Brasil enriquece mais urânio em busca de autossuficiência para energia nuclear
País tem a sétima maior reserva mundial do produto e é um dos 13 que dominam o ciclo de produção do combustível
Dono da sétima maior reserva de urânio do planeta, de acordo com dados da Associação Nuclear Mundial (AMB), o Brasil aumentará a partir desta sexta-feira (26) a quantidade de metal enriquecido para alimentar as usinas de Angra 1 e 2, as duas únicas do parque nuclear brasileiro.
A ampliação ocorrerá com a inauguração da nona cascata de ultracentrífugas da Fábrica Nacional de Combustíveis. A unidade pertence às Indústrias Nucleares Brasileiras (INB), sediadas em Resende, no Sul Fluminense.
A nova cascata de ultracentrífugas demandou um investimento de R$ 54 milhões e fará com que o Brasil seja capaz de atender a 65% da demanda das recargas anuais das duas usinas. O plano é que em 2033 o país tenha produção suficiente para atender às unidades.
A autossuficiência, no entanto, só seria alcançada em 2037, com 30 cascatas. Isto porque, até 2026, o governo pretende concluir as obras de Angra 3, paralisadas desde 2015, por conta de escândalos de corrupção investigados pela Operação Lava-Jato.
Com o aumento da produção própria, o Brasil reduzirá as importações de urânio enriquecido, trazido da Europa. De acordo com a AMB, o país é um dos 13 reconhecidos internacionalmente por dominar o ciclo de enriquecimento do urânio.
Especialistas apontam ainda que o Brasil pode descobrir, nos próximos anos, ser detentor da maior reserva mundial do metal.
A explicação para o fenômeno está no fato de as estimativas serem feitas com base no mapeamento atualmente disponível, que analisou apenas 30% do território nacional, na década de 70.
O processo foi retomado pelo Ministério de Minas e Energia. Ex-presidente da Eletrobras e professor emérito do curso de Engenharia Nuclear da UFRJ, Luiz Pinguielli Rosa entende que o movimento desta sexta-feira é fundamental para o país.
“Estamos caminhando em direção à autossuficiência. Além de dominar o processo e de ter uma tecnologia própria para enriquecimento de urânio, o Brasil tem grandes reservas que o colocam em uma posição privilegiada para o uso da energia nuclear.
Hoje a demanda é pequena porque temos apenas dois reatores. Mas temos a previsão de conclusão de Angra 3 e há outro reator em desenvolvimento: o do submarino de propulsão nuclear, feito pela Marinha”, afirma o pesquisador.
O especialista explica que o enriquecimento do urânio significa o aumento artificial da concentração do metal, para que ele seja utilizado como combustível nuclear. Para as usinas de Angra dos Reis, a proporção utilizada é de 4,25%.
Mas, para a embarcação submarina, o nível necessário é 20%: bem maior, mas bem aquém do nível necessário para armas nucleares.
“Para isto, seria necessário atingir a marca de 90%, o que não vai acontecer, porque o Brasil é signatário do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), assim como outras 188 nações.
Embora o nível de enriquecimento de urânio necessário para o submarino da Marinha seja maior, ele poderá também, futuramente, ser realizado na FNC, em Resende”, avalia o especialista.
Em meio à crise elétrica provocada pela baixa dos reservatórios das usinas hidrelétricas, a energia nuclear responde por 1,2% da matriz energética brasileira. O Plano Nacional de Energia 2050, do Ministério de Minas e Energia prevê a conclusão de Angra 3 e a construção de uma nova unidade até 2031, como previsto pelo Plano Decenal de Energia 2031.
O local ainda não foi definido, mas a intenção já foi confirmada pelo ministro Bento Albuquerque.
Para dar conta da demanda atual e de sua eventual expansão, o Brasil retomou em 2020 a exploração de urânio na Mina do Engenho, em Caetité, no Sudoeste da Bahia. A produção nacional ficou parada por cinco anos, após o esgotamento da jazida então explorada.