Justiça dos EUA rejeita acordo judicial da Boeing sobre incidente do 737 Max
Em julho, a companhia concordou em se declarar culpada de uma acusação de conspiração para fraudar os Estados Unidos
Um juiz federal dos EUA rejeitou um acordo entre a Boeing e o governo do país nesta quinta-feira, após que a empresa disse que se declararia culpada de enganar a Administração Federal de Aviação (FAA, do inglês) antes de dois acidentes fatais com o 737 Max.
A ação do juiz do Tribunal Distrital dos EUA, Reed O’Connor, citou seus problemas com o processo de seleção de um monitor independente exigido no acordo para supervisionar a segurança e a melhoria da qualidade na Boeing.
Em julho, a companhia concordou em se declarar culpada de uma acusação de conspiração para fraudar os Estados Unidos. Pelo acordo, ela pagaria até US$ 487 milhões em multas – uma fração dos US$ 24,8 bilhões que as famílias das vítimas dos dois acidentes querem que a empresa pague.
O’Connor teve problemas com a ideia de que o Departamento de Justiça, e não o tribunal, teria aprovação sobre a seleção do monitor e sobre o desempenho da Boeing em um acordo anterior com o departamento em janeiro de 2021 sobre as mesmas acusações.
Esse acordo havia adiado o processo até que as questões de segurança fossem novamente levantadas por um plugue de porta que explodiu em um avião 737 Max pilotado pela Alaska Airlines em janeiro.
“É justo dizer que a tentativa do governo de garantir a conformidade falhou”, escreveu O’Connor em seu parecer.
“Nesse ponto, o interesse público exige que o tribunal intervenha. Marginalizar o tribunal na seleção e no monitoramento do monitor independente, como faz o acordo de confissão, prejudica a confiança do público na liberdade condicional da Boeing”, acrescentou.
Um dos problemas de O’Connor com o acordo foi o fato do Departamento de Justiça ter dito que a Boeing e a Justiça teriam que considerar a questão racial ao contratar o monitor independente. Mas ele também ficou chateado com o fato de o tribunal não ter tido um papel no processo de seleção.
As famílias argumentaram que o valor da multa representou um acordo vantajoso para a Boeing, deixando-a livre da responsabilidade pelos dois acidentes fatais causados por uma falha de projeto nos aviões.
Eles dissem que os lucros anteriores da Boeing em cada avião vendido permitiriam uma multa muito maior do que a que o Departamento de Justiça argumenta que pode justificar nos termos do acordo judicial.
“A rejeição do acordo judicial é uma importante vitória das famílias neste caso e, de forma mais ampla, dos interesses das vítimas de crimes no processo de justiça criminal”, disse Paul Cassell, advogado dos familiares das vítimas do acidente, em um comunicado.
“Os promotores federais e os advogados de defesa de alto poder aquisitivo não podem mais elaborar acordos de bastidores e esperar que os juízes os aprovem. As vítimas podem se opor e, quando tiverem boas razões para rejeitar um acordo, os juízes responderão”.
“Essa ordem deve levar a uma renegociação significativa do acordo judicial para refletir as 346 mortes que a Boeing causou criminosamente e colocar em prática um monitoramento adequado da Boeing para garantir que ela nunca mais cometa um crime como esse no futuro”, acrescentou.
Entretanto, não está claro se as famílias das vítimas do acidente ficarão mais satisfeitas com qualquer acordo judicial futuro, disse Todd Haugh, professor de direito comercial e ética da Kelley School of Business da Universidade de Indiana.
Qualquer novo acordo judicial será negociado pelo Departamento de Justiça do novo governo Trump e pela Boeing, e não sob o governo Biden. E foi o Departamento de Justiça do governo Trump que originalmente chegou a um acordo com a Boeing, semanas antes de deixar o cargo, que adiou a acusação, permitiu que a Boeing pagasse uma multa menor e poderia ter permitido que a empresa eventualmente evitasse uma declaração de culpa ou condenação em seu registro.
Essa pode ser uma situação do tipo “cuidado com o que você deseja” para as famílias, disse Haugh.
A CNN entrou em contato com a Boeing, que não respondeu imediatamente ao pedido de posicionamento.
De acordo com o acordo judicial de julho, a Boeing também concordou em gastar US$ 455 milhões em seus programas de conformidade e segurança nos próximos três anos, o que, segundo o governo, representaria um aumento de 75% em relação ao que a empresa gastava anualmente com esses programas.
Mas a maior mudança do acordo foi o fato de a Boeing ter concordado em operar sob a supervisão de um monitor nomeado pelo governo por um período de três anos para garantir que a empresa melhorasse a qualidade e a segurança de suas aeronaves.
O acordo representou mais um ponto negativo para a empresa, após uma série de problemas, que variaram de embaraçosos a trágicos, nos últimos seis anos. E foi um duro golpe para a reputação da Boeing, uma empresa que já foi conhecida pela qualidade e segurança de suas aeronaves comerciais.
Entenda as acusações
De acordo com as acusações, a empresa fraudou a Administração Federal de Aviação (FAA, do inglês) durante o processo de certificação do 737 Max para transportar seus primeiros passageiros.
O avião entrou em serviço em 2017, mas os dois acidentes fatais – em outubro de 2018 e março de 2019 – levaram a uma paralisação de 20 meses dos jatos, e as investigações revelaram uma falha de projeto em seu sistema de piloto automático.
A Boeing admitiu a responsabilidade pelos acidentes fatais e que seus funcionários ocultaram informações sobre a falha de projeto da FAA durante a certificação.
“A Boeing lamenta profundamente os acidentes e as perdas indescritíveis que os representantes das vítimas de acidentes sofreram”, disseram os advogados da empresa em um documento apresentado em agosto no processo.
“A Boeing, por sua vez, aceitou a responsabilidade pelos acidentes com o Max, publicamente e em litígio civil, porque o projeto de (um recurso do Max) contribuiu para esses acidentes”.
Mas a Boeing argumentou no processo que as informações enganosas que admitiu ter fornecido à FAA durante o processo de certificação não causaram o acidente.
E em seu próprio processo, em agosto, o Departamento de Justiça concordou essencialmente com esse argumento da Boeing.
“No entanto, no final das contas (os funcionários do DOJ) não encontraram a única coisa que está por trás das objeções mais fervorosas das famílias à resolução proposta: evidências que poderiam provar, além de qualquer dúvida razoável, que a fraude da Boeing causou a morte de seus entes queridos”, disse o pedido do Departamento de Justiça em apoio ao acordo.
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