OPINIÃO
A vacina brasileira contra dengue


O ano de 2025 se iniciou com uma notícia promissora, especialmente para todos os que acreditam no potencial da ciência para contribuir com a saúde. O Instituto Butantan solicitou em dezembro à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) o registro de sua vacina contra dengue, a primeira do mundo aplicada em dose única.
O imunizante desenvolvido pelo Butantan foi viabilizado após a assinatura de um acordo inédito de desenvolvimento e compartilhamento de dados com a farmacêutica multinacional MSD.
Os novos resultados da fase 3 de testes da vacina foram publicados pela revista científica Lancet Infectious Diseases. Eles mostraram uma proteção de 89% contra dengue grave e dengue com sinais de alarme, além de eficácia e segurança prolongada até cinco anos.
O estudo envolveu 16.000 voluntários que foram chamados para participar entre fevereiro de 2016 e julho de 2019.
A eficácia geral do novo imunizante contra a dengue sintomática foi de 67,3%, sendo 75,8% para o sorotipo DENV-1 e 59,7% para DENV-2. Não foram detectadas infecções DENV-3 e 4. E, aí, temos uma incógnita, caso esses sorotipos prevaleçam no Brasil.
O imunizante do Butantan se manteve seguro para toda faixa etária de 2 a 59 anos, tanto para quem tinha histórico de infecção prévia, como também para aqueles que nunca tiveram contato com o vírus.
Obviamente, os protocolos para aprovação de uma nova vacina são rigorosos, com várias etapas necessárias para comprovar o nível de eficiência e segurança, e só a partir daí é iniciada a distribuição. Mas agora, com os dados divulgados da fase 3, já é possível dizer que o processo entrou em sua reta final, com as informações completas sobre os estudos clínicos fornecidos pelo Butantan.
Atuei por anos como Secretário de Saúde do estado de São Paulo, e tive a honra de anunciar em fevereiro de 2016 o início dos testes clínicos de fase 3 em humanos voluntários em todo o Brasil. Além disso, construímos a fábrica do imunizante, no complexo do Instituto Butantan.
Acompanhei de perto todo esforço dos pesquisadores e especialistas que trabalharam para desenvolver essa vacina. Foram anos de trabalho árduo que agora trarão resultados concretos para a população.
A dengue vem atingindo a população de maneira muito grave. O próprio ano de 2024 registrou um aumento assustador de casos de dengue, com mais de 6,5 milhões de contaminações e quase 6 mil óbitos confirmados. Para frear esse avanço, precisamos de novos aliados.
E não é apenas no Brasil que a doença coloca vida em risco. Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), estima-se que quase metade da população mundial está exposta a contrair o vírus transmitido pelo mosquito Aedes aegypti. Somente nas Américas são cerca de 500 milhões de pessoas.
Vale lembrar que, mesmo quando a vacina estiver disponível, a população não deve abandonar os cuidados para evitar a proliferação do mosquito. Além de dengue, o Aedes aegypti também transmite outras arboviroses, como a zika e a chikungunya. Hábitos como evitar o acúmulo de água em recipientes, limpar ralos e calhas, colocar areia em vasos de plantas e utilizar mosqueteiros e repelentes deverão continuar a fazer parte de nossas vidas sempre, com ou sem imunização.
A chegada da Butantan – DV traz um panorama animador para a prevenção de casos sintomáticos e graves de dengue, além de uma redução do número de mortes. É a prova que o investimento em ciência proporcionados pelos setores público e privado contribui decisivamente para melhorar a saúde e a qualidade de vida das pessoas.
Também é necessário um engajamento profundo em campanhas de vacinação em massa. É decisiva a participação dos Governos Federal, Estadual e Municipal nesse sentido.
A dengue já fez muitas pessoas sofrerem e ceifou vidas precocemente nos últimos 40 anos no nosso país. Precisamos vencer essa guerra.