Petrobras diz que decisão do Ibama contraria Acordo de Paris e compromete segurança jurídica
Estatal também demonstrou incômodo com o fato de ter complementado oito vezes pedidos do órgão ambiental
A Petrobras considerou no seu pedido para que o Ibama reveja a negativa da licença para perfuração de um poço na bacia da Foz do Amazonas que a decisão do órgão contraria o Acordo de Paris e põe em xeque a segurança jurídica do Brasil.
A estatal também demonstrou incômodo com o fato de ter complementado oito vezes pedidos do órgão ambiental.
“A decisão administrativa em questão, ao desconsiderar que a exploração da Margem Equatorial está alinhada com a política ambiental e energética brasileira, evidencia comportamento contraditório da Administração Pública em relação aos compromissos assumidos pelo país no Acordo de Paris, e compromete a segurança jurídica para os investimentos em energia no país”, diz o documento de 26 páginas que a CNN teve acesso e que detalha os argumentos do pedido de reconsideração.
O argumento de que a exploração na margem equatorial é ambientalmente sustentável é um dos principais pontos do documento. Há inclusive um item que trata especificamente desse tema chamado no documento “Da viabilidade ambiental de licenciamento na Margem Equatorial Brasileira em razão de regular leilão da ANP. Nova Fronteira necessária para segurança energética do país”.
Neste tópico, a petrolífera afirma que “é crucial destacar que o incremento da produção da Petrobras se dará com baixa intensidade de carbono e de forma alinhada à ambição de atingir a neutralidade das emissões de gases de efeito estufa (NetZero) das operações sob controle da Companhia até 2050”.
Diz ainda que “o desenvolvimento de soluções de baixo carbono é um pilar importante do direcionamento tecnológico da Petrobras”. Afirma ainda que “os investimentos previstos no Plano Estratégico para o período entre 2023 e 2027 incluem o montante de US$ 4,4 bilhões (6% do CAPEX total) em projetos direcionados a iniciativas em baixo carbono, crescimento expressivo em relação ao ciclo de planejamento anterior” e que “este montante será aplicado na descarbonização das operações, em iniciativas de biorrefino (diesel renovável e bioquerosene de aviação), e em pesquisa e desenvolvimento para novas competências”.
Pedidos de complementações
A Petrobras separou todo um tópico para abordar o que, segundo ela, levou a oito complementações de pedidos por parte do Ibama. Trata-se do item quatro do documento, chamado de “Da afirmativa de análise de ao menos oito complementações ao estudo ambiental”.
Ele chega a mencionar que uma resolução do Conama estabelece que o Ibama só pode realizar pedidos de esclarecimentos uma vez.
“A partir de 2023, assumiu no Ibama uma nova gestão e entendemos ser legítima a solicitação de complementações. A empresa sempre buscou esclarecer e atender as demandas colocadas pelo Ibama. Veja-se que a Resolução Conama 237/97, art. 10, IV, estabelece que o Ibama pode realizar pedido de esclarecimentos uma única vez, podendo ainda estes pedidos serem renovados sobre os mesmos aspectos, caso não tenham sido atendidos satisfatoriamente. No entanto, verifica-se, na prática, o próprio Ibama reconheceu que os novos pedidos de esclarecimentos foram feitos de forma extemporânea. Como consta no Despacho no 15098704/2023-COEXP/CGMAC/DILIC, o órgão reconheceu “que tais questionamentos poderiam ter sido efetuados anteriormente, causando embaraço ao presente processo, no estágio em que se encontra”, diz o documento.
A Petrobras afirma ainda que, em uma “postura colaborativa”, atendeu a todos os pedidos. “Mesmo assim, em uma postura colaborativa, a Petrobras sempre respondeu a todas as solicitações a contento, uma vez que todas as ações solicitadas foram adotadas, implicando, inclusive, o aporte de novos recursos para o pleno atendimento às solicitações feitas”, disse.
Segurança energética
O documento diz ainda que a exploração é necessária para garantir energia no mundo. “Demonstrando a importância dessa nova fronteira exploratória, dados da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) indicam que novos projetos em águas ultra profundas no Brasil terão relevante papel no atendimento à demanda mundial de energia. No relatório World Energy Outlook 2022, a agência projeta um aumento de 45% na produção do país em 2030 (em relação a 2021) no cenário APS (Annoucend Pledges Scenário), que é um cenário alinhado aos objetivos do Acordo de Paris. Mesmo no cenário Net Zero de transição mais acelerada, a IEA prevê uma demanda mundial de cerca de 20 milhões de petróleo por dia em 2050, o que indica que o petróleo a ser produzido pela Petrobras a partir de novas descobertas será necessário para o mundo e para o Brasil no futuro”, diz o texto.
Procurado, o Ibama informou que o pedido ainda precisará ser discutido com a área técnica e que, em razão disso, ainda é cedo para manifestar um posicionamento.
A CNN procurou o Observatório do Clima e aguarda um posicionamento.
Para Claudio Angelo, coordenador de Comunicação e Política Climática do Observatório do Clima, os pontos abordados pela Petrobras não procedem.
“A Petrobras empurrou esse pedido do bloco 59 se baseando numa exceção prevista na portaria interministerial de 2012. Quer dizer, a possibilidade de admissão de atividades exploratórias só por manifestação dos Ministérios do Meio Ambiente e de Minas Energia. O que surpreende não é a negativa que o Ibama deu agora, mas a demora para ser negada. O presidente do Ibama não negou qualquer possibilidade de exploração de petróleo. Ele apenas pegou um estudo e falou ‘com isso aqui não tem como'”, disse.
Além disso, para Angelo, não é verdade que o petróleo a ser produzido em novas descobertas da Petrobras vai ser necessário para o Brasil e para o mundo. “O Brasil não está em insegurança energética. Ao contrário, se existe insegurança energética no Brasil é por conta da capacidade de refino. E dois, mudanças climáticas afetando o regime de chuvas e afetando os reservatórios das nossas hidrelétricas. E, portanto, à nossa produção de eletricidade. Então, é um contrafactual completo a Petrobras dizer que fronteira de petróleo aumenta segurança energética. Ela não aumenta”, afirmou