Novo decreto do saneamento faz gesto político, mas mantém pontos polêmicos
Textos anteriores foram criticados por investidores privados, que viram uma flexibilização das exigências feitas pela Lei do Saneamento, sancionada em julho de 2020
O governo já tem pronto um novo decreto presidencial que altera, mais uma vez, regulamentações do marco legal do saneamento básico.
A intenção do Palácio do Planalto é encerrar definitivamente as tensões com o Congresso Nacional por causa de dois decretos presidenciais editados em abril.
Esses textos iniciais foram criticados por investidores privados, que viram uma flexibilização das exigências feitas pela Lei do Saneamento, sancionada em julho de 2020.
A minuta foi obtida pela CNN e ainda preserva, pelo menos, dois pontos criticados pelo mercado nos primeiros decretos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Por isso, não há garantia de que o novo texto vai agradar investidores privados.
Politicamente, no entanto, o Planalto está redobrando os cuidados e resolveu fazer um afago no Congresso.
Os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), vão receber a minuta antes de sua publicação no Diário Oficial da União (DOU).
Fontes do governo informaram à CNN que a decisão de antecipar o texto para Pacheco e Lira foi uma decisão tomada em reunião de Lula com os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Jader Filho (Cidades) nesta segunda-feira (10).
A ideia é evitar que se repita o que houve na edição dos decretos de abril, publicados à revelia do Congresso, o que acabou levando a Câmara a aprovar um projeto de decreto legislativo sustando vários trechos.
Com o gesto, o governo espera que o Senado desista de apreciar o projeto já aprovado na Câmara. Pacheco havia alertado ao Planalto que, se um novo decreto não sair nesta semana, os senadores devem levar adiante a votação.
O problema, segundo a minuta de decreto à qual a CNN teve acesso, é que o novo decreto em elaboração mantém alterações feitas nos textos anteriores e não volta atrás em pontos criticados pelo mercado.
Um exemplo é a “segunda chamada” para companhias estaduais de água e esgoto que não conseguiram comprovar capacidade econômico-financeira para a universalização dos serviços até 2033 — prazo fixado em lei.
Essas empresas deveriam ter comprovado capacidade até dezembro de 2021.
Estatais de pelo menos sete estados — Acre, Amazonas, Maranhão, Pará, Piauí, Roraima e Tocantins — ignoraram o prazo e corriam o risco de perder seus contratos.
No entanto, um dos decretos assinados em abril dava uma espécie de “perdão” ao primeiro descumprimento e abria uma “segunda chamada” para comprovação de capacidade até dezembro de 2023.
Na prática, é uma nova chance para os inadimplentes.
Nos decretos de abril, também houve reclamações de parte dos investidores sobre o fim do limite de 25% às parcerias público-privadas (PPPs) na área de saneamento.
No governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), esse limite havia sido fixado para impedir que companhias estatais de água e esgoto façam PPPs que transfiram a maior parte da prestação dos serviços, mas mantendo suas estruturas administrativas.
A crítica de uma parcela do mercado é que isso preserva estruturas ineficientes e transfere custos desnecessários para os consumidores.
Um dos pontos efetivamente alterados, segundo a minuta obtida pela CNN, é impedir que estatais prestem diretamente (sem a necessidade de licitação) os serviços de saneamento para municípios ou conjunto de municípios em regiões metropolitanas.
Isso viabilizaria a manutenção das estatais Embasa e Cagepa, respectivamente, à frente de operações em Salvador (BA) e João Pessoa (PB).
Hoje, essas operações estão sendo feitas com base em contratos “precários” e se tornam potencialmente irregulares com o marco legal do saneamento.