Juros teriam que ir a 13% e PIB a zero para inflação voltar à meta, diz economista
Seria necessário congelar completamente a economia e a renda das pessoas para colocar a inflação de volta na meta, de 3,5%, até o fim de 2022
Para que a inflação, atualmente na faixa dos 10%, volte rapidamente para baixo dos 4%, o Banco Central teria que subir os juros para mais de 10% ainda neste ano e o país teria que ter um crescimento ainda menor do que o já esperado para o ano que vem, beirando ou até caindo na recessão.
De acordo com estimativas feitas pelo economista Livio Ribeiro, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), a Selic, hoje em 6,25%, teria que saltar para os 13% até dezembro para que o BC conseguisse cumprir a tarefa de colocar a inflação de volta na meta, de 3,5%, até o fim de 2022.
Juros de 13% agora, por sua vez, teriam um efeito ainda mais recessivo sobre o crescimento da economia nos meses à frente. Como resultado, o Produto Interno Bruto (PIB) de 2022 – que já está vendo as projeções minguarem para perto do 1% – com sorte ficaria no zero.
“O crescimento do ano que vem seria algo em torno de zero, podendo até ser negativo”, disse Ribeiro.
Ou seja, seria necessário congelar completamente a economia e a renda das pessoas para que os preços pudessem voltar a cair em um horizonte de tempo desse tamanho.
As contas do economista replicam o modelo estatístico de projeções utilizado pelo Banco Central para estimar a taxa de juros ideal do país e tomar suas decisões em relação a ela.
Maior aumento em duas décadas
O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC confirmou na quarta-feira (22) a quinta alta consecutiva da Selic, para 6,25%, e já informou que, na próxima reunião, em outubro, deverá fazer mais um incremento de 1 ponto, para 7,25%. Já é o ciclo mais acelerado de alta dos juros das últimas duas décadas no país.
Com dados de inflação que não dão alívio, os economistas projetam que a Selic ainda continuará subindo em 2021 até os 8,25% e, em 2022, chegará aos 8,5%, de acordo com a média das projeções de mercado compilada semanalmente pelo BC no Boletim Focus.
Muitos bancos e casas de análise, porém, já falam de uma Selic passando dos 9% nos primeiros meses do ano que vem, para então se estabilizar nesse patamar.
Inflação (muito) acima da meta
A prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial de inflação do país, acumulou alta de 10,05% em setembro. Até o fim do ano, pelas projeções do Boletim Focus, não deve cair para menos de 8%.
De uma forma ou de outra, são resultados acima da meta de inflação para o ano, que era de um alvo de 3,75% com uma margem de tolerância de 1,5 ponto para mais ou para menos. Quer dizer, a função do BC era te-la mantido entre um piso de 2,25% e um teto de 5,25%.
Para 2022, o centro da meta é 3,5%, com a tolerância entre 2% e 5%. Dados os altos níveis de agora e os vários choques de preços que ainda persistem, nem no ano que vem a inflação alcançará o alvo da meta: as projeções coletadas pelo Boletim Focus indicam agora o IPCA a 4,1% até o fim de 2022.
“Uma Selic de 9% a 9,5% no primeiro trimestre do ano que vem consegue levar a inflação para o centro da meta em 2023, mas não em 2022”, disse Ribeiro. “Se o BC quisesse de fato levar a inflação para a meta em 2022, ele tinha que colocar a Selic em 13%, e ainda em 2021.”
‘Taxa de sacrifício’
A Selic é a taxa de juros que serve de piso para todos os empréstimos e investimentos de renda fixa do país. Ela é a principal ferramenta do BC para cumprir aquela que é a sua função primordial: manter a inflação controlada e dentro das metas estipuladas.
Quando a inflação está muito alta, a Selic é aumentada, o que encarece o crédito, esfria o consumo, faz a economia perder força e, por fim, leva os preços para baixo de novo.
Mas se é esta a função do Banco Central, e qualquer especialista em juros e o próprio BC são capazes de replicar o mesmo modelo e chegar às mesmas conclusões do pesquisador da FGV, por que então ninguém está falando seriamente de uma Selic a 13%?
A resposta, explica Ribeiro, está no que os economistas chamam de “taxa de sacrifício”: quanto o Banco Central e, em última instância, a sociedade estão dispostos a perder em crescimento e emprego em troca de voltar logo para um nível de inflação mais saudável.
“É uma discussão que começa a haver agora entre os economistas. Em quanto vale puxar o freio da economia para trazer a inflação mais rapidamente para a meta”, disse.
“Para que isso aconteça já no ano que vem é impossível, porque a taxa de sacrifício exigida é inviável, não é razoável. Por isso se começa a olhar para horizontes mais longos, que é ter a inflação perto da meta novamente só em 2023.”