A combinação de Lula e Von Der Leyen para o acordo UE-Mercosul
Protocolo adicional da UE, encaminhado em março ao Mercosul, faz referência a metas de redução do desmatamento que vão além dos compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito do Acordo de Paris
Os ministros das Relações Exteriores do Mercosul devem se reunir nesta segunda-feira (18), à margem da Assembleia Geral da ONU em Nova York, para avaliar os próximos passos das negociações de livre comércio com a União Europeia.
Na semana passada, o bloco sul-americano — formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai — enviou uma resposta sucinta à “side letter” (protocolo adicional) enviada pelos europeus no começo do ano, a fim de avançar em um tratado entre os blocos.
Os dois lados acertaram que tentarão fazer discussões semanais, por videoconferência, na tentativa de fechar o acordo — negociado há mais de duas décadas — ainda neste semestre.
A resposta do Mercosul tem pouco mais de três mil caracteres e não entra em detalhes sobre demandas — já externadas publicamente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — em compras governamentais.
Segundo relatos feitos à CNN por fontes diplomáticas, a resposta enxuta foi uma estratégia combinada entre Lula e a presidente da Comissão Europeia (braço executivo da UE), Ursula Von Der Leyen. Eles se encontraram rapidamente, no início semana passada, durante a cúpula de líderes do G-20 em Nova Délhi.
Na conversa entre Lula e Von Der Leyen, ambos concordaram que a reta final de negociações não pode ser “capturada” pelos técnicos e precisa ter um impulso político. Do contrário, segundo o relato de fontes, o risco de novos impasses é grande e dificultará o fechamento definitivo das negociações.
Por isso, a decisão do Mercosul foi encaminhar uma resposta à “side letter” da UE com princípios gerais, mas sem entrar em detalhes. Pesou, ainda, o fato de que Uruguai e Paraguai tinham ressalvas à insistência brasileira com exceções no capítulo de compras governamentais para preservar o espaço de políticas públicas.
O protocolo adicional da UE, encaminhado em março ao Mercosul, faz referência a metas de redução do desmatamento que vão além dos compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito do Acordo de Paris.
A nova legislação europeia que permite restrições à entrada de produtos agrícolas oriundos de áreas sem certificação antidesmate também prejudicou o clima para a reta final de negociações comerciais.
Na resposta a Bruxelas, os países do Mercosul afirmam que o tratado de livre comércio “deve salguardar a capacidade do Estado de implementar políticas” em pelo menos quatro áreas: saúde; ciência, tecnologia e inovação; cadeias de valor sustentáveis; ação climática e segurança alimentar. Não há, porém, menção específica a compras governamentais.
Como a CNN havia antecipado, em julho, a resposta do Mercosul também contempla — indiretamente — a legislação antidesmatamento da UE.
“Não deve haver sanções (ou mesmo insinuação de aplicação de sanções) incorporadas ao documento e as Partes devem evitar o uso de medidas destinadas a alcançar o desenvolvimento sustentável como um obstáculo injustificado ou desnecessário ao comércio”, diz um trecho da carta.
“O Acordo deve ser equipado com um mecanismo para reequilibrar as concessões comerciais negociadas no âmbito do Acordo, caso essas concessões sejam suspensas ou anuladas como resultado da legislação interna da UE”, acrescentam os países do Mercosul.
Lula e Von Der Leyen concordaram ainda, segundo fontes, em explorar o fato de que o Mercosul está sendo presidido neste semestre pelo Brasil e a UE está sob comando da Espanha até dezembro. A ideia é não perder essa janela de oportunidade para a conclusão das negociações.