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    Desempenho recente da China preocupa economistas sobre atividade global

    Além da segunda maior economia do mundo, incertezas relacionadas aos Estados Unidos também estão no radar

    Um contexto adverso na China e no mundo pode respingar no Brasil, por isso, a recomendação é de cautela
    Um contexto adverso na China e no mundo pode respingar no Brasil, por isso, a recomendação é de cautela Foto: Jason Lee/Illustration/Reuters

    Pedro Zanattada CNN

    São Paulo

    A economia global tem dado sinais um pouco diferentes do que era esperado por parte dos economistas para o segundo semestre deste ano e para 2024, principalmente com as recentes notícias vindas da China.

    Sendo a segunda maior economia do mundo e o principal parceiro comercial do Brasil, os especialistas consideram necessária maior cautela por parte do governo com relação ao desempenho chinês, assim como das demais economias, incluindo os Estados Unidos e os países da zona do euro.

    A avaliação é de que as projeções otimistas podem não se concretizar, uma vez que o “jogo está virando lá fora”.

    “O cenário no exterior está mais desafiador. Quando olhamos para a China, muitos achavam que a reabertura seria parecida com o que vimos nos países ocidentais, principalmente, nos Estados Unidos. Isso não aconteceu”, explica o economista-chefe da Ryo Asset, Gabriel de Barros.

    “Os dados de exportação, de vendas do comércio, entre outros, mostram a economia bastante fraca”.

    Jennie Li, estrategista de ações da XP, reconhece um cenário diferente daquilo que se imaginava para segundo semestre, tanto no caso da China como também dos Estados Unidos.

    “A recessão nos EUA não chegou e, cada vez mais os economistas e analistas de mercado têm jogado essa estimativa muito mais para 2024, dado que a economia americana tem se mostrado persistente. Ela está desacelerando e estamos vendo a atividade econômica esfriando. Por um lado, a inflação está caindo dos picos mas, por outro, o mercado de trabalho tem continuado forte”, diz a estrategista.

    Ela lembra que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) tem sinalizado uma dependência dos dados econômicos para continuar ou não a alta dos juros.

    A queda das taxas, no entanto, não parece muito próxima.

    Segundo a ata da última reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), o Fed teme que a inflação não desacelere ainda mais e, por isso, não estão descartadas novas altas nos juros da maior economia do mundo.

    Já sobre a China, Li cita que foi observado um forte crescimento no início do ano. Mas o ritmo mudou, e nos últimos meses esse movimento perdeu grande parte do fôlego.

    “Essa fraqueza se mostra bastante no setor imobiliário. Já era uma pauta que preocupava os investidores, e a retomada tem desapontado as expectativas”.

    Alerta para o Brasil

    Um contexto adverso na China e no mundo pode respingar no Brasil, por isso, a recomendação é de cautela.

    Para Gustavo Cruz, estrategista chefe da RB Investimentos, o governo deve ter cuidado com programas como o Novo PAC ou semelhantes, que demandam volumes altos de recursos.

    “Sempre temos impactos dos EUA e da China aqui por se tratarem de grandes parceiros do país e com muitas empresas que exportam para essas regiões”.

    Segundo os especialistas, o problema de uma piora do cenário global é a queda nos preços das commodities, um fator importante para o Brasil, que se destaca pela exportação de produtos do agronegócio – setor que tem tido papel importante para crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).

    Segundo o Ministério da Agricultura, as exportações brasileiras de produtos do agronegócio alcançaram em julho um valor recorde para o período, totalizando US$ 14,43 bilhões, crescimento de 1,2% na comparação com o mesmo período do ano passado.

    Contudo, a pasta acrescentou que os preços médios de exportação dos produtos recuaram.

    Preço menor significa arrecadação mais fraca, o que pode dificultar a execução das metas fiscais do governo, como atingir o déficit zero no ano que vem.

    “Era o esperado [a queda nos preços das commodities]. Ano passado foi algo fora da curva pela Guerra na Ucrânia, os preços deveriam retornar ao normal até pela desaceleração global com os juros mais altos. Isso impacta os empresários e também na arrecadação do governo, e sabemos que o fiscal é dependente do aumento de arrecadação”, explica Cruz.

    O próprio Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que o governo está acompanhando a situação do país asiático. Para ele, o contexto “inspira cuidados”.

    “Continuamos acompanhando a China, mas o diagnóstico ainda não está concluído. As pessoas têm visões diferentes do que está acontecendo lá e, mais particularmente, sobre o alcance do problema que eles estão enfrentando”, declarou o ministro na quarta-feira (23), em Joanesburgo, na África do Sul.

    Cenário chinês

    O gigante asiático vem ganhando os holofotes dos economistas nas últimas semanas com dados econômicos mais fracos e com o recente noticiário de piora no setor imobiliário, um dos principais pilares da sua economia.

    “Esse setor vai muito mal. Existe um excesso de estoque para o atual nível de atividade econômica bastante preocupante. Então, o ritmo de venda do setor caiu mais ou menos 30%, o preço das casas, tanto residências quanto comerciais, está caindo no segundo mês seguinte”, explica Alex Lima, estrategista-chefe da Guide Investimentos.

