Trégua na inflação aumenta apostas em última alta da Selic em agosto; veja o que dizem especialistas
Indicadores de arrefecimento da inflação podem fazer com que o BC interrompa seu ciclo de aperto monetário na reunião de agosto, após última alta de 50 pontos-base, com a Selic em 13,75% ao ano
A escalada da taxa básica de juros pode dar uma trégua depois de agosto. A Selic, que está agora em 13,25% ao ano, deve ser elevada em 0,50 ponto percentual, na próxima reunião do Copom, nos dois primeiros dias de agosto. Mas essa pode ser a última alta seguida, segundo especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business.
O aperto monetário pode encerrar seu ciclo em meio aos resultados recentes de arrefecimento da inflação. O IPCA de junho variou 0,67%, enquanto a expectativa para o índice de julho é de deflação. Já o IGP-M desacelerou a 0,21% no mês, informou a FGV.
A alta dos juros teve início logo no começo de 2021, quando ela ainda estava em 2% ao ano. Desde então, a inflação acumulada de mais de dois dígitos fez com que o Banco Central (BC) implementasse um aperto monetário mais agressivo para tentar conter a disparada dos preços.
Nos últimos relatórios do Focus, o mercado reduziu as projeções inflacionárias para 2022 e elevaram as estimativas de crescimento econômico este ano. A previsão do IPCA passou de 7,67% para 7,54% segundo o boletim desta semana, enquanto a projeção do PIB avançou para 1,75%, ante 1,59%.
Neste cenário, com os resultados de indicadores da inflação melhores que o esperado pelo mercado, algumas projeções já apontam para o fim do ciclo de aperto monetário após agosto, como no caso da Eleven Financial, que prevê elevação de 50 pontos-base na Selic durante a próxima reunião, encerrando o ciclo em 13,75%.
“A economia brasileira tem reagido muito bem às questões que foram impostas. Ela se mostrou muito resiliente em 2021 e 2021”, afirmou José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos, sobre um possível fim da alta de juros depois de agosto.
O economista explicou que tem sido otimista em relação à recuperação econômica do país. Ele destacou a redução da alíquota do ICMS sobre combustíveis e energia elétrica como um fator preponderante para a desaceleração da inflação, mas disse que o BC deve ficar mais atento com uma nova elevação de preços no segundo semestre.
Segundo ele, o aumento do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 reais, entre outros benefícios aprovados, deve manter a economia mais aquecida na segunda parte do ano, com mais incentivos ao consumo.
“Com a redução de impostos, a inflação vai cair, mas haverá outro aumento de demanda com a aprovação da PEC dos Benefícios, que levará a um ganho real na renda familiar, e isso pode causar uma pressão inflacionária adicional que não estava no horizonte do BC”, ponderou.
Alexandre Espírito Santo, economista-chefe da Órama, disse que também acredita em um aumento de 50 pontos-base nos juros na reunião de agosto, com uma estabilização da Selic a partir de setembro.
Ainda assim, o especialista disse que os juros mais altos são importantes para conter a inflação dos próximos anos, tendo em vista que as projeções para 2023 têm aumentado.
“A inflação do ano que vem não está ancorada, e ela é a relevante para a política monetária atual. Como ela vem crescendo, o ponto principal é tentar deixá-la perto do centro da meta, que é algo muito difícil de fazer”, comentou.
O especialista acredita que o cenário fiscal brasileiro também é tido como uma preocupação aos olhos do mercado. Ele acredita que, além disso, o movimento de aumento dos juros no mundo todo, como uma forma de tentar conter a disparada dos preços, também pressiona o Banco Central brasileiro.
“Existe uma inquietação do mercado sobre o fiscal, sobre como será conduzido, porque o teto de gastos está cheio de goteira, e essa dúvida acaba batendo na inflação no ano que vem. Outro fator é a mudança na política monetária global, com o Fed e o BCE subindo juros. Isso também acaba pressionando os bancos centrais dos emergentes”, destacou.
