Especialistas divergem sobre capacidade de o Ibovespa retomar os 120 mil pontos
Na última sexta-feira (26), o principal índice brasileiro rondou os 101 mil pontos
O Ibovespa parece estar longe de retomar seus tempos áureos. O principal índice da bolsa tem sofrido com incertezas no mercado doméstico, sobretudo, no campo da política fiscal, e com uma dose de instabilidade política.
Em 7 de junho, bateu seu recorde e alcançou a marca de 130 mil pontos. Porém, na sessão da última sexta-feira (26), rondou os 101 mil pontos – média de quando não existia pandemia.
Com o cenário conturbado, muitos analistas consideram que os tempos de volatilidade não devem acabar tão cedo — sobretudo às vésperas de um ano eleitoral. Há quem enxergue nessa situação, porém, uma oportunidade para “comprar na baixa”, o que poderia garantir um impulso extra ao índice.
Veja a opinião de especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business:
Pedro Serra, analista de Research da Ativa Investimentos, por exemplo, diz que 2022 pode ser um ano potencialmente mais volátil que 2021, devido às questões internas.
“Embora esteja cedo para que o período eleitoral faça preço nos mercados, a eleição já pesa nas escolhas de política do governo para agradar determinado grupo de eleitores. Nesses casos, uma agenda mais responsável não costuma ser muito popular”, diz.
Victor Lima, analista da Toro, também acredita que o cenário eleitoral pode deixar o mercado mais volátil e sem direção, “podendo retomar até os 108 mil pontos, no começo do ano que vem”.
Já Eduardo Levy, diretor de investimentos da Kilima Asset, tem boas esperanças para o futuro do Ibovespa. Ele afirma que não é tão difícil alcançar os 120 mil pontos, “a B3 é uma das bolsas emergentes mais baratas, o que, em termos de múltiplos, e dólares pode puxar o índice de volta aos maiores patamares”.
Quem também segue na mesma linha de Levy são os analistas do Morgan Stanley e a especialista em ações da Clear, Pietra Guerra.
A instituição financeira projetou o Ibovespa aos 120 mil pontos no final de 2022 – alta de 17% em relação ao fechamento da última sexta-feira. O banco tem preferência por ativos relacionados às commodities, além de companhias do setor agro, alimentício e petroquímico.
“O período de chuvas de dezembro a março pode ser fundamental para avaliar se o país enfrentará ou não um racionamento de eletricidade em 2022, o que pode dar um alívio para a economia que já enfrenta diversas pressões fiscais”, aponta o relatório do Morgan Stanley.
Já a especialista da Clear argumenta que, no ano que vem, “pode haver uma melhora na percepção de risco no Brasil, refletindo em uma boa expectativa de juros, tirando a pressão negativa da bolsa, e dando algum fôlego para o índice”.
Pressões negativas
A percepção de que a inflação foge do controle do Banco Central e sobre a forma errática como o governo vem guiando discussões importantes para o futuro do Orçamento da União — vide a “novela” em torno da PEC dos Precatórios –, são as principais pressões negativas na bolsa atualmente, na análise de Alan Gandelman, presidente da Planner Corretora.
Vale ressaltar que a ferramente do BC para conter a alta dos preços é o avanço da Selic, taxa básica de juros, cujo efeito colateral é a desaceleração da economia, já baqueada pela pandemia. Enquanto o índice oficial da inflação já ultrapassam a meta da autoridade monetária no ano, a taxa de juros prevista para o ano que vem já atingiu os dois dígitos na expectativa do mercado.
“(A expectativa de juros mais altos) acaba sendo negativo para a Bolsa, pois o índice gira em torno de um cenário macro-econômico mais restritivo, que não estimula o consumo dos brasileiros e, também, reduz a entrada de capital estrangeiro no país”, destaca Pietra, da Clear.
Outro ponto que pressiona o índice brasileiro para baixo é a expectativa de que o Fed (BC dos EUA) segure a quantidade de dólares no mercado, seguindo seu plano de redução de estímulos, conforme o ritmo da atividade se recupera.
A retirada da ajuda financeira fica mais perto, segundo analistas, também conforme a inflação nos EUA aumenta. O índice que mede preços ao consumidor nos Estados Unidos subiu novamente em outubro, e já acumula em 12 meses a maior alta dos últimos 30 anos, de 6,2%.
O que sustentava o bom desempenho
Até junho deste ano, quando o Ibovespa superou pela primeira vez a marca dos 131 mil pontos, o cenário que sustentava o bom humor dos investidores era bastante diferente do atual.
Primeiro, vale dizer que a Selic, usada como referência de remuneração de investimentos de renda fixa, não se distanciava tanto da mínima histórica (2%) naquele momento, quando estava na casa dos 4% ao ano. Isso significa que o movimento de busca por maiores recompensas na bolsa era mais forte que hoje em dia, com a taxa básica em 7.75% a.a.
Além disso, uma série de notícias no campo econômico animava os investidores. Entre elas, vale citar o avanço da vacinação contra a Covid-19, a aprovação do Orçamento de 2021, que trouxe maior clareza para o mercado em relação aos gastos do governo, e o avanço de outras pautas caras aos investidores, como a MP de capitalização da Eletrobras e as reformas tributária e administrativa.
“O índice estava em um cenário de recuperação geral das economias, a partir do fim gradativo dos lockdowns gerados pela pandemia”, afirma o presidente da Planner Corretora. “O que fez naquele momento de aparente recuperação era uma excelente alternativa para o investidor.”
Tirando a capitalização da estatal e o avanço da vacinação (sobre a qual cresce a dúvida de eficácia diante da nova variante do coronavírus), esses outros assuntos “floparam”, na linguagem das redes sociais. Ou seja, fracassaram, levando junto a base de sustentação do Ibovespa e a paciência dos investidores. Mas o cenário ainda pode mudar. Façam suas apostas.