    “O governo utiliza fundos de investimento para poder captar recursos e investir em projetos imobiliários locais nas províncias, e agora vemos eles com dívidas”.

    Na semana passada, a gigante do mercado imobiliário chinês, Country Garden, alertou sobre incertezas para o pagamento de dívidas.

    Na noite da última quinta-feira (17), o Grupo Evergrande — que já foi a segunda maior incorporadora da China — entrou com pedido de proteção contra falência.

    A empresa acumulou diversos empréstimos e deixou de pagá-los em 2021, o que gerou uma enorme crise imobiliária na economia da China.

    Segundo Lima, pode existir um contágio para outros setores da economia chinesa.

    “Parece que vai saindo do setor imobiliário, para as construtoras e para o setor financeiro chegando, eventualmente, na população. O risco país da China subiu mais de 20 pontos nas últimas duas semanas e está se espalhando para os mercados emergentes. Em agosto, a bolsa já caiu mais de 8% e a moeda desvalorizou”.

    Expectativas revistas

    Dado o atual cenário, as repercussões começaram. O Morgan Stanley cortou a previsão de crescimento econômico da China para este ano. O banco de Wall Street agora vê crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) chinês em 4,7% neste ano, abaixo da previsão anterior de 5%.

    A instituição financeira também reduziu a previsão do PIB do país de 2024 para 4,2%, ante 4,5%.

    Além dele, o JPMorgan cortou a previsão de expansão da atividade do país para este ano para 4,8%, de 5% antes, enquanto o Barclays reduziu para 4,5%.

    No Brasil, movimentos parecidos se iniciam por parte dos bancos. Em relatório, o Bradesco avalia que “na mesma direção da frustração com o crescimento no segundo trimestre, os indicadores de atividade econômica de julho da China surpreenderam negativamente e apontam para uma moderação generalizada no ritmo de crescimento”.

    Em nota, o banco diz que deve manter sua projeção de crescimento de 5,5% do PIB chinês neste ano, contudo, “os dados recentes desafiam nossa expectativa”.

    Além disso, a agência de classificação de risco Fitch Ratings rebaixou, na quarta-feira (23), o rating da Country Garden de “BBB-” para “BB+”, e colocou a nota de crédito da empresa em avaliação para possíveis novos cortes.

    Porém, não é só no caso de empresas que a agência sinaliza atenção.

    O diretor-gerente da Fitch Ratings, James McCormack, afirmou na semana passada, em entrevista à Bloomberg TV, que há chances de que a agência de classificação de risco rebaixe o rating soberano da China, que é A+ e com perspectiva estável desde 2007, diante das condições econômicas do país.

    Segundo ele, a relação entre a dívida e o PIB da China está um pouco alta para o rating de crédito atual. Ainda assim, McCormack disse que não há certeza de que isso pode acontecer.

    Governo entra em cena

    Para contornar a situação, o Banco do Povo da China (PBoC, na sigla em inglês) afirmou estar comprometido em ampliar o apoio à atividade econômica e anunciou medidas.

    Na segunda-feira (21), os investidores foram surpreendidos pela decisão do país de não cortar uma taxa de juros que influencia as hipotecas.

    O banco anunciou uma redução na taxa básica de empréstimo de um ano em 10 pontos base, de 3,55% para 3,45%. No entanto, a autarquia manteve sua taxa básica de empréstimo de cinco anos (LPR), que está em 4,2%, inalterada.

    O corte na taxa de um ano era amplamente esperado, mas a falta de movimento na taxa mais longa surpreendeu negativamente. No dia, as ações da China caíram para mínimas em cerca de nove meses.

    O índice CSI300, que reúne as maiores companhias listadas em Xangai e Shenzhen, fechou em queda de 1,44%.

    Na avaliação de economistas, o movimento fortalece a visão de que é improvável que o governo chinês adote cortes robustos nas taxas, o que seria necessário para reviver a demanda por crédito.

    Em outra frente, a Comissão Reguladora de Valores Mobiliários da China divulgou um pacote de medidas para revitalizar o mercado de ações.

    As medidas incluem o corte dos custos de negociação, apoio à recompra de ações e incentivos investimentos de longo prazo.

    Na avaliação de Gabriel de Barros, uma desaceleração relevante do crescimento econômico global deve ser observado. O economista considera que a China possui problemas conjunturais e estruturais.

    “Junto de um cenário em que os EUA desaceleram ano que vem, vai tornar o ambiente bastante desafiador em 2024”, diz.

    O economista enxerga ser necessário um senso de urgência por parte do governo e do Congresso na tomada de decisões econômicas e administrativas.

    “Quanto mais tempo demora para tomar decisões, podemos entrar em um cenário perigoso, que é: diante de uma desaceleração da economia, o governo tentar buscar um atalho, usar medidas ‘parafiscais’ para tentar manter o crescimento artificialmente alto e, assim, criamos um novo problema. O gatilho é o global e, se virar lá, vai virar aqui”, conclui.

    Veja também: Brics vão convidar mais cinco países para o bloco, dizem fontes; Argentina é um deles