PPPs e colaboração entre União e estados são caminhos para sucesso do novo PAC, dizem especialistas
Novo programa de investimentos em infraestrutura teve como ponto de partida projetos apresentados pelos 27 governadores a Lula; além disso, contará com concessões e parcerias público-privadas
O governo Lula se prepara para anunciar, na primeira semana de julho, um programa de investimento em infraestrutura. Especialistas consultados pela CNN apontam os “bons contratos” de parceria público-privada (PPPs) e a colaboração entre União, estados e municípios como os caminhos para o “novo PAC” ser bem-sucedido.
Segundo apuração da CNN, o desenho do programa tem como ponto de partida uma lista de 499 obras e projetos apresentados pelos 27 governadores em uma reunião com o presidente Lula em janeiro, logo depois da posse do novo governo. Cada estado levou ao Palácio do Planalto uma relação de empreendimentos prioritários a serem considerados no novo programa.
Para a economista e professora da FGV Carla Beni, a falta de reciprocidade e colaboração entre os entes federativos foi um dos fatores que contribuíram para a baixa eficiência do programa em suas versões anteriores. A especialista avalia positivamente esta iniciativa.
“As obras listadas não sairão do governo federal, mas dos governadores. Quando o governo federal pede as obras mais relevantes para cada estado, ele acerta. Não há ninguém melhor do que aquele que está no estado, na ponta, que é quem conhece melhor a situação, para indicar as prioridades”, afirma a especialista.
Nas últimas semanas, houve um “afinamento” entre as demandas dos estados e as prioridades definidas pelo governo federal. O ministro da Casa Civil, Rui Costa, e sua equipe técnica se reuniram com governadores para chegar a uma agenda comum.
Setor privado é “saída”
Num cenário em que o orçamento público é “apertado”, o governo terá de buscar alternativas de financiamento ao gasto público puro. Fabio Pereira de Andrade, professor da ESPM e especialista em Administração Pública e Governo, vê as PPPs como um mecanismo vital para o momento.
“O sucesso ou não do novo programa vai depender do governo desenhar bons contratos de parcerias público-privadas. Seria uma possibilidade para atrair o setor privado a realizar o grosso do investimento, com o setor público entrando com benefícios fiscais de longo prazo”, explica.
O secretário especial de Articulação e Monitoramento da Casa Civil, Maurício Muniz, afirmou à CNN que os recursos do Orçamento Geral da União (OGU) serão apenas uma das fontes para os projetos. O plano contemplará ainda concessões e PPPs.
Os especialistas avaliam que, dado o contexto atual, a maior participação da iniciativa privada pode ser uma saída para que o governo encontre recursos para investir em infraestrutura.
“Parece que nesse ponto temos criatividade [do governo]. O governo federal parece um direcionador de tendências. Há setores em que, caso haja contratos bem desenhados, as PPPs podem gerar oportunidades de rentabilidade para o setor privado e de resolução de gargalos para o público”, indica o professor da ESPM.
Em abril, o Ministério da Fazenda anunciou o novo marco das PPPs, com mudanças para estimular investimentos do setor privado Brasil afora.
Dividido em basicamente quatro propostas, o marco tem potencial para gerar cerca de R$ 100 bilhões em investimentos, segundo a Fazenda. A principal das medidas estabelece que a União dará o aval para assegurar contragarantia a projetos de PPPs de estados e municípios.
Para Luciano Nakabashi, professor da FEA-RP, da USP, o novo marco fiscal é determinante para o futuro do programa. Ele destaca que, com a aprovação do mecanismo, a tendência é de que o país ganhe em termos de previsibilidade e credibilidade, o que deve atrair investimentos.
“Para incentivar o setor privado, tanto o nacional quanto de outros países, é preciso dar estabilidade macroeconômica, controlar o fiscal. Isso é um dos requisitos para atrair mais investimentos. São necessárias regras que sejam estáveis e façam sentido. Para as empresas, o retorno sempre deve ser compatível com o risco”, indica.
Outros caminhos para geração de investimento
Luciano Nakabashi destaca organismos internacionais com potencial de investimento como outra possível fonte de recursos. Ele menciona o Banco Mundial e o Banco dos Brics, por exemplo. Presidente do Brasil durante a implementação do PAC 2, Dilma Rousseff está à frente do Bando dos Brics atualmente.
O professor Fabio Pereira de Andrade reitera a cooperação entre entes federativos como alternativa para tornar o investimento mais eficiente. Para o especialista, a centralização excessiva dos gastos no governo federal foi o principal erro estratégico das versões anteriores do PAC.
