Para analistas, BC não muda Selic agora, mas deve colocar risco fiscal no radar
Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anuncia nesta quarta-feira decisão sobre a taxa básica de juros, em última reunião de 2022
É praticamente consenso no mercado financeiro que o Banco Central não deve mais mexer na Selic, a taxa básica de juros do país, neste ano, de acordo com economistas consultados pela CNN.
O aumento do risco fiscal, porém, pode passar a ser citado como um ponto de atenção para a autoridade monetária, em meio à campanha do governo eleito para poder gastar mais e também às informações ainda evasivas sobre a equipe e a política econômicas que pretende adotar.
Isso significa que, caso não haja sinais mais claros de que o futuro presidente Luiz Inácio Lula da Silva seguirá uma agenda responsável com o controle das despesas públicas, a trajetória de queda dos juros aguardada para o ano que vem pode acabar alterada, e nem a possibilidade de que a Selic suba ainda mais, em vez de cair, está descartada.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anuncia no fim da tarde desta quarta-feira (7) sua nova decisão sobre o futuro da Selic, no que será seu último encontro de 2022.
A ampla expectativa é que ela não será alterada, pela terceira reunião consecutiva, e ficará nos mesmos 13,75% atuais. São os juros mais altos desde 2016, quando a Selic passou pelos 13,75% pela última vez.
“Quero ver se o Copom vai falar em seu comunicado sobre a parte fiscal e a PEC da Transição, se vai mencionar algo a respeito”, disse a analista para renda fixa da Nord Research, Marília Fontes, que acredita na Selic mantida nos 13,75% nesta quarta-feira.
“Se ele falar disso, aí pode ser um indicativo de que, se aprovada a PEC da Transição como está, ele fará um novo ciclo de alta nas taxas de juros. Se não fizer nenhuma grande menção ao assunto, aí provavelmente o plano de voo é manter a Selic estável [em 13,75%] por um longo período de tempo.”
Futuro em revisão
Até pouco tempo, a ampla expectativa de analistas do mercado e investidores era de que a taxa de juros, depois da forte escalada no último ano, ficaria estacionada nos 13,75% atuais por vários meses, até voltar a cair, lentamente, em algum momento do segundo semestre do ano que vem.
Entretanto, com a perspectiva de que, em um governo Lula, os gastos públicos sejam mais inflados —o que costuma ser uma fonte de inflação—, as apostas já começaram a mudar.
O cenário que toma forma, agora, é de uma queda nos juros não só que demorará mais para começar, mas que também cairá ainda mais lentamente.
Pelo Boletim Focus, publicação semanal do Banco Central com a mediana das projeções econômicas de dezenas de bancos e consultorias, a expectativa para a taxa Selic ao fim do ano que vem já subiu de 11,25% para 11,75% desde o início de novembro.
“Não deve haver nenhuma surpresa e, hoje, a Selic deve ser mantida em 13,75%”, disse o economista André Perfeito. “Mas o BC deve introduzir a discussão do que se pretende a respeito do novo arcabouço fiscal e indicar que, até persistir essa incerteza, ele deverá, de maneira preventiva, não subir os juros, mas cortar menos ou deixar de cortar.”
Mais gastos no horizonte
A PEC do Estouro, apelido recebido pela PEC da Transição, é o projeto de emenda à Constituição apresentado pela equipe de Lula pleiteando uma verba extra ao Orçamento de 2023 de quase R$ 200 bilhões, destinados a bancar e ampliar o Bolsa Família e outros programas sociais.
O texto também pedia a retirada de despesas do teto de gastos por todos os quatro anos do futuro mandato, com início em janeiro.
Na versão mais recente, apresentada nesta terça-feira (6) pelo relator da PEC no Senado, o senador Alexandre Silveira, esse “furo” foi reduzido a dois anos. O texto aguarda, agora, negociação e aprovação no Congresso.
“O impacto da política fiscal expansionista afeta a política monetária em duas dimensões”, explicou o economista-chefe da Suno Research, Gustavo Sung, em relatório a clientes.
“No curto prazo, afeta os ânimos do mercado, impacta positivamente a atividade econômica e eleva as expectativas de inflação. No longo prazo, reduz a credibilidade do arcabouço fiscal do país.”
Lula passou a campanha afirmando que iria rever a regra do teto de gastos, que congela o crescimento das despesas do governo acima da inflação por 20 anos. O presidente eleito, porém, não deu ainda dicas de como poderá ser o novo arcabouço fiscal que pretende colocar no lugar.
“São indefinições muito fortes a respeito do próximo governo”, diz André Perfeito. “Isso gera ruído, o que gera maior prêmio de risco, o que se traduz em inflação também mais alta e projeções para a Selic mais fortes.”
Sem mudanças relevantes até aqui
Danilo Passos, economista da gestora WHG, explica que houve poucas mudanças importantes em relação ao cenário econômico e às expectativas para a inflação que o Copom tinha em outubro, quando se reuniu pela última vez, e agora.
“O câmbio está mais ou menos estável, as expectativas para a inflação têm uma ligeira alta na margem, mas nada que motive o BC a já tomar uma ação em relação à taxa de juros agora”, disse.
“O que mudou significativamente desde outubro foi a percepção sobre o panorama fiscal, então o Copom pode, já no comunicado, aumentar um pouco o tom em relação a isso, colocando um alerta e preparando o terreno para caso perceba que, no ano que vem, tenha que subir os juros, porque o lado fiscal vai ser expansionista”, continuou Passos.