Azeite extra virgem está ficando muito caro – e pode até nem ser real
Avaliado em US$ 22,3 bilhões, o mercado do azeite deve aumentar exponencialmente na próxima década, mas por trás disso há empresas criminosas que lucram exportando produto falso, misturado a subprodutos do azeite ou outros óleos
O azeite tem sido um alimento básico da dieta e cultura mediterrânea há milênios. Antes mesmo de chegar à mesa, era usado para práticas medicinais e religiosas, ganhando o apelido de “ouro líquido” na “Ilíada” de Homero.
Ao longo dos séculos, o ramo de oliveira simboliza a paz e a prosperidade, e os pungentes azeites virgens e extra virgens são exportações globais de alto valor. Avaliado em US$ 22,3 bilhões em 2022, é esperado que o mercado do azeite aumente exponencialmente na próxima década.
Mas por trás dos azeites extra virgens mais populares do mundo – produzidos na Itália, na Espanha e Grécia – estão empresas criminosas igualmente rentáveis que lucram vendendo ouro líquido falso que usa girassol, canola ou mesmo óleo de lâmpada para criar um produto que pode ser vendido por até US$ 30 o litro nos Estados Unidos.
No final de novembro, as autoridades da Espanha e Itália, que trabalham com a agência de aplicação da lei Europol da União Europeia, disseram que prenderam 11 pessoas ligadas a um desses grupos criminosos, apreendendo 12 barris contendo cerca de 260 mil litros de azeite adulterado, não virgem ou extra virgem.
Eles também apreenderam mais 5.200 litros de óleo de qualidade, pronto para o mercado e pronto para exportação. As autoridades disseram que era “impróprio para consumo”, apesar da rotulagem falsa que afirmava que o azeite era 100% italiano ou espanhol.
As autoridades também encontraram 91 mil euros em dinheiro, quatro veículos de última geração, rótulos falsificados e documentos que afirmavam que o azeite era cultivado na Espanha e na Itália, quando testes de amostra revelaram que era mais provável que fosse feito pela mistura de subprodutos do azeite com outros tipos de óleo.
Demanda crescente
“Uma combinação de vários fatores, como a inflação geral dos preços, a redução da produção de azeite e o aumento da procura, criaram o terreno fértil perfeito para produtores fraudulentos”, segundo um comunicado da Europol.
“Infelizmente, a falsificação de azeite extra virgem é uma prática comum, razão pela qual a luta contra ele é uma prioridade da aplicação da lei – especialmente nos países produtores”, acrescentou a agência.
A infusão de azeite de alta qualidade com produtos de menor qualidade tornou-se uma prática comum, uma vez que a crescente procura de exportações de azeite do Mediterrâneo é contrabalançada por taxas de produção mais baixas, impulsionadas por condições climáticas extremas cada vez mais adversas, afirma Coldiretti, a principal organização agrícola de Itália.
Os fraudadores também têm usado cada vez mais clorofila ou betacaroteno para colorir o óleo com seus característicos tons verdes ou amarelos amanteigados.
Em 2023, a produção de azeite do Mediterrâneo caiu 41%, disse Coldiretti. Uma primavera extremamente chuvosa significou que as oliveiras floresceram menos e o calor recorde no verão murchou as azeitonas que cresceram. Isso deixou os produtores incapazes de atender à demanda do mercado.
A chamada “máfia agrícola” nas regiões produtoras de azeite do Mediterrâneo tem preenchido as lacunas na oferta, desenvolvendo as suas operações de azeite extra virgem falso.
“A mistura de azeite de consumo com alternativas de qualidade inferior permitiu aos criminosos oferecer preços competitivos ao mesmo tempo que entravam nas cadeias de abastecimento legais”, afirma a Europol. “Esta prática ilegal pode não só causar um risco para a saúde pública, mas também minar a confiança do consumidor e, assim, ter grandes repercussões econômicas”, alerta o comunicado.
Ataques de motosserra
Embora os seus produtos adulterados estejam longe de ser autênticos, as gangues criminosas precisam de azeitonas de qualidade para o óleo base que é usado para criar as suas misturas.
Isto levou a um aumento no roubo de oliveiras inteiras ou de ramos produtivos. Na Grécia e na Itália, os ladrões têm utilizado regularmente motosserras em árvores antigas para roubar ramos carregados de oliveiras.
A colheita da azeitona é um processo delicado, por isso roubar árvores ou ramos inteiros é mais fácil do que colher os frutos, embora muitas vezes deixe as árvores muito danificadas.
As autoridades da Grécia, Espanha e Itália também relataram incidentes mais elevados de arrombamentos de armazéns de azeitonas e destruição de equipamentos de colheita como uma tentativa de atrasar a colheita para que os ladrões pudessem levar as azeitonas.
As autoridades espanholas e italianas que efetuaram as detenções em novembro disseram que as investigações começaram depois de serem detectadas “anomalias”. Isto incluiu um relato de um caminhão de azeite de qualidade inferior que entrou em uma unidade de produção onde estava sendo produzido azeite destinado à exportação.
O azeite é um dos alimentos rotulados de forma mais fraudulenta na Europa e um dos mais investigados, de acordo com um relatório de 2022 da Comissão Europeia.
A fraude do azeite falso é impulsionada pela demanda, diz Coldiretti.
Os preços do azeite extra virgem não deverão cair tão cedo, apesar da má colheita em 2023. Depois de uma seca espanhola em 2022, os preços do azeite da Espanha (o maior produtor mundial da variedade virgem extra) saltaram mais de 80%, de acordo com a União Europeia. O preço do azeite italiano aumentou 66%, embora a colheita do ano passado não tenha ficado abaixo da média.
Este ano, ambos os países sofreram graves escassezes de produção, o que significa que os preços para a temporada de exportação de 2024 deverão subir mais, tornando o mercado ainda mais atraente para os criminosos.