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    Para especialistas, BC poderia atuar mais para conter volatilidade no câmbio

    Autarquia possui instrumentos que influenciam na cotação do dólar, mas com duração limitada

    João Pedro Malardo CNN Brasil Business , em São Paulo

    Responsável pela política monetária do país, uma das atribuições do Banco Central é garantir o poder de compra da moeda nacional, o real, e a autarquia possui algumas ferramentas para isso.

    Especialistas consultados pelo CNN Brasil Business, porém, apontam que a organização poderia estar fazendo mais para lidar com a tendência de valorização recente do dólar, que vem sendo acompanhada de uma forte volatilidade no mercado.

    A alta, com o dólar indo dos R$ 4,62 para os R$ 5 em seis dias, faz parte de um fenômeno global, ligada a uma aversão a riscos por parte dos investidores e a mudanças de fluxos de investimento conforme os Estados Unidos avançam no seu ciclo de alta de juros.

    Ir contra essa tendência, afirmam os especialistas, é praticamente impossível, mas as divergências começam a surgir em relação a até onde o Banco Central poderia atuar para, ao menos, tornar o processo mais suave.

    Instrumentos

    André Modenesi, professor da UFRJ e coordenador do Observatório do Banco Central, explica que a autarquia possui três ferramentas principais para intervir na taxa de câmbio.

    A primeira, e mais poderosa, é a taxa básica de juros, a taxa Selic. Quando ela é elevada, os juros de títulos do Tesouro ficam mais atrativos, fortalecendo um fluxo de entrada de capital estrangeiro, em dólar, que aumenta a oferta de moeda norte-americana e valoriza o real.

    A elevação da taxa Selic de 2% para 12,75% em pouco mais de um ano foi um dos grandes fatores por trás da forte valorização do real no primeiro trimestre de 2022, quando o dólar caiu de R$ 5,71 para a mínima de R$ 4,59.

    “A economia brasileira não está aquecida, os juros não estão subindo para desaquecer, ainda que isso vá acontecer, o processo de alta está mais ligado a esse mecanismo cambial, manter uma alta diferença nos juros domésticos e externos”, afirma.

    Além da Selic, o Banco Central pode intervir no chamado mercado de câmbio, que é dividido no segmento à vista e futuro. Em ambos os casos, a ideia é aumentar ou reduzir a quantidade de dólar em circulação para influenciar no câmbio.

    No mercado à vista, o Banco Central vende, compra ou faz empréstimos de dólar a partir das reservas internacionais que o Brasil possui. Já no mercado futuro, a negociação é de contratos, pelo chamado swap cambial.

    “O swap cambial é uma troca, o BC promete pagar ao comprador a variação cambial entre certo período. É a variação mais uma taxa, e recebe do comprador a variação da Selic no mesmo período. É uma troca, recebe juro brasileiro e se compromete a pagar a variação”, diz Alexandre Schwartsman, especialista CNN em economia.

    Qual a eficiência da atuação no mercado de câmbio?

    Se as mudanças na Selic têm uma forte influência na cotação do dólar, no caso das intervenções no mercado de câmbio os efeitos são menores.

    Schwartsman, que foi diretor de assuntos internacionais do Banco Central, avalia que, no geral, as compras, vendas e empréstimos “funcionam em um espaço curto de tempo, vai de horas para dias, mas nunca se constatou para semanas ou um mês. Só interfere mesmo se sobe muito a taxa de juros”.

    Ele afirma que é importante também que o Banco Central realize diagnósticos para entender onde há falta de dólar, e qual a operação mais apropriada para compensá-la e ajudar o real.

    “Em alguns momentos pode sentir que falta dólar à vista, aí a melhor maneira é vender. Em alguns não falta dólar, as empresas que estão buscando comprar dólar para se proteger, aí o swap é favorável”, diz.

    André Modenesi considera que, como as reservas internacionais são finitas e níveis baixos costumam ser mal vistos por investidores, a atuação no mercado futuro costuma ser mais eficiente, já que não envolve perda de reserva.

    As reservas, segundo Schwartsman, são importantes para momentos de interrupção de fluxo de dólar, como possíveis crises, atuando como uma reserva.

    “Se faltar dólar para tudo, não consegue pagar importações, dívida em dólar. Para não ficar dependente dessas possibilidades de parada súbita, como regra, muitos países emergentes começaram a acumular reservas para evitar esse tipo de problema, a discussão é sempre quanto”.

