OPINIÃO
É tempo de propor um novo futuro


Começou o ano novo com um sabor de ano velho. Existe uma revolta no mundo econômico contra as medidas propostas pelo Arcabouço Fiscal e suas consequências no desenvolvimento das ações do executivo no Brasil.
O país terá um crescimento do PIB da ordem de 3,5%, tem o menor índice de desemprego de sua história recente – 6,1%, tem um importante superavit na balança de pagamentos de R$ 74 bilhões – o segundo melhor da série histórica, tem U$ 350 bilhões de reserva cambial, terá uma safra recorde de grãos em 2025 da ordem de 320 milhões de toneladas, é o maior exportador de proteína de origem animal do mundo, tem autonomia energética e uma das matrizes mais limpas do mundo, somente 5% da dívida pública é externa, embora tenha uma dívida pública de país desenvolvido (sim eles também têm imensas dívidas públicas), 23 milhões de pessoas saíram da condição de fome nestes dois anos, a cobertura vacinal está recuperando os níveis pré pandêmicos….
Apesar dos bons indicadores econômicos, é necessário destacar dois pontos:
1 – O povo não está satisfeito. A massa salarial aumentou, o emprego aumentou, a pobreza absoluta diminuiu, a saúde pública está sendo recuperada, mas o salário é pouco, a aposentadoria é ruim, a picanha está inacessível!
Para o povo a condição social apesar de melhor, não é perceptível. E os discursos populistas continuam ecoando e gerando vontade de mais mudança. Mais gastos públicos com os BPCs, aposentadorias mais precoces, picanha mais barata.
2 – Os economistas associados ao mercado financeiro, aqueles da Faria Lima, dizem que estamos em crise fiscal em função do descontrole dos gastos públicos, que a inflação está fora de controle, que a taxa de juros tem que ser aumentada – o que piorara o quadro financeiro. É o BC abortando um momento de sucesso da economia.
Assim, existem duas visões de mundo que se completam nos extremos – não está bom e algo deve ser feito, mas os remédios são muito diferentes.
O Brasil saiu de uma noite tenebrosa que se iniciou com a deposição de Dilma Roussef em 2016, com as medidas econômicas tomadas a partir daí pelo governo Temer, em particular a EC 95 – emenda que congelou os gastos públicos por 20 anos.
Seguiu-se o governo eleito em 2018 que protagonizou um momento de pandemônio em que os gastos públicos impulsionados pela pandemia e pelo desgoverno gerou um total descontrole econômico pouco lembrado, com gastos eleitoreiros que não resultaram na reeleição desastrosa do ex militar.
E não se pode esquecer da pauta ultra conservadora dos costumes. A turma da financeirização estava mais feliz, mas o povo elegeu um novo presidente. A partir de 2023 começa a reconstrução do país destruído pela pandemia, pelo desgoverno que imperou e pela nova ordem politica que foi construída a partir de uma nova relação com o congresso que impôs um modelo semi-parlamentarista, que vinha sendo construído desde 2016 e por um judiciário com uma imensa capacidade de arbitrar decisões dos dois outros poderes, o que foi positivo por um lado – pois permitiu obliterar as desastrosas decisões do executivo, mas negativo de outro, pois interferiu de maneira muito intensa na relação do judiciário com a democracia do país.
O Brasil que emergiu desses 6 anos de confusão, precisou e precisa de reconstrução. A pobreza avançou, a fome a partir da perda das políticas públicas voltadas para promover segurança alimentar, voltou.
O Brasil não tinha casos de marasmo e Kwashiorkor (nome das doenças da desnutrição grave em crianças) desde o ano 2000 e voltou a ter casos de desnutrição grave entre crianças. Todos os setores pioraram – segurança pública, indústria, pesquisa, educação, assistência social, mas a destruição mais completa se deu na saúde e educação. O Ministério da Educação foi entregue aos vendilhões do templo – bíblias com barras de ouro!
O Ministério da Saúde foi destruído nos quatro anos de desgoverno pela trupe militar que o ocupou. Durante o curto período de Mandetta, algo se salvou, mas a partir dai, foi um desastre sanitário. O Brasil teve a terceira maior mortalidade entre todos os países pela pandemia e somente não foi pior devido à ação de alguns governos estaduais que foram contra o arranjo federal e tomaram medidas como a de realizar lockouts e produzir vacinas – caso de São Paulo e da FIOCRUZ e do Consórcio Nordeste que reuniu nove estados.
Mas a decisão da população foi eleger uma alternativa à destruição, e deu-se inicio a reconstrução do país a partir de 2023. E apesar das condições internacionais adversas geradas pela guerra da Ucrânia e a crise do Oriente Médio entre o Hamas e Israel, com muita turbulência o país conseguiu caminhar nestes dois anos como demonstram os dados apresentados no início do texto.
O Brasil tem realmente gastos públicos relativos semelhantes aos dos países desenvolvidos. A fonte destes gastos é a imposição constitucional de pisos da saúde e educação, os gastos com um sistema previdenciário ainda com problemas distributivos importantes e com um sistema tributário em processo de reforma, mas com muitos privilégios.
Em resumo é um país pobre, onde a desigualdade social é o pior problema e com a busca de um estado de bem-estar social de país rico, em uma economia que gera muitos privilégios para os mais abonados, que conseguem seus privilégios graças as suas relações de poder dentro da sociedade, do Congresso e do Judiciário. Portanto, apesar da busca de uma situação social melhor, esta ainda muito distante, o povo está longe de ter uma melhor condição de vida.
Parte do que é positivo dentro dessa situação é fruto da Constituição de 88, a Cidadã! Foi lá que foi inscrita a vontade de ter um país com nível de bem-estar social que ainda não foi construído, mas que deve ser buscado. Os economistas ligados ao sistema financeiro, estão preocupados com a saúde fiscal do país e falam abertamente que a solução do problema passa por cortar na carne. Carne de quem?
Saúde e educação, pesquisa e desenvolvimento tecnológico representam o futuro ainda não escrito do país. O aumento do número de médicos na atenção primaria, o aumento de especialistas a serviço da resolução dos problemas médicos mais complexos e que podem ser alcançados a partir da telemedicina que exigirá investimentos importantes em tecnologia e também integração entre as três esferas de poder, será fundamental.
Na educação a formação e remuneração de professores, a entrega de escolas em tempo integral, a expansão do acesso à universidade, a melhoria da qualidade do ensino, será fundamental.
Para tudo que deve ser feito, o que deve ser enfrentado é se comunicar com a sociedade e colocar com clareza a necessidade de fixar novos parâmetros para o equilíbrio fiscal e inflação. Não se trata de perder as conquistas importantes referentes a uma economia estável e sim criar condições para poder caminhar com uma condição menos restritiva do ponto de vista do investimento publico e sem dúvida paralelamente será fundamental melhorar a capacidade do estado ser mais eficiente. E tudo isso com o Trump no cenário!