Os próximos passos do Copom e o impacto dos juros altos na economia
Analistas ouvidos pela CNN apontam que ciclo de alta deve ter continuidade e esfriar economia
Ao comunicar sua decisão de aumentar os juros, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) apontou que o ritmo de ajustes futuros dependerão da evolução da dinâmica da inflação.
Uma das principais preocupações do colegiado gira em torno do desvio das expectativas de inflação. As medianas do mercado, apuradas pelo boletim Focus, para 2025 e 2026 estão em 3,95% e 3,61%, respectivamente.
O BC persegue meta de 3% para este ano e os próximos, com tolerância de 1,5 ponto para cima ou para baixo.
“Em particular, o que vem gerando mais desconforto para o Copom é a avaliação de sobreaquecimento da atividade econômica e o desvio das expectativas de inflação com relação à meta”, aponta Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe da Warren Investimentos.
Na última quarta-feira (18), o BC elevou a taxa Selic, os juros básicos do país, em 0,25 ponto percentual, fixando-a em 10,75% ao ano.
O objetivo da autarquia com isso é cumprir sua missão de deixar a inflação na meta ao desacelerar a economia com os juros mais elevados, que encarecem o crédito.
O resultado já era esperado, e agora as atenções se voltam aos próximos passos da política monetária. O BC evitou dar forward guidance – o direcionamento para suas próximas reuniões –, deixando em aberto novas altas na taxa básica.
Expectativas do mercado
O sistema de expectativas de mercado apurado pelo BC aponta que a mediana dos agentes econômicos observa que, no próximo encontro — entre os dias 5 e 6 de novembro —, o Copom deve voltar a subir os juros, acelerando a alta da Selic a 0,5 ponto.
O mercado aponta que o movimento deve se repetir por mais duas reuniões, levando a Selic a 12% no primeiro encontro de 2025 do colegiado.
Para os analistas ouvidos pela CNN, o comunicado deixa duas coisas bem claras: novas altas são certas, mas o ritmo delas vai depender unicamente da evolução de dados.
“O teor é bem direto, [os diretores do BC] chamaram atenção para as vulnerabilidades para a inflação, como o hiato positivo – uma mudança importante do último comunicado para esse – e o mercado de trabalho aquecido“, aponta José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.
A estimativa da Genial vai em linha com a nova mediana apontada pelo mercado. A casa de investimentos acredita que, para a inflação chegar à meta no primeiro trimestre de 2026 – o chamado horizonte relevante para a política monetária -, a Selic deve chegar a 12% ao ano.
Há no mercado apostas ainda mais duras, que indicam que os juros devem acelerar a alta já na próxima reunião, para 0,5 ponto.
“Espero que o Banco Central continue subindo a taxa de juros, aumentando a velocidade nas próximas reuniões. Aumentando em todas as reuniões desse ano e no começo do ano que vem. Esperamos mais 1,5 ponto de alta”, indica Evandro Buccini, sócio e diretor de gestão de crédito e multimercado da Rio Bravo Investimentos.
Buccini avalia que o patamar atual ainda não é suficiente para levar a inflação à meta em 2026, e que o ritmo apontado pela Rio Bravo garante o objetivo do BC.
Por conta da percepção do Copom de que a atividade econômica está sobreaquecida e que o balanço de riscos para a inflação pende em direção a mais riscos inflacionários, a LCA Consultores espera mais duas altas de 0,5 ponto nas reuniões de novembro e dezembro, e uma última de 0,25 ponto na primeira reunião de 2025.
Depois disso, Thais Zara, economista sênior da casa, aponta que os juros devem ficar estáveis em 12% por algum tempo.
Porém, Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe da Warren Investimentos, considera exageradas essas previsões de aceleração.
“Vale lembrar que o cenário externo ficou mais favorável, o que tende a contribuir para a valorização do real e acelerar o processo de desinflação. Além disso, a atividade deve desacelerar, tendo em vista o menor impulso fiscal no próximo ano e as condições financeiras mais restritivas”, comenta Goldenstein.
Em nota, a Warren aponta que devem ocorrer três altas adicionais de 0,25 ponto, levando a Selic para 11,5% em janeiro de 2025.
