“Déficit zero” não representa necessariamente melhora em contas públicas, diz Salto à CNN
Para o economista, o grande desafio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é melhorar o resultado primário e convencer o mercado e a sociedade de que o governo é capaz de produzir um superávit
A entrega do “déficit zero” prometido pelo governo no próximo ano não representa necessariamente uma melhora das contas públicas, na avaliação do economista-chefe da Warren, Felipe Salto. Para o especialista, um cumprimento da meta apenas do ponto de vista legal, ou seja, para cumprir a formalidade do arcabouço fiscal e evitar penalidades pode até significar uma piora da saúde fiscal.
O economista se refere ao uso de “subterfúgios contábeis” que o governo pode recorrer para fechar as contas. Entre eles, estão o abatimento de cerca de R$ 60 bilhões em precatórios – que ficam de fora dos cálculos do arcabouço -, assim como utilizar o limite inferior da banda como alvo, que representaria algo em torno de R$ 30 bilhões.
Para o ano que vem, a equipe econômica trabalha alcançar o déficit zero, sendo ele o centro da meta fiscal. No entanto, o arcabouço estabelece uma margem inferior, de -0,25% do Produto Interno Bruto (PIB), que permite o cumprimento legal da meta e evita com que o governo incorra em crime de responsabilidade fiscal.
“Isso significa que ele [Haddad] pode fazer um déficit de cerca de R$ 100 bilhões e, mesmo assim, do ponto de vista da sinalização legal, dizer que cumpriu a meta zero. […] Se eu entrego o cumprimento da meta em 2025, mas isso representar um déficit efetivamente pior que o de 2024, será muito mal visto. Usar esses subterfúgios contábeis e cumprir a meta é pior do que você ter uma meta mais transparente, fazer o ajuste fiscal e melhorar o déficit sistematicamente”, diz o economista-chefe, que recebeu a CNN na sede da Warren.
Essa é justamente a preocupação citada por Salto, que alerta para um cenário em que, na prática, a banda inferior, se torne o próprio centro da meta.
Para o economista, o grande desafio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é melhorar o resultado primário e convencer o mercado e a sociedade de que o governo é capaz de produzir um superávit.
Atualmente, a Warren trabalha com projeções menos otimistas para o próximo ano. A corretora prevê para um déficit de 0,9% do PIB, ou seja, pior do que a projeção para este ano, que é de um déficit de até 0,6% – resultado que cumpre a meta estabelecida para 2024. O número também é distante até mesmo do limite inferior da meta.
Na avaliação de Salto, são três frentes que o governo deve concentrar esforços para melhorar a projeção para o ano seguinte. Ele cita que o corte de gastos de R$ 25,9 bilhões – detalhado nesta quarta-feira (28) pela equipe econômica -, assim como o aumento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e o aumento da tributação dos Juros Sobre Capital Próprio (JCP).
“Se essas três coisas acontecerem, entendo que Haddad consegue melhorar o primário em relação ao ano de 2024. Não é a oitava maravilha do mundo, mas não é aquele cenário pessimista de fazer o pior possível e entregar o cumprimento legal da meta”, conclui.
Nesta sexta-feira (30), o governo irá apresentar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025. A expectativa é grande por parte de analistas. Por parte da Fazenda, as sinalizações são de que o projeto a ser anunciado virá equilibrado.
Nesta quarta-feira, Haddad disse que a peça que está sendo finalizada traz mais conforto à equipe econômica do que a apresentada no ano passado, quando, reconheceu o ministro, havia excesso de otimismo com as receitas extraordinárias levantadas em outorgas e concessões.