    Segundo ele, a discussão do nível ideal de reservas é constante, mas sem resolução, e acaba influenciando em decisões do Banco Central como realizar ou não vendas no mercado à vista. “Nunca tem uma resposta clara”, ressalta.

    Desempenho atual

    Sérgio Machado, gestor do fundo Trópico Cash, considera que o Banco Central não deveria atuar no momento para reverter a tendência de alta do dólar, mas sim para reduzir uma volatilidade excessiva, que ele atribui a um “comportamento extremamente especulativo do mercado”.

    Machado avalia que, durante a pandemia, o fluxo de entrada de capital estrangeiro sofreu uma forte redução, e mesmo com a recuperação da economia, ainda está distante dos níveis pré-pandemia, o que “não permite que o Banco Central vire as costas”.

    “Se falta moeda, vende, para que deixar que o preço, que é fundamental para a economia, sofra uma variação tão grande por causa de um fluxo?” questiona. Para o gestor, a falta de liquidez facilita que um único agente de mercado influencie no câmbio dependendo de suas movimentações.

    Nesse sentido, Machado vê um erro de atuação do Banco Central, que tem falhado em evitar variações “excessivas, desnecessárias por pura especulação”.

    “É um mercado pequeno e volátil, tem que evitar isso e evitar que fluxos afetem excessivamente a moeda”.

    Machado diz que, no primeiro trimestre, a queda do dólar ocorreu ao longo de três meses, com entradas massivas de capital estrangeiro, ou seja, havia um motivo para o recuo, e mesmo assim houve momentos em que o BC poderia ter atuado para evitar quedas desproporcionais.

    Agora, avalia que houve episódios de altas do dólar sem motivos aparentes a não ser uma “retroalimentação de mau humor” no mercado, devido ao momento frágil a nível mundial.

    “Se permite esses descolamentos, pode pagar um pecado maior do que deveria. Tivemos uma desvalorização de quase 10%, voltou metade e o mundo começou a pegar fogo. Se fica fragilizado em uma situação como essa, um cenário de correção de preços, é mais fácil de se machucar”.

    Para ele, “às vezes no BC existe uma ortodoxia excessiva, uma preocupação de não ser taxado como alguém que não está influenciando no nível da moeda, e aí fica ausente. Tem tanto medo de errar, que erra por omissão. Eu prefiro que erre por ação do que por omissão, porque dá para corrigir”.

    A atuação deixa a desejar, mas é de se esperar que tenhamos mais volatilidade pela frente, eventualmente um Banco Central mais eficiente seria bom para todo mundo

    Sérgio Machado, gestor do fundo Trópico Cash

    André Modenesi também avalia que o Banco Central poderia estar realizando mais leilões e com valores maiores, de forma a reduzir a volatilidade, que também resulta em pressões inflacionárias.

    Para ele, isso pode não estar ocorrendo porque a autarquia “vê que é uma tendência mais duradoura devido à alta de juros no Fed. Uma atuação mais pesada só deveria ser feita após ficar mais claro para onde o Fed vai, e o receio é que o Powell [presidente do Federal Reserve] vire um novo Volcker, que deu o choque de juros nos anos 1980”.

    Já Alexandre Schwartsman afirma que o Banco Central até poderia tentar moderar as variações pelos leilões, mas que não há muito que possa ser feito com essas ferramentas no cenário atual.

    “O dólar está no nível mais forte no mundo desde 2002. O melhor momento do real foi na primeira metade de abril. É um movimento global, então é natural que suba aqui”, avalia.

    “Minha visão é que pode intervir, mas vai perder, porque tem um trem vindo na sua frente, que é o dólar passando por cima de todas as moedas devido à subida de juros nos Estados Unidos por conta da inflação”.

    O economista considera que as reclamações no mercado sobre a atuação da autarquia são naturais em momentos de alta do dólar e queda da bolsa.

    “O mercado brasileiro sabe vender dólar e comprar bolsa, ganham dinheiro quando bolsa sobe, dólar fica barato e juro cai. Quando juro sobe, dólar sobe e bolsa cai, vão botar a culpa no Banco Central. Não sabem comprar dólar porque é caro, precisa abrir mão da Selic, ninguém opera comprado em dólar, opera vendido, e quando o dólar sobe, perde dinheiro e reclama”.

    Procurado, o Banco Central respondeu que não comentaria.

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