Para a economista-chefe do Inter, Rafaela Vitória, a alta de 0,5 ponto percentual esperada para a reunião de agosto nem seria necessária, mas o Copom não deverá surpreender o consenso de mercado. “O cenário atual dá sinais de mudanças com relação ao rumo da inflação, fundamentos para que o BC encerre o ciclo de alta nesse momento em 13,75%”, afirmou.
Para Rafaela, a principal mudança é a queda nas cotações das commodities no mercado internacional. “A redução ainda é modesta, considerando a elevação acumulada desde 2020, mas indica que, na margem, as pressões inflacionárias nos alimentos e energia tendem a diminuir e, pontualmente, podemos até observar deflação em alguns casos”, disse.
Outro fator importante, de acordo com ela, é que os indicadores de produção industrial em diversos países também apontam para um arrefecimento da demanda global, e as cadeias produtivas tendem a voltar à normalidade, aliviando os preços dos bens industriais.
Além disso, Rafaela disse que, praticamente todos os bancos centrais estão retirando estímulos. “As condições financeiras globais mais contracionistas contribuem para reduzir as expectativas e o risco de inércia inflacionária”, comentou.
Com uma inflação projetada de 5% nos próximos 12 meses (a partir de agosto, já excluindo o mês excepcional de deflação em julho) teremos uma taxa de juros real de mais de 8%, um patamar bastante elevado.
“O risco de excesso de juros no cenário atual é significativo e o custo pode ser novamente anos de baixo crescimento, elevado desemprego pressionando a renda e suscitando políticas públicas populistas”, disse.
Apostas em alta de juros
Ainda que a economia tenha apresentado resultados mais positivos que o esperado pelo mercado, não há consenso quanto à estabilização dos juros neste momento.
O Credit Suisse revisou na segunda-feira passada a sua previsão sobre a Selic, apontando para uma taxa de 14,25%, ante 13,75% na projeção anterior. O banco estima que haverá uma elevação de 50 pontos-base em agosto e mais duas, de 25 pontos cada, em setembro e outubro
Uma das principais razões para essa divergência sobre o fim da alta dos juros é o aumento das projeções inflacionárias para os próximos anos.
A previsão do mercado para a inflação para 2023 avançou de 5,09% para 5,20% – a 15° alta consecutiva. Se confirmadas as expectativas, ela também estoura o teto da meta do ano que vem, determinado em 4,75%.
O ex-diretor do BC Tony Volpon reforçou ser “muito difícil” a entidade monetária brasileira atingir a meta para o ano que vem, e afirmou que a instituição já trabalha visando conter os preços dentro das projeções para 2024.
“É preciso adicionar juros para uma convergência em 2024, pois o BC já comunica ‘inflação ao redor da meta em 2023’ sinalizando que muito provavelmente não conseguirá entregar ela dentro da projeção estipulada, algo inclusive que o mercado já espera”, disse.
Segundo ele, o Banco Central tem que “comprar seguro e neutralizar o risco de cauda”, colocando a Selic acima de 14%.
“Isso vai dar uma ancoragem melhorar para a moeda e não fazer o país ficar torcendo pelo melhor cenário no âmbito internacional para as coisas darem certo”, disse.
Sérgio Goldeinstein, estrategista-chefe na Renascença DTVM, pontua que existem uma gama de fatores que contribuem para as projeções elevadas de inflação, sendo uma das principais a preocupação do mercado com a situação fiscal do país.
“Do lado externo, houve uma persistência maior do choque de oferta, mas o que vem pesando é a piora da percepção do arcabouço fiscal”, declarou.
“Com a PEC [dos Benefícios] aprovada, que contorna o teto de gastos, aumenta a demanda em um momento em que o banco central tem uma política contracionista. Além disso, ultrapassar o teto novamente tira a credibilidade da âncora fiscal do país, e isso contribui para a depreciação do câmbio a para a piora das expectativas de inflação”, acrescentou.