“Houve muita centralização do governo federal e dependência do orçamento público. Se pensava que o investimento público levaria não só ao crescimento econômico, mas também os agentes privados a investirem, que haveria uma contrapartida dos estados e municípios beneficiados pelas obras. Essas contrapartidas não vieram, o cenário internacional se deteriorou e isso trouxe piora na questão orçamentária”, explica.
Apesar de concordar com a importância da participação de estados e municípios no processo, o professor da FEA-RP relembra que a situação orçamentária desses entes também é apertada atualmente.
Falhas em modelos anteriores do PAC
O chamado “PAC 1”, primeira fase do programa, vigorou entre 2007 e 2010, no segundo governo de Lula. O montante inicial anunciado para novas obras foi de R$ 500 bilhões, com investimento em infraestrutura social, urbana, logística e energética. Mais tarde, foram aportados ao menos outros R$ 140 bilhões.
A posse de Dilma Rousseff, em 2011, trouxe “o PAC 2”, com foco em transportes, energia, cidades (saneamento e prevenção em áreas de risco), investimentos “cidadãos” (unidade básica de saúde, creches e pré-escolas) e atenção a programas como Minha Casa, Minha Vida e o Água e Luz para Todos. O aporte era previsto em R$ 955 bilhões até 2014.
Dados do Tribunal de Contas da União (TCU) trazem detalhamento sobre a eficiência do programa, com número de ações de infraestrutura previstas e concluídas. O PAC 1 previu 16.542 ações e concluiu 1.538 (9,3%) entre 2007 e 2010; já o PAC 2 previu 12.464 e concluiu 3.337 (26.7%) entre 2011 e 2014.
A economista e professora da FGV Carla Beni pontua, sobre a análise dos dados, que parte dos projetos entregues no PAC 2 foram “requentados” do PAC 1, já que não foram concluídos no prazo inicial.
Segundo a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), o aumento médio de custos para as principais obras previstas entre os PACs 1 e 2 foi de 49%. Já o aumento médio de prazo foi de 106%.
Para Luciano Nakabashi, os principais motivos que explicam a ineficiência dos programas dizem respeito a falhas em seu planejamento. Ele ainda aponta os impactos negativos do que chama de “ciclo político”.
“Acho que é uma questão de planejamento e foco. E tem alguns problemas sobre essas parcerias: existe algum estímulo para anunciar obras, porque isso dá visibilidade política. Acaba havendo anúncios de obras, e antes de finalizá-las são anunciadas outras. Então é uma mistura de falta de planejamento e do ciclo político”, aponta.
Carla Beni reitera a tese de que parte dos projetos não foram bem planejados — destacando termos dos contratos referentes ao meio ambiente, por exemplo. “Foram projetos que não estavam bem feitos. Havia, por exemplo, trâmites de questões ambientais que encontraram entraves porque não eram adequados. Houve falha de gestão”.
O “Novo PAC”
O nome do futuro plano ainda está indefinido. A governança do novo programa de investimentos prevê diferentes instâncias decisórias. No topo, há um conselho gestor formado por quatro ministros: Rui Costa (Casa Civil), Simone Tebet (Planejamento), Fernando Haddad (Fazenda) e Esther Dweck (Gestão e Inovação).
O plano contará com mais de mil projetos e terá sete eixos de atuação: transportes, transição e segurança energética, infraestrutura urbana, infraestrutura social, inclusão digital e conectividade, água para todos e defesa.
Maurício Muniz afirma que uma das responsabilidades do novo plano de investimentos em infraestrutura será colaborar com a política de “neoindustrialização” do país.
Por isso, a intenção do governo é restabelecer a exigência de conteúdo nacional em projetos enquadrados no plano. De certa forma, trata-se de uma retomada de algo que já havia nas primeiras versões do PAC — quando havia percentuais mínimos a serem cumpridos para o fornecimento de itens “made in Brazil”.
Segundo o secretário da Casa Civil, estão em estudo exigências de conteúdo nacional em áreas como saúde, defesa, energia (placas fotovoltaicas e componentes eólicos), infraestrutura (material rodante e maquinário).
Estão entre os candidatos a ganhar destaque no novo plano de investimentos — sem inclusão confirmada por Muniz — projetos como:
- Trechos 2 e 3 da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol)
- Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico)
- Ferrovia Transnordestina
- Duplicação da BR-101 e da BR-116, especialmente no Nordeste
- Duplicação da BR-364 (Acre-Rondônia)
- Recuperação da BR-174 (Manaus-Boa Vista)
- Rota Bioceânica (integração rodoviária do Mato Grosso do Sul com portos no Pacífico)
- Túnel Santos-Guarujá (SP)
- Gasoduto Rota 4B (RJ)
- Ramal do Apodi (obra de segurança hídrica para Rio Grande do Norte, Paraíba e Ceará)
- Recuperação e dragagem da Hidrovia de Lagoa Mirim (RS)