Saúde Pública ou saúde fiscal?


Mais um ano se encerra. Mas os assuntos continuam os mesmos – a crise climática, a chance de uma nova pandemia que pode estar começando nos Estados Unidos a partir de um vírus aviário, o H5N1, a guerra da Ucrânia, a destruição da possibilidade de paz no Oriente Médio devido à negação da existência de uma solução mais aceitável – duas pátrias para dois povos muito sofridos, o desastre social de boa parte dos povos que vivem na África, na América Latina e no Sudeste Asiático.
E no meio desse imbróglio mundial a discussão que não quer calar aqui nas terras canarinhas – Saúde Pública ou Saúde Fiscal?
O gasto público com saúde no ano de 2023, somados os gastos das três esferas de governo, foi de cerca de R$ 2.500,00 per capita. O gasto privado somente com planos de saúde, sem considerar o chamado gasto of pocket (do próprio bolso) foi de cerca de R$ 5.000,00 per capita! O dobro do gasto público.
Ninguém está satisfeito. Todos acham que se está gastando pouco.
Não existe um padrão de gastos em saúde. Mas ao considerar o gasto médio dos países mais desenvolvidos, a média de gastos é de cerca de 10% do PIB e destes, o gasto público deve ser entre 6 e 8%. O Brasil, que tem um PIB menor que esses países em termos relativos, tem gasto cerca de 10% do PIB, semelhante pois aos países mais desenvolvidos, mas desse total o gasto público não passa de 4,5%. E quando comparado com o gasto dos planos de saúde é cerca da metade como demonstrado acima.
Na educação não é diferente. De uma relação de 41 países referente a quanto cada país gastou por aluno em dólares na educação básica pública, o Brasil figura na posição 39. Na média, os países desenvolvidos investem cerca de 10 a 15 mil dólares por aluno. O Brasil figura entre os últimos com um investimento de 3.5 mil dólares. Junto a México, África do Sul e Turquia.
Mas a principal despesa pública brasileira é com juros e querem que mais ainda seja pago. Tem que aumentar a taxa de juros, diz a Faria Lima.
Com certeza o equilíbrio fiscal é fundamental. Não se deve gastar mais do que se arrecada. Mas como construir esse equilíbrio? Pagando as emendas secretas de bancada? Pagando os supersalários cheios de penduricalhos para fugir do teto? Pagando as centenas de jabutis embutidas nas péssimas leis negociadas na calada da noite para pagar donos de geradores de energia que utilizam carvão, empresários que conseguem benesses em seus processos produtivos por estarem em áreas protegidas como a produção de xaropes para refrigerantes na zona franca de Manaus? Ou oferecendo isenções de impostos na compra de planos de saúde?
Os caminhos dos descaminhos não estão à luz do dia, mas são conhecidos. Mas onde estão buscando redução de gastos os nossos representantes e os donos do dinheiro oriundo do rendimento dos juros?
Nos gastos obrigatórios daquele que é considerado um dos orçamentos mais engessados do mundo. Quanto o Brasil estaria investindo em saúde e educação se não fossem os comandos constitucionais que produzem esse engessamento? O caminho do equilíbrio fiscal é diminuir o bolsa família, o que é pago de Benefício de Prestação Continuada, a correção mesquinha do salário mínimo?
E no meio do caminho estamos construindo um absolutamente imprescindível submarino atômico, renovando a frota de aviões de combate para ajudar a pobre da Suécia, salvando a indústria bélica de mísseis, recuperando a produção de tanques…. São gastos necessários também, mas e o equilíbrio fiscal? E os que passam fome? E o futuro das atuais gerações que deverão operar o país do amanhã?
O Brasil apresenta um nível de emprego elevado, voltamos a ter um estado de segurança alimentar como tínhamos pré 2018 (no período pandêmico voltamos a ter casos de desnutrição grave, pois o Ministério da Saúde abandonou os programas de segurança alimentar). Voltamos a ter uma cobertura vacinal próxima a do período pré pandêmico. Mas o dólar está fora de controle, a taxa de juros deve subir e as consequências destes dois elementos é mais desigualdade social. O equilíbrio fiscal somente pode ser alcançado se junto, a sociedade pagar para que os juros produzam mais renda …. para os que têm renda!
Eu não sou economista e estou tateando nesse ambiente explosivo. Acho que somente vale a pena viver se todos pudermos viver melhor. Demoramos séculos para concluir que humanos que vivem escravizados produzindo para poucos configura uma condição inaceitável.
O gigante adormecido precisa acordar. Algo parecido a 2013. As ruas precisam falar. O que o povo quer é esse regime em que o Congresso governa ao invés de legislar? Que o STF decida as políticas públicas de incorporação de medicamentos ao invés de julgar?
O país está fora dos trilhos. Perdeu muito de sua capacidade de governar. As discussões acerca de governabilidade, as propostas de realização de parcerias público-privadas, tudo está caminhando para um modelo de entrega do capital que deveria construir um mundo mais igual, para alimentar a fome de dinheiro dos ricos. Mais concentração de riqueza e mais pobreza.
Realmente é um momento de muito ceticismo. O futuro será de quem? – da ultradireita que alimenta essa maquina de concentração de riqueza, dos sonhos dos militares ou de uma esquerda perdida em seus devaneios.
Um bom ano novo deveria merecer um povo renovado e comprometido com um futuro melhor para todos!
E com equilíbrio fiscal!