar.
O problema com os brinquedos de gênero
Se você está comprando presentes que têm marcadores de gênero, disse Hains, é fácil superá-los. Se você comprou um presente para um menino com apenas fotos de meninas na embalagem, “basta desempacotar e colocar o item debaixo da árvore”, disse ela.
Hains disse que se você tem uma garota que gosta de princesas, compre bonecas de princesa e um brinquedo de ação, como um caminhão de bombeiros. “Podemos brincar de princesas e fazer a princesa apagar fogo”, disse ela.
Por que fazer isso?
Quando os brinquedos são definidos por gênero pelos profissionais de marketing e pelos pais, eles não apenas reforçam os estereótipos, mas também promovem diferentes conjuntos de habilidades. “Qualquer coisa que fosse promovida para as meninas era sobre ser bonita”, disse Hains. Os brinquedos das meninas costumam promover habilidades de comunicação e gentileza, enquanto para os meninos, a ênfase é na ação e na assertividade.
A pesquisa de gênero da LEGO descobriu que as meninas têm seis vezes mais probabilidade do que os meninos de imaginar que os cientistas e atletas são homens em vez de mulheres. Os pais de ambos os sexos tinham quatro vezes mais probabilidade de encorajar os meninos a brincar com jogos de computador ou esportes e cinco vezes mais probabilidade de encorajar as meninas a dançar e se arrumar.
“As crianças estão experimentando ideias sobre seus próprios interesses e aptidões e talvez até papéis futuros”, disse Hains. “É problemático quando você está circunscrevendo opções e dizendo que toda essa gama de coisas é apenas para meninas e essa outra gama de coisas é apenas para meninos”.
Corrigindo a trajetória
Mudanças na forma de como os brinquedos são comercializados podem ajudar a mudar o comportamento do consumidor, mas as normas culturais são difíceis de superar. “Eu realmente acho que é difícil para os meninos”, disse Lauren Apfel, mãe de quatro filhos e editora executiva da revista Motherwell. “É sempre mais difícil para eles abraçar a ideia das roupas mais femininas, os brinquedos mais femininos, ao contrário da menina que está brincando com blocos e ninguém pensa duas vezes”.
De fato, a LEGO descobriu que “71% dos meninos vs. 42% das meninas dizem que se preocupam em ser ridicularizados se brincarem com um brinquedo tipicamente associado ao outro sexo”.
A atitude de Apfel foi comprar para meninos – tanto os dela quanto para outros – bonecas de presente de fim de ano e de aniversário para encorajar uma espécie de “abertura de gênero” e apresentar a mensagem – de que todos os brinquedos são para todos os públicos.