Estados reclamam de reforma fatiada e vêem avanço da União sobre consumo
Ex-ministro e secretário de SP, Henrique Meirelles não vê reforma possível se não incluir ICMS e ISS
Secretários estaduais da Fazenda reclamaram nesta quarta-feira (12) do envio fatiado da proposta de reforma tributária pelo governo ao Congresso e manifestaram receio de que a CBS (Contribuição de Bens e Serviços) avance sobre o consumo, atualmente a principal fonte de arrecadação dos estados.
O secretário de Fazenda do estado de São Paulo, Henrique Meirelles, classificou de “absolutamente negativo para o país esse fatiamento”, durante audiência da Comissão Mista do Congresso da Reforma Tributária. Para ele, “a motivação inicial da reforma tributária é dar mais competitividade ao Brasil”, o que não será possível se a reforma não incluir ICMS e ISS, assim como os impostos federais.
“A maior complexidade do sistema tributário brasileiro é o ICMS porque tributa por setor, por estados, por setores de cada estado. A guerra fiscal é séria, mas é um dos problemas”, argumentou Meirelles.
A preocupação com o fatiamento foi compartilhada pelo secretário de Fazenda de Pernambuco, Décio José Padilha da Cruz, que afirmou que “a proposta de IVA amplo é a verdadeira reforma tributária que o país precisa” e que essa “reforma tributária em regime de urgência nos preocupa muito”.
“A gente está diante de alguns dilemas. Como vai se analisar isoladamente a CBS, já que ela tem um problema de avanço de base, e a gente já conversou isso inclusive com pessoal do governo federal? Ela não é só fusão de PIS e Cofins. Ela tem avanço de base, por isso tem que ser olhada com mais amplitude. E a gente não está participando dessa CBS. É só uma solução para o governo federal”, ponderou Padilha.
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O presidente do Comsefaz, Rafael Fonteles, apresentou a proposta de substitutivo do comitê que reúne secretários de Fazenda dos 26 estados e do Distrito Federal. Segundo ele, a reforma do colegiado não aumentará tributos e incluirá alíquotas deixadas de fora pelo governo, como ICMS. Ele admitiu que os estados têm “receio de que a União avance sobre a tributação do consumo”, caso seja aprovada a CBS de 12% sem inclusão da reforma dos demais impostos.
“A nossa proposta é absolutamente exequível e não há aumento de carga tributária. Como é que nós garantimos isso? Com o período da calibragem. A proposta prevê um ou dois anos com uma alíquota de apenas 1% para saber o potencial desse tributo. Aí, depois, você vai aumentando, gradativamente, para garantir que não haja nenhum sobressalto no processo que implique aumento de carga tributária”, disse Fonteles.
Convergência
O deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator da reforma tributária, enxergou pontos convergentes entre as propostas em análise no Congresso e a sugestão apresentada pelos secretários de Fazenda, tais como a concordância de que não é possível aumentar a carga tributária e de que é preciso realizar uma reforma mais ampla, que se debruce sobre os principais problemas da tributação sobre o consumo.
“Não dá para tratar da tributação sobre o consumo sem enfrentar a legislação e a complexidade do ICMS, que traz profundas distorções ao nosso sistema. Acho que isso é uma convergência muito importante, porque muita gente dizia que os estados não queriam participar de uma reforma como essa. […] E me parece muito clara a visão dos estados que foi colocada agora, no sentido de tratarmos de uma reforma ampla e de uma reforma que não traga aumento de carga.”
Já Simone Tebet (MDB-MS), presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, se disse “cética em relação a uma reforma tributária mais ampla”. “Eu acompanho essa questão há mais de 20 anos e obviamente, com os demais parlamentares, lutarei até o último suspiro por uma reforma mais ampla possível. Mas na prática a teoria é sempre outra. Temos um cobertor curto e a conta nunca fecha, um país com grande diversidade regional”, disse.
A senadora também considerou questionável a criação de fundos regionais para compensar eventuais perdas na reforma, conforme defendido por secretários na audiência. “Então fica a pergunta: os fundos serão suficientes para ressarcir os estados que perderão? Qual a base de cálculo? Como serão distribuídos os valores dos fundos tendo em vista a desigualdade regional? Está havendo diálogo com os municípios? Se sim, o que eles pensam disso, já que hoje eles recebem 25% do ICMS?”
Para Tebet, não é possível “imaginar tudo isso sem aumento de imposto, e aumento de imposto no Brasil hoje é inconcebível”. “O Congresso Nacional não aprova aumento de impostos sobre o consumo. Já sobre a renda e a propriedade… Eu não estou vendo ninguém falar sobre lucros e dividendos.”