“Reconhecemos que aumentou a possibilidade um ciclo mais intenso, em particular se o desempenho do câmbio não contribuir para o processo de desinflação, e caso os indicadores de atividade e mercado de trabalho continuem a mostrar um forte dinamismo”, indica o relatório.
“Por fim, esperamos que a reação inicial do mercado à decisão e ao comunicado do Copom seja de uma redução da inclinação da curva de juros e apreciação do real”, completa.
Goldenstein aponta que a Selic deve cair no segundo semestre de 2025. Mas antes disso, ela deve ficar ainda mais restritiva do que já está e depende da sustentabilidade do arcabouço fiscal.
“Uma piora da percepção de risco depreciaria o câmbio e elevaria a chamada taxa neutra de juros, que representa a taxa em linha com o PIB potencial, que não acelera nem desacelera a inflação”, conclui o estrategista-chefe da Warren Investimentos.
Impactos
Juros mais altos significam um crédito mais caro. O preço final das operações financeiras, do dinheiro, sai mais caro.
Varejo, indústria e diversos outros setores dependem do crédito para ter movimento, seja pelo consumo, investimentos ou financiamentos.
Isso significa que os juros mais altos reduzem a atividade.
“O primeiro impacto é reduzir a atividade, o objetivo é reduzir o crescimento de forma a fazer com que as relações entre oferta e demanda se tornem mais compatíveis, sem gerar pressões inflacionárias”, explica José Márcio Camargo, da Genial Investimentos.
Na quarta, além do BC brasileiro, o norte-americano Federal Reserve (Fed) também decidiu seu novo nível de juros. Porém, no caso dos norte-americanos as taxas foram reduzidas em 0,5 ponto, ficando na banda de 4,75% a 5%.
Com o crescimento da diferença de juros entre o Brasil e os Estados Unidos, a tendência é de que nossos ativos se tornem mais atrativos para o investidor estrangeiro. A lógica é simples: juros mais altos dão remunerações mais altas.
“Outro efeito importante é o fato de que como teve uma redução de juros nos Estados Unidos, no começo, deve haver uma valorização cambial”, aponta Camargo.
Mas no médio e longo prazo, o economista dá um alerta.
“Vemos efeitos complicados. Como o Brasil tem um déficit fiscal relevante, e a dívida continua crescendo, enquanto o governo busca um equilíbrio que só é um suposto equilíbrio, os investidores ficam mais receosos. Com o aumento do risco, passasse a exigir uma taxa ainda mais alta para investir, entrando num ciclo vicioso de juros altos”, conclui o economista da Genial.
E além da situação das contas públicas pressionar os juros altos, as taxas mais elevadas também pressionam o nível da dívida.
“Além disso, há um impacto fiscal negativo, pois boa parte da dívida pública é indexada à taxa Selic. Os juros reais no Brasil, que já são bem altos, vão ficar ainda maiores, o que leva a um crescimento mais acelerado da relação dívida/PIB”, explica Goldenstein, da Warren.
Por conta disso, Antonio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP e ex-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), avalia que a alta dos juros e a sinalização de novos apertos não são adequadas.
“Há um aparente consenso no Copom. Estão claramente ‘pautados’ pelo ‘consenso de mercado’, o que forma profecias autorrealizáveis. Fica claro pelo comunicado que o caminho será de novas elevações nas próximas reuniões, o que aumentará a percepção de risco por parte dos investidores produtivos”, avalia Lacerda.
“O crédito ficará ainda mais caro e escasso — já que as taxas básicas impactam as taxas aos tomadores finais —, o que desacelera investimentos produtivos”, afirma o professor da PUC.
Desse modo, Paula Zogbi, gerente de research e head de conteúdo da Nomad, aponta que o cenário pode desfavorecer empresas endividadas e os setores mais sensíveis a juros.
Mas Goldenstein reforça que se esse ciclo de aperto monetário for bem-sucedido em fazer convergir a inflação à meta, abriria espaço para um processo de relaxamento dos juros a partir do 2º semestre de 2025.
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