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    Isenção de IR para estrangeiros atrairia capital em debêntures, dizem analistas

    Proposta do governo federal zeraria alíquota na modalidade, cujo valor mínimo é de 15%

    João Pedro Malardo CNN Brasil Business , em São Paulo

    Uma isenção de pagamento de Imposto de Renda para investidores estrangeiros que comprarem debêntures, títulos de dívida emitidos por empresas, pode ajudar a incentivar uma migração de capital para esse tipo de investimento, segundo analistas.

    A medida é um dos objetivos do governo federal, e pode ser aprovada como parte dos trabalhos do Legislativo antes do período eleitoral, inclusive como emenda do chamado Marco das Garantias, já aprovado na Câmara e em análise no Senado.

    Atualmente, os investidores estrangeiros possuem uma participação muito pequena no mercado de debêntures, afirma Carlos Antonio Rocca, coordenador do Centro de Estudos de Mercado de Capitais da Fipe (Cemec-Fipe).

    Considerando a carteira de investimentos estrangeiros, o mercado de debêntures representa pouco mais de 1%, em torno de R$ 5 bilhões dos R$ 417 bilhões em capital estrangeiro. Já o mercado de debêntures possui cerca de R$ 743 bilhões negociados.

    “Mais da metade da carteira de estrangeiros está em ações, seguidas por títulos públicos, cerca de 20%, e o resto é de negócios bancários. Os debêntures possuem uma participação pouco expressiva”, explica Rocca.

    Mudança de cenário

    Questionada pelo CNN Brasil Business sobre a proposta, a Comissão de Valores Monetários (CVM) afirma que “sinaliza positivamente a movimentos como este”.

    Para o órgão, iniciativas como essa “buscam gerar mais oportunidade e celeridade à economia nacional, e que tende a ampliar o acesso de companhias brasileiras ao capital estrangeiro via mercado de capitais – segmento regulado pela CVM”.

    Rocca vê a proposta de isenção como positiva, com potencial de aumentar a parcela de capital estrangeiro alocado na modalidade, o que também seria benéfico para as empresas que buscam reunir capital.

    Entretanto, ele não acredita que isso levaria a um aumento no capital total investido no Brasil por estrangeiros, mas sim em uma realocação dentro da própria carteira já existente.

    “Pode ter um efeito de realocação de renda fixa no mercado brasileiro, o volume eu já tenho dúvidas, porque geralmente gestores de carteiras alocam por região, país, levando em conta várias variáveis”, explica.

    Já no caso do mercado secundário, em que investidores negociam as debêntures que comparam, a medida tende a trazer mais liquidez, o que é positivo para ter uma melhor precificação de ativos, o que também pode atrair investidores domésticos.

    “Os investidores estrangeiros no mercado de ações tem mais mobilidade e rotatividade que no caso dos domésticos, eles atuam para aumentar a liquidez, e pode ocorrer nessa área também, o que é positivo”, avalia.

    Rocca acredita que o principal motivo para a chance baixa de um aumento do volume total investido seria uma questão de risco fiscal ainda alto no Brasil, com perspectiva econômica ainda debilitada, o que interfere na capacidade das empresas de pagar os títulos uma vez que os prazos terminem.

    “O que condiciona mais as decisões de investimentos é o estado geral da economia, a estabilidade macroeconômica, crescimento. Eles contribuem para atrair ou não investidores”, diz.

    Mesmo assim, a questão tributária é “certamente” levada em conta por investidores estrangeiros, afirma Thiago Buschinelli Sorrentino, pesquisador do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV Direito SP.

    “Toda tributação é um custo para a operação, e impacta na escolha devido à mudança na rentabilidade. Os investidores priorizam investimentos com menos custos”, ressalta.

    Ele lembra que, hoje, as alíquotas de IR para as debêntures são altas, com um valor mínimo de 15%, um valor considerável para os investidores. Nesse sentido, uma isenção tenderia a atrair mais capital estrangeiro.

    “Não pode esquecer que a carga tributária não é o único e nem principal entrave para aportes. É importante, relevante, mas o maior entrave para investimento estrangeiro é falta de transparência, burocracia, com insegurança jurídica neste momento”, afirma.

    Sorrentino acredita que “a pessoa que investe, mesmo em debêntures, tem que se perguntar duas coisas: se vai conseguir tirar investimento do país e precificar a operação, saber qual a chance da empresa pagar os juros ou se no resto do mundo ganhar mais. Esses fatores podem anular o benefício da isenção”.

    A tributação de debêntures

    O pesquisador da FGV explica que, atualmente, existem dois modos de tributação para as debêntures.

    O primeiro, chamado de primário, é empregado quando um investidor toma um título emitido por uma empresa em que, após um prazo, haverá pagamento do valor da compra mais os juros estabelecidos pela empresa emissora.

    “Aqui, a tributação segue uma tabela progressiva no tempo, com a alíquota mínima de 15%, e vai aumentando, quanto antes tenta resgatar”, explica.

    Já o segundo tipo, chamado de tributação secundária, ocorre quando alguém adquire a debênture mas a negocia posteriormente.

    Nesse caso, a tributação é pelo ganho de capital, em que o imposto é calculado pela diferença de quanto pagou por quanto vendeu, aplicando uma alíquota tributária.

    “Em regra geral, é comum ter cobrança de IR para investidor estrangeiro, principalmente para impedir capital puramente especulativo, que pode até causar desequilíbrio de divisas”, comenta o pesquisador.

    A exceção, segundo Sorrentino, é quando o governo entende que o investimento não seria especulativo, com impacto positivo na produção e fortalecimento da economia, e por isso pode ter um tratamento tributário diferente.

    É o caso do investimento em ações e títulos públicos do Tesouro, em que os estrangeiros já possuem isenção de Imposto de Renda.

    Nesse sentido, Rocca acredita que a isenção para debêntures traria uma igualdade entre as três modalidades, e mudaria um cenário em que os títulos públicos são mais atrativos que os privados pela falta de tributação.

    Ao mesmo tempo, Sorrentino opina que a isenção “cria discrepância entre o investidor estrangeiro e nacional, dá para avaliar via isonomia, justiça tributária que estaria sendo abalada, privilegiando pessoas na mesma posição, já que todos são investidores”.

    Ele destaca, porém, que “do ponto de vista econômico, de desenvolvimento, a justificativa é o desejo de atrair mais investimentos estrangeiros para o país. Se entende que investimentos locais não são suficientes para justificar a manutenção do sistema, e se beneficiaria da entrada de divisas, aí sim tem justificativa. Sem entrada de capital, não justifica ter isenção”.

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