‘Momento exige muita prudência’, diz diretor de gestora suíça de patrimônio
A rápida recuperação nos preços de ações e de outros ativos nas últimas semanas despertou entre muitos investidores a percepção de que as condições para o crescimento da economia global estão encaminhadas. Tamanho otimismo não é compartilhado pelo economista Paulo Pereira Miguel, sócio e diretor de investimentos da Julius Baer (a pronúncia é Bér) Family Office.
“Temos que ter muito cuidado porque essa crise, e tudo o que passou, vai nos deixar de legado uma situação muito difícil do ponto de vista da renda, do emprego, do endividamento público. É um desafio de grande importância global e para o Brasil com o qual vamos ter que lidar nos próximos meses e anos”, afirma Miguel. “São desafios que recomendam bastante prudência”, completa.
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A suíça Julius Baer é uma das mais tradicionais gestoras de fortunas (ou de patrimônios) do mundo, com mais de US$ 415 bilhões em ativos administrados ao fim de abril. No Brasil, o grupo se uniu às gestoras GPS e Reliance e é um dos maiores do segmento.
Miguel diz que a retomada do mercado acabou sendo muito mais rápida do que parecia ser possível um mês atrás. “Eu acho que a recuperação dos mercados, que muitas vezes acabam se descolando, antecipando… é até muito discutível aqui se (os investidores) estão vendo todos os problemas que estão adiante”, afirma o especialista em mercados financeiros.
Terceiro trimestre em V
O sócio no Brasil da Julius Baer diz que a reabertura das atividades econômicas na Europa tem surpreendido e sido mais rápido do que se esperava. E isso tem acontecido sem que haja, até o momento, um aumento do contágio. “Vemos uma facilidade maior de retomada de setores ligados à produção e que possuem menor contato social”, afirma Miguel.
“Talvez a sensação no terceiro trimestre seja de (retomada em) ‘V’, mas não necessariamente esse ‘V’ vai caracterizar todos os desafios que temos pela frente. Esse é o cuidado que temos que ter com uma perspectiva de médio e longo prazo.
“Vamos ficar no caso dos Estados Unidos. Indicadores preliminares sugerem uma queda anualizada de 30% a 35% do PIB no segundo trimestre e uma volta acima de 20%, 25% no terceiro trimestre. A grande dúvida é o que vem depois”, diz.
Ele afirma que haverá desafios estruturais e cita dificuldades permanentes como famílias que perderam renda e que vão enfrentar dificuldades para retornar ao mercado de trabalho e empregos que não vão voltar em setores que serão alterados.
O Brasil tem um desafio ainda mais específico, que parece particular aos países em desenvolvimento. “Não houve aquele pico tão agudo, e rápido, no contágio, como aconteceu em outros lugares, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos. Aqui o contágio foi mais lento e espaçado, mas, de todo modo, há um relaxamento do distanciamento social nas últimas duas a três semanas. Precisamos confirmar essa retomada da economia e ter uma clareza sobre se passamos o pico da epidemia”, afirma.
Evitar decisões na crise
Com a missão de administrar o patrimônio de algumas das famílias mais ricas do país, Miguel diz que o desafio em crises como a atual é determinar e saber trabalhar o quanto há de risco nas carteiras de ativos de acordo com o perfil do investidor, o que inclui seus objetivos e o seu horizonte de vida. “A grande essência do nosso trabalho, antes de falar de retorno, é falar de risco.”
“A pior coisa é ser obrigado a tomar decisões no pior momento. Esse foi o grande desafio de todo mundo que trabalha com investimento nesta crise: manter o norte e ter uma aderência à composição dos investimentos mirando políticas e retornos de longo prazo para quando a crise se tornasse menos aguda”, diz o diretor de investimentos da Julius Baer Family Office.
“Nosso trabalho é feito justamente para evitar que, em momentos de adversidade como a crise atual, você seja colocado em uma situação em que tenha que realizar uma perda”, afirma. Realizar uma perda é vender um ativo por um preço abaixo do que se pagou, algo que acontece no mercado em momentos de queda abrupta dos ativos, de desespero ou necessidade do investidor.
Tratamento x vacina
O economista tem uma visão positiva sobre a forma como a ciência tem reagido ao desafio da pandemia. “As pessoas focam muito na vacina, que é uma coisa muito distante e incerta. O que eu acho que aconteceu nas últimas semanas, e que é muito positivo, é que houve um avanço muito importante no tratamento”, afirma. Segundo ele, o aperfeiçoamento de protocolos de tratamento ajuda a evitar que o sistema de saúde fique sobrecarregado, diminuindo o risco de vida de pacientes em situação mais aguda.
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