Flávio Augusto: empreendedor precisa ser otimista, mas não pode ser negacionista
O bilionário, que é dono da Wiser e acaba de vender o time de futebol Orlando City, recomenda prudência com o momento econômico e sanitário do país
Oito anos após comprar a equipe de futebol Orlando City, nos Estados Unidos, por cerca de US$ 120 milhões (R$ 276 milhões no câmbio da época, R$ 632 milhões no atual), o empreendedor brasileiro Flávio Augusto da Silva anunciou na última semana a venda do clube para a família norte-americana Wilf, dona do time de futebol americano Minnesota Vikings.
O negócio, que também incluiu a equipe de futebol feminino Orlando Pride, o Orlando City B e outros ativos correlatos, como centros de treinamento e um estádio, não teve cifras divulgadas. Segundo o site Sportico, no entanto, o montante gira entre US$ 400 milhões (R$ 2,1 bilhões) e US$ 450 milhões (R$ 2,37 bilhões).
“Todo investimento que eu faço tem data de entrada e saída. Nesse caso, levou até mais tempo por conta da pandemia, porque eu imaginava concretizar essa operação ainda em 2020. O negócio ficou suspenso durante alguns meses, mas agora conseguimos concluir”, diz o presidente da Wiser Educação em entrevista ao CNN Brasil Business. O empresário tem um patrimônio estimado em R$ 1,3 bilhão, segundo o ranking da Forbes Brasil de 2020.
Ele lembra que se atraiu pelo mercado americano de esportes porque, diferente do modelo brasileiro, “os times são empresas que buscam atender bem seus clientes”, os torcedores, com “governança, segurança jurídica e protagonismo para que os donos possam tomar decisões sem pensar em política”.
Nessa linha, diz ainda que, por causa do formato das competições americanas, que coloca os donos dos clubes como sócios das ligas, conheceu muitas das famílias que controlam o setor por lá e faturam bilhões anualmente. Chegou até a ter conversas para investir na NBA, mas a negociação não se concretizou.
Segundo dados da Statista, o segmento vem crescendo ano após ano e deve movimentar US$ 83,1 bi em 2023.
Questionado sobre o momento do futebol no Brasil, Silva relativiza o movimento de clubes-empresa que vem surgindo nos últimos anos. “Não adianta só um time ser empresa, ele precisa estar encaixado em um ecossistema empresarial. Criar um formato assim no Brasil seria uma ruptura muito grande”, diz.
“Eu não poderia investir num clube brasileiro nem que eu quisesse, não existe estrutura jurídica para isso. O máximo que se pode fazer atualmente é trabalho publicitário, patrocinando clubes ou competições, algo que já fazemos há anos e configura uma relação superficial.”
Sobre iniciativas como a Superliga, que visava justamente colocar poder na mão de alguns clubes, o empresário estima que esse tipo de projeto pode dar certo daqui há algumas décadas, quando houver uma percepção melhor sobre o tema, mas tem suas dúvidas. “Envolve paixão, política, poder.”
Wiser Educação
Fora do segmento esportivo, Flávio Augusto vira suas atenções para o seu projeto primogênito, a Wiser Educação, empresa que controla e tem como sócios o fundo Kinea, do Itaú, e o empresário Carlos Wizard Martins. A Holding é dona de marcas como Wise Up, meuSucesso, Number One e Buzz Editora.
Com a pandemia do novo coronavírus oferecendo desafios momentâneos à oferta presencial das escolas de idiomas, o executivo entende que o setor deve caminhar para um modelo mais híbrido, em que serviços digitais complementam cada vez mais o que é aprendido in loco.
Em termos de investimentos, a companhia, que também já possui presença no nicho de negócios e no ramo editorial, deve entrar em outras áreas de conhecimento. “Estamos desenvolvendo novos produtos em novos segmentos, como um programa de treinamento de vendas”, diz.
“Além disso, vamos adquirir algumas edtechs. Ainda não posso adiantar muito sobre os setores, mas temos uma série de startups mapeadas e estamos olhando para diversas possibilidades, pensando, por exemplo, em empregabilidade. Também devemos ter algo voltado para pós-graduação.”
No final do ano passado, alguns veículos de comunicação chegaram a noticiar que a Wiser entraria na fila de IPOs de B3, o que acabou não ocorrendo até então. Sem dar detalhes, afirma que a empresa está bem capitalizada e gera caixa, mas que segue com projeto de abertura de capital para o futuro.
É hora de empreender?
Conhecido por incentivar o empreendedorismo no Brasil, Flávio afirma que o momento requer cuidado. “Ainda temos uma parcela pequena da população vacinada, há risco de terceira onda… O Brasil ainda está muito sujeito a possíveis fechamentos da economia por conta da pandemia”, diz.
“Por isso, é importante que o empreendedor seja otimista, mas não pode ser negacionista. É preciso considerar que existem riscos e que há setores, como o e-commerce, que podem ser mais resilientes neste momento.”
E investir no Brasil?
Em entrevista ao CNN Brasil Business no ano passado, pouco após o auge da crise, Silva afirmou que é arrojado nos seus negócios, que consegue controlar, e conservador em investimentos, que estão mais sujeitos a fatores externos. Quase um ano depois, ele conta que pouca coisa mudou.
“Eu tenho uma estratégia de investimento e preciso estar em paz com ela. Em 2013, quando vendi a Wise Up (comprou de volta depois), já estava claro que o Brasil teria déficit fiscal no futuro. Investi em dólar, de olho no câmbio, e, infelizmente para o país, a minha leitura estava correta”, afirma.
“O risco é sempre a insolvência fiscal. A subida da Selic, que estava artificialmente baixa, e a aprovação das reformas podem trazer o câmbio um pouco mais para baixo e voltar a aumentar o interesse do investidor pelo mercado nacional.”