Com 34%, Brasil supera índice mundial de mulheres à frente de empresas médias
Desafios, no entanto, ainda são muitos; pesquisa mostra que 74% das entrevistadas ainda veem preconceito e discriminação na busca por trabalho
“Nós, mulheres, já temos liderança no sangue.”
A frase é de Simoni Bianchi, CFO da Bankme, fintech que cria e opera Mini Bancos. Simoni faz parte de um recorte de destaque no Brasil: dados da Grant Thorton International mostram que, no Brasil, 34% dos cargos de liderança em empresas de médio porte são exercidos por mulheres — ficando acima da média mundial, de 29%.
Os dados indicam que, ao olhar para as salas de administração, comitês e lideranças de empresas no país, as mulheres estão ganhando cada vez mais espaço.
A preocupação com práticas ESG (Ambiental, Social e Governança, em inglês) se transformou em uma tendência para os investidores nos últimos anos. Com o holofote nas iniciativas de diversidade, inclusão e igualdade de gênero, as empresas com comitês de liderança homogêneas precisam correr atrás para reorganizar prioridades.
“Acho que o investimento em políticas afirmativas e a ampliação do número de líderes mulheres pode ajudar no posicionamento de marca da empresa com a fidelização do consumidor e, por consequência, no seu valor de mercado”, explica Caroline Palermo, advogada e especialista em ESG.
Apesar disso, as entrevistadas concordam que as lideranças femininas vão muito além de apenas apaziguar acionistas. “As mulheres sempre foram super fortes e competentes. O que ocorre é um movimento natural da sociedade, de conscientização das empresas e de equiparação salarial”, complementa Palermo.
Patrícia Komura, COO do Zarpo, agência online de viagens, também acredita no poder de disseminação. “Estar em uma posição de liderança e ser mulher é algo que pode inspirar muitas outras mulheres em suas conquistas e, de forma indireta, ajudar a combater a discriminação em outros lugares”, diz ela, que assim como Simoni, faz parte dos 34%.
A executiva da Zarpo avalia que, para desconstruir estigmas e preconceitos, essa representatividade é crucial. Não é possível discutir igualdade de gênero, equiparação salarial, licença maternidade e inúmeras outras questões sem, primeiro, ter lideranças femininas que possam somar à discussão.
O argumento ganha ainda mais força no Brasil, um país em que três em cada 10 pessoas (27%) admitem que se sentem desconfortáveis em ter uma mulher como chefe. Os dados são da pesquisa “Atitudes Globais pela Igualdade de Gênero” (em tradução livre do inglês), publicada em 2019 pela Ipsos.
Outro lado da moeda
Simoni e Patrícia, hoje, somam com orgulho à estatística. Contudo, elas mostram que não foi fácil: e não é para a maioria das mulheres.
Em uma pesquisa realizada pela Pearson, que entrevistou 6.000 mulheres em seis países —EUA, Reino Unido, Brasil, México, Índia e China—, os resultados mostraram que 74% das entrevistadas ainda veem o preconceito e a discriminação como barreiras na busca de novas oportunidades de trabalho.
“A sociedade ainda perpetua o conceito normativo que reforça a necessidade de rotular pessoas e estabelecer uma divisão, no qual o homem é a força de trabalho, com superioridade econômica e social. A mulher ainda recebe um papel de submissão na pirâmide social”, explica a advogada Caroline Palermo.
Os resultados mostram que ainda há uma grande disparidade de gênero no mercado. Além das preocupações com o preconceito e a discriminação que as impedem de encontrar trabalho, 77% das entrevistadas têm preocupações em encontrar um emprego que lhes paguem o suficiente para sustentar a si mesmas e suas famílias.
Para Heloisa Guerato, diretora comercial da Pearson, o aumento do número de lideranças femininas, por si só, não se sustenta. “As empresas precisam ir além de somente aumentar a presença feminina em seus quadros e promover condições para quem essas mulheres possam desenvolver suas carreiras”, argumenta.
Um passo de cada vez
Mesmo com os dados, Simoni está esperançosa: “É um movimento que eu acredito: cada vez mais as mulheres precisam se fortalecer para poderem buscar sua posição de liderança dentro das empresas”.
Mas as especialistas e executivas concordam que o Brasil —e o mundo— ainda tem muito a caminhar, dentro e fora do ambiente corporativo. Por ora, resta contar as vitórias das mulheres brasileiras, e manter um olhar crítico e atento quando empresas divulgarem suas iniciativas de igualdade de gênero. Afinal, nem tudo que reluz é ouro.
*Sob supervisão de Deise de Oliveira